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Elisa Lessa
Pareyon, Gabriel (University of Helsinki) Discussing Political Notions of Two Latin-American Composers: Coriun Aharonian (1940-) and Julio Estrada (1943 -) Coriun Aharonian (Montevideo, 1940– ) and Julio Estrada (Mexico City, 1943– ) are two composers of a same generation and a same political doctrine, who have devoted their lives to understanding, defending and explaining the value of plurality and tolerance in Latin America. However, they also symbolize a paradox, central to Latin America’s history: being sons of immigrants, their work is a milestone in terms of regional identity. Comparable cases are the historical figures of Francisco Xavier Clavijero (1731–1787), Miguel Hidalgo (1753–1811), and Alejo Carpentier (1904–1980), advocates of the rights and customs of local peoples, despite or perhaps because of being born from Europeans. Such a paradox is a key to understanding a basic aspect of Latin America’s modern culture, given that local identity is profiled by a negotiation with external influences. Besides, it is clear that Latin America is not a closed space, but it lives also from the “outside”, something that also occurs in other regions of the world, reflecting fundamental relations of survival and exogamy as a basic process for the enrichment of genetics and epigenetics, including culture. Many questions arise, however, in identifying the features of Latin America’s music as a product of a negotiation of recent immigrants with indigenous population, or with social groups emerging from previous migrations. This lecture explains how different socio-historical strata of Latin America form sediments in which the most recent layers have also some of the sharpest and most creative abilities, since their social issues are in full process of (self-)revision and adaptation. By contrast, attention is also paid to the fact that first-generation descendants of immigrants from underdeveloped countries, professionally active in industrialised societies, are much less influential as composers or music theoreticians, than first-generation descendants of immigrants in Latin America. Furthermore, first-generation descendants of immigrants in industrialised countries, are never concerned with the “recovery” of local musical identity (which usually is not assumed as “lost” by the local community), but rather with their own social legitimation. In addition, evidence is provided to show that, within a “globalized world”, there is a cultural bias in favor of specific values established by economic and political powers, contributing to a rapid deterioration of music as a universe of diversities. Within this frame, the musical exchange between pairs from different societies, results extremely unequal. In order to clarify these ideas, some concepts proposed by Aharonian and Estrada are hereby discussed.
Elbert, Harlei (Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro) Camargo Guarnieri e o discurso musical-literário O presente trabalho tem como objetivo propor uma reflexão sobre a predominância da música vocal - com ou sem instrumento(s) - na obra do compositor paulista Camargo Guarnieri (1907-1993), cujas canções foram escritas ao longo de mais de 60 anos de atividade, a partir de variadas formas, mas sempre em idioma nacional, seja português, afro-brasileiro ou ameríndio, fato inédito na história da canção no Brasil. Utilizando com certa freqüência textos de Mário de Andrade – reconhecidamente o pioneiro na pesquisa e divulgação da música brasileira em suas diferentes manifestações –, Guarnieri, a partir de 1928 – ano emblemático pela publicação do “Ensaio da Música Brasileira” –, começou a produzir regularmente acalantos e toadas, criou um tipo próprio de lied através de novas incursões harmônicas, rítmicas e onomatopaicas, que acabariam por representar cerca de 50% de sua produção, com mais de 200 títulos. Cabe, então, a reflexão em
torno do que estaria por detrás dessa constante utilização de textos, poemas, ensaios e outros gêneros literários produzidos na época. Cabe, também, lembrar que se trata do autor da famosa “Carta Aberta”, manifesto de 1950 em prol do nacionalismo musical, que, segundo historiadores, pode e deve ser discutido no âmbito da memória histórica como um símbolo na disputa pelo poder. Tratando-se da “Carta”, até hoje é surpreendente o número de publicações sugerindo divergentes interpretações, chegando por vezes a recriar visões separatistas da fervente época, consolidando uma espécie de duelo entre facções opostas – o próprio Guarnieri admitiria, já na década de 90, que não a reescreveria nos mesmos termos. O exemplo dessa atualidade é o trabalho de SILVA (2001), que propõe uma leitura isenta, anexando documentos originais pertinentes às discussões levantadas. No presente estudo, pretende-se analisar a trajetória de Camargo Guarnieri e o desenvolvimento de seu discurso musical articulado ao discurso literário, seja através de suas próprias palavras, seja por meio do uso de outras vozes.
Eckerson, Sara (Universidade Nova de Lisboa) Understanding a musical work: The dialogue between listening and textual analysis My presentation will introduce two methods of analysis by two important figures of musical aesthetics, and conclude with a contemporary analysis of Beethoven’s Symphony No. 3 in E-flat major, Op.55, the 'Eroica' (1804) that reflects on these two models. I will first present an understanding of Søren Kierkegaard’s aesthetics of music as presented in “The immediate erotic stages or the musical erotic”, the second chapter of Either/Or (1843), Kierkegaard’s first work of what he labelled as his “authorship”. I will propose a hearing-based hermeneutics as suggested by Kierkegaard for the analysis of Mozart’s Don Giovanni, K.527 (1787). Following this, I will outline an analysis of Beethoven’s Eroica symphony published by Adolf Berhard Marx in ""Ludwig van Beethoven: Leben und Schaffen"" (1875). The main goal of the work I will present will be to examine the barrier Kierkegaard establishes between himself and musical experts and its possible exaggeration and insignificance. Further detail will be given regarding, for example, what Kierkegaard termed as skills in listening to music such as a “speculative ear” and an “ear sensitive to presentiments”. In Marx’s analysis, the description of “ideal music”, and music as “embodying an idea” will be investigated. Furthermore, what we are looking at are not questions regarding absolute music or music with words or a program. Rather it is the exploration of methods of analysis that afford many ideas, and facets using music as the rhetoric for expression of thoughts via poignant and persuasive analysis. This exploration will be illustrated in the comparison of singularities in the writing of these individuals, the foundation of which will be supplemented with short quotations. Briefly, what I suggest is a method of analysis that utilizes the philosophy of both sides of the analytical and musical hermeneutics argument and how they indeed enter in dialogue with each other without their descriptions acknowledging it as such.
Machado Neto, Diósnio (Universidade de São Paulo) O “mulatismo musical”: processos de canonização na historiografia musical brasileira e seus vínculos ideológicos Os padrões de interpretação e narração de um corpo historiográfico reivindicam uma perspectiva crítica ou consciência coletiva e torna-se ela própria um corpo teórico que observa um objeto, o contextualiza e descreve. A canonização dos discursos cria, então, pressupostos conceituais que passam a legitimar um desvelar do passado e suspende, em certos casos, a revitalização teórica. Na historiografia musical brasileira, o problema da raça, hibridismo e mestiçagem manifesta-se em grande parte como panegírico de superação, resignação e reelaboração do estado de opressão do afrodescendente pelo gênio artístico que, na perspectiva teórica, acentuaria o valor da ascensão social pela arte. Porém, pelo elogio da mestiçagem nega-se a visão das profundas negociações entre as várias esferas envolvidas na consolidação de uma
sociedade aluvial, como a colonial no Brasil, onde as várias camadas não se sedimentam, renovando-se sempre. Fragiliza-se igualmente o desenvolvimento de uma crítica e teoria sobre os processos de hibridismo e suas implicações com a representação musical das “acomodações” sociais. Desde 1836, há na historiografia musical recorrências de tropos que, em síntese, responde aos desejos e fantasias de fundação ou resgate nacional através de uma história idealizada e sua tangência com os padrões da sociedade civilizada ocidental. O objetivo dessa comunicação é discutir a formação e recorrências do fenômeno do “mulatismo musical”. Tal discurso traspassou no tempo os estímulos políticos e estéticos: do Estado Novo à Ditadura Militar; do Modernismo à academização da musicologia. A proposta tratará de apresentar os elementos e sujeitos que absorveram a pressão pós-colonialista representando o músico do passado através de uma cultura mestiça cujo hibridismo inerente não acentua as formas e possibilidades de hibridação do capital simbólico vivido e sim a superação pela arte do estado de segregação social. Agrega-se uma reflexão sobre as negociações e os conflitos existentes na relação entre as camadas sociais e os processos administrativos da colônia no trato da configuração da liturgia social. Por fim, inclui-se a análise do discurso de composições inseridas nas instituições oficiais na perspectiva de perscrutar tópicas e estilos na representação do espetáculo do poder e os entreatos possíveis da representação da mestiçagem. Especificamente se tratará de dois compositores: um mulato “da terra”, José Maurício Nunes Garcia; e outro branco “da metrópole”, André da Silva Gomes. Por eles, tratar-se-á de percorrer os padrões de representações tópicas e organização formal do discurso musical, nas buscas das acomodações e transgressões do capital simbólico que mantinha os padrões de influência e poder.
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Marta Nunes da Costa
Paula Guimarães (Universidade do Minho) ‘Ear and heart with a rapture of dark delight’: Música e Motivos Wagnerianos na Poesia de A. C. Swinburne (1837-1909) Segundo Jerome MacGann (“Poetry in the Condition of Music”, 2009), Swinburne tinha uma palavra para o sentido e a origem de todos os poemas: ‘harmonia’ (619). A sua estética teórica e prática, baseada numa “inner harmony”, foi anunciada e demonstrada em 1866 em Poems and Ballads, estando sempre associada a um conjunto de ideias e analogias musicais. Esta comunicação pretende demonstrar que tais metáforas musicais não são arbitrárias, nem mesmo unicamente associadas à música puramente auditiva da poesia de Swinburne. O famoso pronunciamento estético de Walter Pater de que “toda a arte aspira permanentemente à condição da música” (The Renaissance, 1868) parece aplicar-se a este poeta finisecular inglês que, de forma consciente e identificável, fez uso de uma técnica musical derivada especificamente das óperas de Richard Wagner. Richard Furness (Wagner and Literature, 1982, 17) descreveu como a técnica dramática do leitmotiv, cujo propósito é fazer convergir um tema de forma simbólica ou representacional num personagem, objecto, local ou ideia, foi transferida daquele compositor para a literatura, nomeadamente a inglesa. Em Tristram of Lyonesse (1882), Swinburne teria usado três leitmotive interligados para estruturar e unificar o seu longo poema narrativo, publicado apenas algumas semanas após a estreia em Londres da ópera de Wagner sobre o mesmo tema, Tristan und Isolde. O texto de Swinburne assemelha-se à versão presente naquele libreto, cujos enredos dramáticos são retirados de lendas e mitos antigos, focalizando-se em estruturas simples e elementares e em sentimentos e emoções primordiais (MacGann 623). Catherine Maxwell, por seu turno, nota que “o arranjo intricadamente instrumentado da composição de Swinburne, com os seus elaborados ecos internos e variações, a sua fineza lírica e grandeza sinfónica, sugerem analogias musicais” (2006, 107). Por outro lado, a secção central de A Century of Roundels (1882-3) de Swinburne contém três composições poéticas relacionadas entre si, intituladas respectivamente “The Death of Richard Wagner”, “Lohengrin” e “Tristan and Isolde”, constituindo o seu tributo mais explícito a Wagner e à música deste. O próprio poeta teria descrito e exemplificado esta forma em The Roundel, o qual sugere não apenas a circularidade do poema mas também o seu carácter espontâneo, leve e melódico. Swinburne possuía uma cópia dos ‘Quatre Poèmes d’Opéra’ de Wagner (1861), com o seu importante ensaio introdutório, intitulado “Lettre sur la Musique”, que apresenta as ideias centrais do compositor sobre a relação da música com a poesia, nomeadamente a convicção de que só a expressão poética poderia explicar o sentido da expressão musical, facultando-lhe o seu ‘porquê’. A estrutura musical aspiraria, deste modo, à condição da linguagem e do significado, aquilo a que Wagner chamou de ‘poesia’ (MacGann 622).
Cabral, Maria de Jesus (CLP- Universidade de Coimbra) “Era a Rainha, a Lira”: música e teatralidade no drama poético de António Patrício. O Conto de Primavera Dinis e Isabel Singular, na sua ligação à estética simbolista, o teatro poético de António Patrício desenvolve uma relação entre música e linguagem “posta ao serviço da revelação das almas”, como afirma Luiz Francisco Rebello (Rebello, 1979: 43) que muito contribuem para a valorização da força
interna do drama e do clima de inquietude que o percorre. Por esta e outras características, a sua obra situa-se numa clara convergência com outras tentativas de introdução do teatro poético em Portugal, desde as incursões dramáticas de Eugénio de Castro ao drama poético pessoano ou às propostas de um “teatro de alma” de Mário de Sá-Carneiro. No seu artigo sobre “O Teatro-Arte” (publicado em 1913, no mesmo ano do Marinheiro, de F. Pessoa) o poeta distinguia efectivamente a “garra de ouro” ou “arquitectura interior’ da verdadeira obra dramática da “arquitectura exterior” – assente na “anedota” e nas categorias convencionais – predominante no teatro do seu tempo. Escrita em 1919, a peça Conto de Primavera Dinis e Isabel define-se por uma perturbante ambiguidade, a começar pela sua própria configuração genológica (patente no título), cinco anos antes de D. João e a máscara, por sua vez subintitulado “Fábula trágica”. Trata-se, no dizer do autor, de uma “tragédia toda íntima /…/ à Skakespereana maneira” ou “drama de consciências” com evidentes afinidades à poética dramatúrgica de Mallarmé e Maeterlinck que entrelaça poesia e silêncio. A relação profunda entre linguagem e música que impregna o universo simbólico e metafísico de Dinis e Isabel vai ao encontro directo da concepção ideista da linguagem que Mallarmé enuncia e anuncia no seu ensaio “La Musique et les Lettres” (1896) e que será nosso propósito evidenciar: «que la musique et les lettres sont la face alternative ici élargie vers l’obscur; scintillante là, avec certitude, d’un phénomène, le seul, je l’appelai l’Idée» (Mallarmé, 2003: 69). Justificar-se-à, neste contexto, uma referência (e uma reverência) à recriação musical desta peça sob a forma de Suite Teatral pelo maestro António Vitorino de Almeida em 1990.
Paterson, Adrian (National University of Ireland) The Seven-Sided Tomb: Yeats, Magic and Music The verse of W.B.Yeats (1865-1939) assumes a poetic authority. It does so by rhetorical strategy, binding together opposites and oppositions in the held tension of a cadence, the sound of the words restraining their sense. It also, as the world knows, sought a deeper-rooted power by resting on a subterranean bedrock of (sometimes obscure) magical symbolism. Rarely is it recognised that such symbolism too has a fundamentally musical basis: that when Yeats founded his verse on magical investigations he was founding it on a musical ordering of the world. Yeats though, in his essay on ‘Magic’ (1901), was quite explicit: “Have not poetry and music arisen, as it seems, out of the sounds the enchanters made to help their imagination to enchant, to charm, to bind with a spell themselves and the passers-by? These very words, a chief part of all praises of music or poetry, still cry to us their own origin”. The sounds of poetry and music then work explicitly through magical precedent; not perhaps so surprising a conclusion, yet so too, Yeats argued, did all symbols: “I cannot now think symbols less than the greatest of all powers whether they are used consciously by the masters of magic, or half unconsciously by their successors, the poet, the musician and the artist”. This paper then recovers a lost history. A good if eccentric historian himself, Yeats’s studies in magic took him back to a time when music’s role in the ordering of the universe was unquestioned – to Plotinus’ neo-Platonic harmonies, to the magical philosopher, Marsilo Ficino, who explained the heavens through music theory, to the alchemist John Dee and the Rosicrucian manifestoes, with their hermetic musical and number symbolism. The paper describes how a strict Pythagorean number theory was overtaken in Yeats’s poetry by the more dissonant, rhythmic, somatic conception of music that holds sway in his later verse, and fires some of his major lyrics. Evidently Yeats sought the power of verse beyond its manifestation on the printed page, and to do so he knowingly, and with surprising and dogged accuracy, appropriated music’s traditional power together with ancient and Renaissance explanations for it. The investigation must perforce go beyond the hidden play of seven and twelve in his verse; it asks why Yeats when it suited him considered poetry as music, and what the significance of magical researches might be for modernism and its new forms, to consider what one of the twentieth century’s major poets meant by music’s power, and the musical connection between sound and symbolism.
Karen Bennett (CEAUL – Universidade de Coimbra) Premonitions of Doom: The Musical Power of Salomé When Richard Strauss saw Oscar Wilde’s play Salome in Max Reinhardt’s 1901 production, he felt that it ‘cried out for music’. Indeed, the insistent repetition of dramatic phrases, incantatory dialogue, fashionable orientalism and stark emotional contrasts all lent themselves very well to iconic representation through music, as became abundantly clear in Strauss’ famous opera, first performed in 1905. This paper examines the various semiotic resources that Strauss used to effectively ‘translate’ Wilde’s play into music. They include an exploitation of the possibilities for signification inherent in musical genre, traditional tonality and operatic convention, as well as the use of Wagnerian leitmotif and musical quotation. The result is a musical portrait of world teetering on the brink of moral bankruptcy –an effective rendering of Wilde’s fin-de-siècle spirit, which also offers a subtle comment upon Strauss’ own times.
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Alberto Pacheco
Almeida Ana (Universidade de Aveiro - INET/MD) O poder da música como território de resistência identitária e cultural no contexto póscolonial: Damão e a diáspora Esta comunicação propõe uma reflexão sobre o modo como as comunidades damanenses católicas residentes em Damão (Índia) e em Leicester e Peterborough (Reino Unido) encontram na música um escudo identitário sobre o qual se inscrevem diferentes discursos. Em Damão, a música tende a estar repartida pelas diferentes gerações, correspondendo a cada uma diferentes tipos de repertório. Enquanto a mais velha se identifica com um repertório que designa por indo-português (música e dança herdadas dos portugueses e um género musical local designado por “mandó”), as gerações mais novas adoptam sobretudo música anglo-saxónica e música portuguesa actual veiculada pelos meios de comunicação de massa. A música adquire ainda um papel central na construção de lugares de diáspora à imagem do território de origem e esta recontextualização (Bauman e Briggs 1990) das práticas performativas por mim estudadas é dinamizada no Reino Unido por duas associações que podem ser vistas como um lieux de mémoire, na acepção de Pierre Nora (1989), pela sua determinação em recordar, parar no tempo e impedir o esquecimento. A música contribui, assim, para a identificação e demarcação da comunidade damanense católica, tanto em Damão como na diáspora, e das suas diferentes gerações. Através da música, os damanenses exprimem a sua identidade cultural (Chambers 1994; Hall 1990 e 1996), transmitem inter-geracionalmente as suas tradições (Hall 2008; Shils 1992) e reforçam uma diferenciação em relação à restante população damanense não-católica, no caso da Índia, e em relação à população britânica e às minorias étnicas e culturais, no contexto diaspórico. Na medida em que o conceito de “diáspora” corresponde a uma deslocação cultural mais do que a uma simples deslocação de indivíduos, esta comunicação procura reflectir sobre as seguintes questões: qual o papel desempenhado pelas tradições herdadas do território de origem, que são transportadas e representadas no espaço de acolhimento? De que forma estas práticas expressivas são recontextualizadas na diáspora e qual a função da música neste processo de negociação, conciliação, construção identitária e criação do lugar? De que modo a música é apropriada por estas comunidades e utilizada enquanto elemento fulcral num discurso de resistência cultural e identitária?
Storch, Christian (University of Göttingen) Music and Mission in Early Colonialism, or, How the Pagans were ‘Convinced’ of Christianity When we talk about music's relationship to the discourse of power in a Portuguese city like Braga, we necessarily need to refer to the history of colonialism, and not only of that with roots in Portugal. The missions, who had already begun in earnest in the Middle Ages with expansions to Russia, the Middle East, and Africa, immediately discovered new possibilities shortly after Columbus landed on Guanahani in 1492. Vasco da Gama’s arrival in India in 1498 and Cabral’s first landing on the coast of later Brazil in 1500 made it possible for missionary orders, such as the Franciscans or the Dominicans, to create worldwide networks that would become a powerful system for proselytization. The proposed paper is part of a post-doctoral project and will show how the worldwide network of missions, particularly those of the Jesuits, functioned in the era of early colonialism between the sixteenth and the eighteenth centuries. The main focus will be the role of music in missionary work. As will be shown, music functioned as a way of reaching the local people in almost all regions in
which the Jesuits and other missionary orders were active. As a very subtle but powerful means of proselytization, music became more and more important, especially for missionaries who worked with orphaned children. The Jesuits applied in one part of the world what they had learned in another and thereby created a global system of musical education that also included adapting musical form and structure along the lines of local music traditions. However, missionary work was not always in harmony with the political intentions of the colonial powers. Hence, conflicts arose between the missionaries who “merely” wanted to “convince” the “pagans” of Christianity whereas the colonial powers often simply wanted to enslave them. Either way, the indigenous people were robbed of their identity, if indeed they survived at all. In conclusion, the paper will therefore focus on music's position between intercultural exchange and cultural segregation.
Silva, Mónica; Silva, Luciana (Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra) Guerra Colonial: pautas identitárias no canto e contracanto português 50 anos após o início de uma guerra não assumida e espraiadamente silenciada, Portugal reúne as condições para reflectir sobre as memórias da Guerra Colonial, sejam elas privadas, familiares ou públicas. Este acontecimento contemporâneo dilacerou a sociedade portuguesa dividindo-a, ainda hoje, entre um tardo-imperialismo heróico e a indignação perante uma guerra absurda. Neste trabalho, propomo-nos analisar a produção musical entre 1961 e 2010, como registo de um período histórico complexo que ainda hoje marca a realidade portuguesa. O corpus recolhido abrange vários géneros musicais: desde o hino que exaltou o início de uma guerra ao rock como revolta denunciadora, passando pelo fado como expressão de uma identidade camuflada, pelo cançonetismo ligeiro e apolítico, pelos desabafos musicados pelos cancioneiros militares, pela recuperação de canções germinadas na Primeira Grande Guerra e pelo canto de intervenção como pedra angular da futura democracia e liberdade de povos. É, de facto, o canto de resistência que ressalta de toda a recolha. Ao longo da década de 60 aparecem novos ventos que trazem trovas de “alguém que resiste”, de “alguém que diz não”. Trata-se de um género musical que foi ganhando terreno e poder contra um regime que tinha os dias contados. Em Portugal ou no exílio, vários são os cantautores que vão denunciar uma Guerra sem sentido, fazendo-o muitas vezes através do recurso à poesia interventiva de poetas, também eles comprometidos. O canto de resistência foi um grito contra a guerra levada a cabo por um regime que se recusava a aceitar a queda do seu império imaginado. O mapa musical é diverso e complexo, como a própria guerra o foi, e leva-nos a reflectir sobre o poder da música nas dinâmicas políticas e sociais, na reconfiguração de identidades num país em transformação e na construção da memória colectiva da Guerra Colonial.
Sheyla Castro Diniz (Universidade Estadual de Campinas) "Milagre dos Peixes" em tempos de “Milagre Econômico”: O Clube da Esquina e a resistência político-cultural à ditadura militar brasileira “Milagre dos Peixes” é o título de um LP (long-play) singular dentro do repertório da MPB (Música Popular Brasileira). Lançado pela gravadora brasileira Emi-Odeon em 1973, o disco é o álbum de carreira do compositor, cantor e multi-instrumentista Milton Nascimento e figura entre as obras fonográficas dos artistas vinculados ao Clube da Esquina, tendo em conta a participação maciça de alguns membros integrantes do grupo na sua produção: Fernando Brant (produtor e letrista), Ronaldo Bastos e Márcio Borges (letristas), Wagner Tiso (arranjador e instrumentista), Novelli (instrumentista), Nelson Ângelo (compositor e instrumentista), entre outros. Sem adentrar em detalhes sobre a configuração do Clube da Esquina, este trabalho pretende trazer à tona a importância política, cultural e musical do LP “Milagre dos Peixes”, a começar pela acirrada censura imposta à maioria das letras de suas canções, pois continham, segundo o Departamento de Cultura e Diversões Públicas do governo militar, mensagens subversivas aos interesses do regime. No entanto, a não liberação do conteúdo literal de algumas canções não impediu que o álbum fosse
produzido, cabendo aos recursos sonoros a responsabilidade de “dizer” o que foi proibido. O encarte do disco, por exemplo, traz o nome dos letristas de cada faixa, mesmo àquelas que somente dispõem de arranjos instrumentais, numa demonstração de protesto e indicação de que as suas letras foram impedidas de serem cantadas. Já a composição que dá nome ao disco traz uma alusão metafórica – ao evocar um mito cristão carregado de valores fincados no amor ao próximo – ao projeto desenvolvimentista vulgarmente conhecido como “milagre económico”, pautado no progresso material desmedido e arbitrário da nação ao longo da década de 1970. Repleto de vocalizações entrecortadas e empregadas de maneira desconexa nos arranjos musicais, o LP “Milagre dos Peixes” explora recursos vocais que invocam gritos, sussurros, pios de pássaros, lamentos, sílabas soltas e instrumentação carregada de timbres orquestrais e percussivos. A sua sonoridade experimental tensa leva-nos a concluir que a proibição das letras não barrou a criatividade musical marcada pela crítica social e pela resistência à falta de liberdade artística durante os anos 1968-1974, período no qual a censura às produções artísticas agiu de forma mais acirrada.
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Diósnio Machado Neto
Fitzgerald, Mark (Dublin Institute of Technology) Subverting the Political: Engagement and Non-Engagement in the Music of Kevin Volans and Gerald Barry When we think of music and politics in the late twentieth century more often than not it is popular music, the symbol of protest movements, that springs to mind and in one sense this is not surprising. Art music of the past has become associated with the establishment and wealth. Composers of the post-war period seemed preoccupied with a pure modernism untainted by ephemeral issues of society and even the perceived politically subversive nature of the music of John Cage, Morton Feldman and other Americans was as much the result of cynical marketing by EMI who issued recordings under the banner of ‘Music before Revolution.’ Given the political non-engagement of such leading avant-garde figures as Karlheinz Stockhausen and Mauricio Kagel, it is not surprising that many of their pupils in the heady atmosphere of 1970s Cologne rejected their approach to music and sought other ways of engaging with and communicating through music. And yet the amount of music which directly tackles political issues remains relatively small. This paper examines works by two pupils of Stockhausen and Kagel, Kevin Volans and Gerald Barry, which directly or indirectly touch on significant political situations from the close of the twentieth century. Kevin Volans, a white composer born in apartheid riven South Africa spent much of the 1980s directly confronting his musical, cultural and political heritage in his music. Gerald Barry on the other hand is an Irish composer whose work seems to have deliberately turned its back on the violence, division and romanticised history that has underpinned much popular and traditional Irish music, in favour of subversive exploration of intense sexual relations. This contrast of approach and the uneasy relationship between music and the political ethos from which it stems will be illustrated by an examination of Barry’s setting of an account of the Anglo-Norman invasion of Ireland that he described as his ‘contribution to the peace-process.’
Javadi, Yaghoob, (University of Tehran) The Application of Music as an Effective Weapon by the USA Army in Iraq War It is recognized as an established fact that music is used as an instrument by governments to mobilize masses for their intended purposes. Historically-speaking, during the Cold War era music, and specifically jazz music, seemed a very effective way for diminishing the credibility and appeal of Soviet communism in the Eastern bloc and beyond. Being aware of the influence of music, governments have used or abused music for different purposes. Military interventions have not been an exception when the issue of making use of music is considered or, to be more precise, music has been at the spotlight of attention for this cause. One of the main functions of music for armies has been recruiting soldiers and boosting their morale at the battlefields. However, this point should be kept in mind that different governments and armies make use of different types of music to achieve their various objectives. This paper intends to investigate the application of music as a tool by the United States' government in Iraqi war since the beginning of the US-led invasion of Iraq in 2003 and after that. This paper has found that metal and rap music are among the most common types of music that are used by American soldiers before missions, patrols, and raids to prepare themselves for the combat. This paper studies what types of music are focused upon by the US army for recruiting soldiers and dispatching them to the mission and supporting them over the mission. The paper has found that new technology has paved the way for unprecedented application of music by
American servicemen in Iraq. Comparing this trend with the past American wars, this study has revealed that music has played a more direct and significant role in the lives of soldiers in Iraqi war than in the previous American military conflicts.
Pereira, Sónia (Universidade Católica) Rock Music and Toxic Discourses in the Context of September 11th th
This paper aims at questioning the role of rock music in the context of post-September 11 America, focusing in particular in issues of censorship and the deployment of patriotic discourses, through the case study of American-Armenian new metal band System Of A Down and their album Toxicity, exploring the significance, meaning and effects of its overtly critical political stance and the possibilities it offered not only as a challenge to those discourses, but also as an opportunity for articulating dissent through music, within a highly constrained cultural, social and political context. Nowadays, probably more than ever before, music has become a part of everyday life, as a complex experience providing a powerful vehicle for actively generating and circulating meanings that may encompass some of the most crucial human emotions, such as pain, anger, joy, affects, desire and pleasure, but also offer possibilities of identification, empowerment, critique and transgression. Music can provide individual and collective experiences of pleasure and identification, but it may also offer instants of playful celebration as much as oppositional protest. At the same time, music is also a commodity and, as such, part of an industry, and one that generates millions in profits for big corporations every year. Thus, this study looks at some of the defining features of the postmodern era and their relation to the changing nature of rock music in recent times, exploring in detail the specificities of new metal and the difficult relation between the fostering of diversity and the capitalist logics of the market. The analysis of Toxicity is conducted through the prism of toxic discourses, seeking to demonstrate how music has proved able to articulate a series of globally shared concerns at the centre of sociopolitical debates, and enabling an understanding of this specific form of popular culture as it is permeated by contemporary contradictions and conflicts and elicits critical responses. The notion of toxicity and the implications of toxic discourses are examined in detail, looking into the concept of discourse as defined in relation to power by Michel Foucault, and exploring the visions of a risk society and a toxic world as depicted by Ulrich Beck and Lawrence Buell. These visions of the omnipresence of toxicity in post-industrial society are, then, exemplified through the songs of Toxicity, which offer a powerful questioning of what is deemed as a new world disorder.
Giandoni Wolkoff, Gisele (Centro de Estudos Sociais, Coimbra) Movements of resistance in Edward Kamau Brathwaite´s jazz poetry This paper establishes a reading of poems that belong to the trilogy The Arrivants, by Edward Kamau Brathwaite, and that are representative of an aesthetics of dislocation which appears throughout the author´s poetic works. The selected poems´ articulated dislocation can be read as both cultural resistance and a journey of self-discovery. Based upon postcolonial theories that allude to Homi Bhabha´s ideas on hibridity and Avtar Brah´s notion of diaspora, this presentation reads music as composed along the analyzed texts and how they constitute a strategic discourse of postcolonialism in postmodernity. Breaking up the silence through muffled drums, and exposing it in poetic words that are clearly jazz poetry, makes Brathwaite´s works fundamental in the creation of colonial resistance by means of intermedial art – in this case, poetry and music; but it also challenges the dual logic of power between the oppressor and the oppressed peoples, going beyond it and questioning the space of difference. Can music empower people? How does it reverberate in the Anglophone Caribbean reality? These are two of the main issues that should be dealt with along this presentation.
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Elisa Lessa
PORTAS de FREITAS Mariana (Fundação Calouste Gulbenkian / S. Música) A Escola de Canto de Orgaõ de Caetano de Melo de Jesus (Salvador da Baía, 1759-60): uma apologética musical do Antigo Regime, em plena época de transição para o Iluminismo Em 1759, a cidade de Salvador da Baía era ainda o centro vital da colónia do Brasil, onde se concentrava quase todo o fausto e riqueza da colónia. Tendo já os dias contados como capital do vice-reino (que em 1763 se transferia para o Rio de Janeiro), a Baía ocultava esse início de decadência com uma vida social, cultural e religiosa brilhante, que procurava rivalizar com a Metrópole. Nesta época, a música sofrera já uma evolução conceptual e estilística, mas o cantochão e as cerimónias religiosas continuavam a ser os elementos largamente predominantes na vida musical. É neste contexto que surge o tratado de Caetano de Melo de Jesus, mestre de capela da catedral de Salvador. Com uma extensão e aparato teórico invulgares, a obra revela o projecto ambicioso de edificar uma grande compilação de referência que reunisse todo o saber disponível sobre música. Embora em muitas passagens não seja original, é um projecto sem paralelo na teoria musical portuguesa, que procura ombrear com os grandes tratados espanhóis de referência, de Cerone, Lorente ou Nassarre. Tendo como horizonte teórico a concepção boeciana e os conceitos da solmização hexacordal de Guido, e seguindo o método escolástico (lectio, disputatio, conclusio) transposto para os séculos XVI e XVII pelo movimento peninsular da Segunda Escolástica, o padre Caetano erige um vasto «teatro de erudição» musical recheado de argumentos de auctoritas. Redigido no estilo da prosa doutrinal religiosa do Barroco, o seu estilo historiográfico carece de toda a crítica ou hierarquização das fontes, como era próprio de uma abordagem que considerava a história como um ramo da retórica. Revela, assim, uma visão da Música teocêntrica e simbólica, uma cosmogonia cristã, claramente pré-iluminista e alheia à historiografia documentada e racionalista da Real Academia de História criada por D. João V. Apesar de concluída em 1760, a obra integra-se filosoficamente na produção intelectual característica da primeira metade do século. Em plena época de difusão das Luzes, uma obra apologética da religiosidade contra-reformista, da tradição pedagógica da Igreja e, em última análise, das estruturas de pensamento do Antigo Regime.
Fernandes, Cristina (INET-MD - Universidade Nova de Lisboa) Entre a apologia do poder real e as aspirações da burguesia: manifestações musicais em torno do nascimento de D. Maria Teresa, Princesa da Beira (1793) O acontecimento de maior vulto e impacto mais duradouro que assinalou as comemorações do nascimento da princesa D. Maria Teresa, primogénita do futuro Rei D. João VI e de D. Carlota Joaquina, em 1793, foi a inauguração do Teatro de São Carlos. Mas, para além deste acontecimento (cujas premissas sociais, ideológicas e culturais são bem mais complexas), este nascimento real foi objecto de algumas das mais sumptuosas celebrações da segunda metade do século XVIII, não só em Lisboa, mas em todo o país. Na maior parte delas a música teve um papel crucial, combinando uma espantosa variedade de géneros sacros e profanos, eruditos e populares, que nos permitem fazer uma síntese das principais práticas musicais em voga em Portugal nos finais de Setecentos. A mesma burguesia em ascensão que financiou o Teatro de São Carlos — “um teatro de corte para a burguesia” nas palavras de Mário Vieira de Carvalho (1993:50) — assumiu nestes festejos típicos do Antigo Regime e da apologia do poder real um protagonismo fora do comum que, a nível musical, se traduziu na tentativa de imitação e competição com modelos
musicais típicos da monarquia. Exemplos emblemáticos como os do comerciante Anselmo da Cruz Sobral (também ele um dos financiadores do São Carlos) e do Intendente Pina Manique, com o seu faustoso Tríduo da Real Casa Pia do Castelo e as Festas na Real Praça do Comércio “oferecidas à cidade”, para além de outras iniciativas, serão analisados em paralelo com as comemorações promovidas pela própria Casa Real a partir de relatos coevos, dos quais um dos mais completos é a Memória Histórica de Inácio Sousa de Menezes (1793). Os discursos musicais são claramente usados como estratégia de afirmação e ascensão social num quadro complexo, que combina a tradição herdada com aspectos mais cosmopolitas, o prestígio advindo da participação de elementos das estruturas musicais da corte com novas práticas de sociabilidade urbana. Neste quadro multifacetado intervêm alguns dos principais compositores portugueses da época (como João Cordeiro da Silva ou António Leal Moreira) e surgem algumas das raras actuações de Luísa Todi em Lisboa, cuja colaboração com os cantores da Capela Real e dos antigos teatros reais (onde nunca foi admitida a actuação de mulheres) só é possível num contexto exterior à corte, ainda que nitidamente inspirado por ela.
Bastos da Silva, Jorge (Faculdade de Letras da Universidade do Porto) O Preconceito Anti-Operático no Classicismo Inglês A presente comunicação debruçar-se-á sobre o modo como a cultura literária do Classicismo inglês encarou a voga da ópera italiana, que em inícios do século XVIII ameaçava instalar-se em Londres fazendo forte concorrência ao teatro de matriz neoclássica. À época, a desconfiança perante um espectáculo que se afigurava estrangeiro, irregular e desnatural, exprimiase em reflexões críticas, paródias e invectivas que denotavam uma preocupação com a degenerescência do gosto e do próprio carácter nacional inglês ou britânico. Entre os intervenientes nessa controvérsia encontravam-se intelectuais como Joseph Addison, Alexander Pope e John Dennis. Estes autores (que, a despeito das suas reticências, não deixaram, eles próprios, de escrever para música) foram porta-vozes de um conjunto de preconceitos, mas também produtores de uma série de apreciações crítico-analíticas, nas quais transparecem ideias que se prendem com concepções de propriedade literária, de decoro estilístico ou mimético, enfim, de racionalidade. De uma maneira geral, verifica-se que a abordagem crítica da ópera italiana – e a discussão em torno das “espécies” da ópera, inclusive da possibilidade de criação de uma ópera nacional inglesa – se confunde com debates internos ao pensamento literário do Classicismo britânico e às condições sócio-institucionais da sua existência, abarcando desde logo a problemática do prestígio e do poder social (a ópera era decisivamente apoiada por uma aristocracia cujos pergaminhos de gosto os intelectuais – burgueses – punham em causa), a par da questão do prestígio e do poder britânicos no conspecto das nações. Nas páginas do Spectator, Addison satiriza a moda da ópera, que tem por ridícula e perniciosa. Pope escreve um prólogo para um drama do mesmo Addison (Cato, que teve um dos mais retumbantes êxitos do palco londrino no século de Setecentos) em que reclama que o público britânico se liberte das “traduções francesas” e do “canto italiano”, um eloquente manifesto de nacionalismo cultural em nome do verdadeiro mérito dramático, que se pressupõe coincidente com a assunção da natureza do povo britânico e de uma autêntica racionalidade. Dennis, por seu turno, em An Essay on the Opera’s After the Italian Manner, which are about to be establish’d on the English stage: With some reflections on the damage which they may bring to the publick, oferece a formulação crítica mais consistente à voga da ópera italiana, apreciando-a mais aturadamente à luz de um discurso do gosto e da virtude.
LOPES SIMÕES, Manuel (ILCH/UMinho) Antonio Gallassi, Le Cri de la Doulleur, e o movimento contra-revolucionário em Londres Os anos subsequentes à Revolução Francesa foram plenos de movimentações contrarevolucionárias. Londres torna-se um refúgio para figuras associadas ao Ancien-Régime e simultaneamente local escolhido para sede do movimento conspirativo. É neste quadro que se entende o recurso a variados instrumentos de propaganda e mobilização, nomeadamente a
publicação em Londres, em 1792, de Le Cri de la Doulleur, ária panfletária e patriótica convocando os franceses à reunião em torno do Rei e à rejeição da onda “libertária e sanguinária” que ensombrara a França. Sobre versos de M. de Curt, deputado à Assembleia Constituinte por Guadalupe e um dos membros mais activos do movimento, a composição da música foi confiada a Antonio Gallassi, então ainda mestre de capela da Sé de Braga. Que circunstâncias terão propiciado o encontro entre de De Curt e Gallassi? Que ecos tiveram na cidade minhota os acontecimentos vividos em França? Na resposta a estas e outras questões assumem particular relevância as notícias da presença em Braga e Norte do país, desde princípios de 1792, de refugiados franceses em Portugal ou de passagem para Londres, com destaque para o músico Pierre Anselme Marechal.
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Ângelo Martingo
José, Carmen Lucia (Universidade São Judas Tadeu) Canção Brega: a mediação cultural da política de promoção O século XX foi culturalmente próspero para o consumo, realizado por todos os segmentos sócioculturais. A Indústria Cultural configurou um jeito de ser, de sentir e de pensar totalmente determinado pelo quanto se pode consumir para manter a balança comercial sempre favorável. A partir de 1930, a industrialização da cultura criou movimentos no interior da produção a fim de tornar o mercado capaz de atender à nova demanda de consumidores, constituindo a classe média como a principal referencia da balança; isso foi denominado de consumo de massa; daí em diante, a Indústria Cultural precisou das mais diferentes fontes repertoriais para fazer surgir e manter a canção de massa e uma de suas modalidades foi denominada Canção Brega, tema deste comunicado. Nos últimos dois anos, vários centros de pesquisa mercadológica apontaram para o surgimento de uma nova classe média brasileira, decorrente das ações políticas e econômicas do presidente Luis Inácio Lula da Silva, em seus dois mandatos. Os resultados das pesquisas mostram que a nova classe média brasileira é formada pela promoção de pessoas que, até recentemente, se encontravam nos segmentos mais baixos da pirâmide social brasileira. Apesar do desenho dessa nova classe média ter adquirido contornos melhores definidos nos últimos anos da primeira década do século XXI, já nos anos de 1980, a indústria cultural realizava vários balões de ensaio com textos culturais que carregavam signos retirados do universo cultural desses segmentos, isto é, as estruturas musicais matrizadas pela produção industrial passaram a ser preenchidas por significados marcadamente regionais e insistentemente veiculadas pelas mídias que cobriam todo o território nacional. Desde então, a produção musical brasileira é dominada por modismos, tais como: o sertanejo, deslocado do interior paulista para a metrópole paulistana; o axé, canto-dança baianos nacionalizados pela Rede Globo de Televisão; o forró, deslocado da comunidade tradicionalregional nordestina para a balada dos universitários. Enfim, esses modismos revelam a força apresentada pela canção de massa ao funcionar como mediação cultural antes mesmo da efetiva política de promoção sócio-econômica; a dinâmica da canção popular que, antes, era considerada brega, porque identificava os segmentos baixos, e, hoje, é o som nacional dos emergentes do Brasil.
González-Martín, Javier (Universidad de Almería) El Flamenco de la marginalidad En nuestro comunicación pretendemos mostrar cómo se ha transformado la visión y posición del Estado frente a la expresión flamenca desde la regulación (casi prohibición) de los espectáculos en los que el flamenco formaba parte a través de los Reales Decretos de 1888, 1900 y 1909 en los que se hacía un llamamiento a “el respeto a la moral y a las buenas costumbres… no permitiéndose canciones obscenas, bailes lascivos” hasta su inclusión en el Estatuto de Autonomía de Andalucía o la presentación por parte de España del Flamenco como Patrimonio Inmaterial de la Humanidad ante la Unesco ya en la primera década del siglo XXI. Junto con este recorrido de carácter político/legislativo también repasaremos cómo la intelectualidad española se ha enfrentado por/con el flamenco, encontrándonos una fuerte corriente de opinión contraria a esta manifestación cultural que surgió a finales del siglo XIX con figuras tan importantes como la del filósofo Ortega y Gasset y que tuvo su momento más alto con la figura de
Eugenio Noel (1885-1936), el más colérico antiflamenquista de todos los tiempos, que pensaba que la renovación española pasaba por la ruptura con los mitos nacionales. Frente a este posicionamiento contrario al flamenco la bibliografía flamenca inicia una etapa de dignificación coincidiendo con la “etapa teatral” del flamenco como expresión artística. Los autores más destacados son Manuel de Falla, Federico García Lorca, en la que la preocupación principal que encontramos en los textos de estos autores es la de liberar de la visión de lacra social que tiene el flamenco, pero al mismo tiempo y tal vez lo que más ha influido con la adquisición por parte del flamenco del rango de arte, y fechar el origen de la investigación sobre el flamenco.
Gill, Susan (Dublin Institute of Technology) A DIY Music Practitioner as Interface: A Study of Networks, Community & Biopower The techno-social landscape of popular music production, distribution and consumption has altered in recent years with more and more artists choosing to operate outside of the major record industry. Traditionally the 'Do-It-Yourself' or DIY model of music production has been associated with genres such as punk, post-punk and indie, however it is becoming a popular option for artists of all genres, and this increase in the autonomous production of music sees the possibility of DIY becoming normative practice. This research proposes the relevancy of immaterial labour (Hardt and Negri 2000) to understanding the type of subject operating within contemporary DIY music activities. The notion of immaterial labour proposes that the type of labour employed in producing the informational, cultural and creative input of commodities and services has become hegemonic in dominant capitalist countries. It is argued by Hardt and Negri, that immaterial labour, produces social networks, forms of community and biopower, in which agents act as an interface between various labouring activities. The socio-economic existence of these agents is characterised by precariousness, hyperexploitation and mobility, whilst simultaneously produced by the struggle against such. Critics of Hardt and Negri (Henwood 2003, Dyer-Witherford and de Peuter 2005) note the lack of systemic research into this phenomenon, and it is the aim of this study to address this deficit with reference to contemporary modes of music production. In doing this, the networks created by and through DIY music activity, the community in which these labouring practices are conducted, and the channels through which the social lives of DIY music participants are controlled, are investigated as features of immaterial labour. Methodologically qualitative, this triangulated study is conducted via focus groups, in-depth interviews and participant-observation with various DIY practitioners, ranging from musicians and record labels, to promoters and consumers.
Belda Castillo, Asunción; González Cueto, Irene (Universidad de La Rioja) Mercado musical actual: creando listas de éxitos El poder siempre ha utilizado cualquier medio a su alcance como elemento propagandístico y de control de masas, entre ellos la música. En la actualidad el poder económico, que a su vez implica el político y social, sigue haciendo uso de los medios a su alcance para su propio mantenimiento. Desde la aparición de Internet asistimos a una transformación del modelo de creación, producción, difusión y consumo de la música. Las discográficas, ven ahora cómo a través de las nuevas tecnologías, los propios músicos han pasado a ser productores y distribuidores a través de la red, distribución gratuita en muchos casos, facilitando así el acceso a la música de forma ajena a las compañías. Este cambio también afecta a las radiofórmulas, conocidas y utilizadas desde los años sesenta, pasando de una radiodifusión basada en la relación directa con las discográficas a una radiodifusión que se mueve a través de los derechos de representación y edición que las emisoras de radio detentan en base a su pertenencia a grandes grupos empresariales multimedia.
En este nuevo sistema la música ejerce un gran poder sobre el público pero, al mismo tiempo, es el público quien en última instancia decide sobre la música y es en las ventas de los discos donde se ve reflejado y desde hace unos años ya no se venden tantos discos como en décadas anteriores. En la actualidad lo que impera no es tanto la estética (artística) como la rentabilidad para todos los engranajes que conforman la industria discográfica. Debido a esto se ha establecido una lucha por el control de la música en Internet: una lucha en la que están en juego los derechos de los consumidores-usuarios y los derechos de autor, establecidos como elementos antagónicos que perjudican o benefician a unos o a otros dependiendo del país y de la legislación vigente y que difícilmente caminarán juntos, en un porcentaje muy elevado la controversia se ve suscitada por las descargas gratuitas a través de diferentes programas y páginas web que limitan las ganancias en una industria que ve cómo poco a poco se va quedando obsoleta y necesita nuevas vías para seguir siendo económicamente fuerte.
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Sílvia Araújo
Martins, Inês Rôlo, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa Female-Fronted Metal: um pseudo-género musical para a marginalização da mulher artista. No Ocidente, onde a experiência dos homens é tomada como universal e normativa, um cometimento académico à autoridade e autenticidade da experiência das mulheres pode produzir mudanças em cenários já explorados. As abordagens feministas aos estudos musicais vêem a música como sendo simultaneamente produto e promulgadora de uma ordem social de género. A música metal constitui uma prática cultural com um código próprio, que também contempla uma instância visual e verbal, oferecendo ocasiões para realizar género. Noções de género circulam em textos, sons, imagens, comportamentos e práticas de metal - a música é, pois, também, um discurso gendered. A perspectiva dos estudos culturais feministas permite-nos olhar a música metal como artefacto cultural, considerando simultaneamente a sua construção técnica e as mensagens de género que veicula. Neste contexto, a criação do pseudo-género do female-fronted metal que, como o próprio nome indica, supõe a agregação de todas as bandas em que a posição de vocalista é ocupada por alguém do sexo feminino, sublinha e centraliza não só o sexo de quem canta, como o seu género – o feminino – de uma maneira que não acontece com o homem e o masculino (a norma). Desta forma, poderá o género constituir uma prisão para a mulher artista que é de imediato arrumada numa prateleira que não olha à música que compõe? Como pensar a articulação de duas posições complexas dentro desta subcultura, a posição da performer e da mulher, dois estatutos que as artistas se vêm obrigadas a conciliar? Através da análise textual e imagética de parte da revista LOUD!, única revista portuguesa sobre este estilo musical e partindo das perspectivas teóricas de Whiteley (1997, 2000), de Lauretis (1987), Walser (1993), Frith (1998, 2004) Clawson (1999) entre outros, procuro compreender como se constitui aqui o género como categoria
definidora e limitativa da mulher artista e como é entendido o seu corpo e trabalho. Numa subcultura masculinizada e numa publicação escrita (maioritariamente) por e para homens, que lugar ocupam estas mulheres? Como são retratadas discursiva e visualmente? Que vozes se fazem ouvir?
Grácio, Rita - Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra Mulheres no rock português O mundo do rock - e não só o português... - é dominado por homens: as bandas são constituídas sobretudo por homens e os críticos musicais são homens. O rock nasce como contracultura nos Estados Unidos dos anos 50 do século XX e é também assim que se afirma em Portugal, a partir dos anos 80, década do boom do rock português. No entanto, o “sistema” que os músicos portugueses criticam nas suas letras é o mesmo sistema, patriarcal e machista que as suas letras reproduzem. Esta análise parte de uma “close reading” das letras das bandas de rock portuguesas, constituídas por homens, dos anos 80 até à data presente, verificando-se a persistência de certas representações das mulheres. As mulheres aparecem num contexto sexual, amoroso ou familiar, são referidas sobretudo pelos seus atributos físicos e são infantilizadas. Estas representações são muitas vezes reforçadas pelos media. É o que indica a análise de notícias, reportagens e entrevistas aos músicos no Público, em programas de TV, em sites, blogs e fóruns temáticos, que complementam a análise das letras. No entanto, pode haver alguns sinais de mudança. O movimento musical feminista norte-americano “riot grrrl” assumiu-se em Portugal por uma banda, “Les Baton Rouge”. Também a análise de letras de algumas bandas sugere que o conceito de “comédia” (Bernstein, 1992) tem uma forte capacidade interpretativa – os cantores assumem as convenções e os estereótipos, mas implodem-nos através do pathos do ridículo, do excesso e do sarcasmo.
Ricardo Ivan Barceló Abeijón Universidade do Minho Guitarra, música e poder feminino no período napoleónico. Na transição do século XVIII para o século XIX ocorreram grandes mudanças políticas e sociais, assim como avanços no caminho de emancipação da mulher. Foi também a época do florescimento da Guitarra clássico-romântica, da qual o guitarrista francês Guillaume Gatayes (17671846) diz, no seu Método do ano 1800, que pode ser um “instrumento de coqueteria” para as senhoras. Portanto, a guitarra era considerada um instrumento adequado, tal como a efémera Liraguitarra, e a Harpa, para as executantes amadoras. Sabemos que Gatayes era o músico preferido da Rainha Hortense de Holanda (1783-1837), filha de Josephine (1763-1814), a esposa de Napoleão (1769-1821). Por outro lado, em 1801, Charles Doisy (?-1807) publica o Método mais completo da sua época para Guitarra e Lira-guitarra. Este livro foi dedicado a Madame Bonaparte que, na sua infância, tinha estudado guitarra na Martinica, embora mais tarde se tenha tornado harpista amadora, sendo, aliás, uma grande melómana. Hortense, que tinha um verdadeiro talento musical, também estudou harpa e pensamos que este facto motivou Gatayes a aprender a tocar também este instrumento e a escrever, em 1793 - quando a futura rainha da Holanda tinha 10 anos - um método para o mesmo. A época napoleónica também coincidiu com uma crise do violino, provavelmente propiciada pelos novos gostos das damas nobres, que levou muitos violinistas a emigrarem para o instrumento emergente: a guitarra de seis ordens. Entre estes encontrava-se Niccolò Paganini (1782-1840), até que a sua fama de violinista virtuoso chamou a atenção de Elisa Bonaparte - irmã de Napoleão - no Principado de Lucca em Itália. Depois de algum tempo dedicado principalmente à guitarra, Paganini ingressou, em 1805, como solista de violino e maestro de música de câmara na corte de Lucca, mas, em 1809 abandonou este cargo para começar uma importante carreira violinística, apresentando-se nas principais cidades do Império. Atendendo aos acontecimentos mencionados, achamos que o importante papel desempenhado pelas mulheres próximas do poder no ambiente musical europeu na era napoleónica - influenciando notoriamente as tendências dos músicos deste período histórico - é merecedor da nossa atenção.
Guimarães, João Paulo (Universidade de Coimbra) Rock my Decals Off, Baby: Captain Beefheart, Blues-Rock and the Monstrosity of Otherness Over the last few decades, much ink has flowed on the fabulations and biographical eccentricities that cluster around the figure of the recently deceased Captain Beefheart. His music has been the subject of euphoric, albeit somewhat perfunctory, treatment by a whole army of pundits in the field. Nevertheless, although many years have passed, it was his lyrics that critics chose to neglect the most. With this paper, which will eventually be expanded into a full-fledged MA thesis in the near future, I intend to stretch the room for debate over what I think is one of the greatest bodies of poetic work that has ever come out of the world of Rock. Throughout my text, I will try to approach the way Beefheart's oeuvre bridges the gap between the texts of Rock and Blues performers and many canonical literary works from his time, through a back-and-forth close-reading of poems by authors ranging from The Beatles and Robert Johnson to A.R. Ammons and Frank O'Hara. By doing so, I will attempt to show how some of the staple themes from Rock's traditional repository acquire a new degree of freshness and complexity when seen through Beefheart's highly selfconscious poetic lens. In "Abba Zabba", the untrammeled libido of the Stones is revamped into an ironical meditation on the artificial nature of gender and desire; "She's Too Much For My Mirror" takes the recurring trope of the "unruly lover" and injects it with the oomph derived from a hyperbolic portrayal of the "Woman" as the radical other of the subject and as the symbol of the violent languages that lie beyond the boundaries of the "I". His texts ought, after all, to be carefully perused, both for incarnating through their lines the utopian spirit of the 60's and for maintaining a critical and sceptical distance towards it. This hybrid quality of his poetry has allowed Beefheart to age well and the challenges that his work throws at us remain valid and elusive to this day. The fact that his work still allows us to look into the future without taking our eyes from the dreams of the past can then be said to constitute the real Magic that looms behind Beefheart and his Band.
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Manuel Lopes Simões
Pacheco, Alberto José Vieira (CESEM / UNL – FCT) Música Constitucional Os movimentos constitucionais, seja em Portugal, seja no Brasil, representaram um momento de grande debate e consequente reforma política. D. João VI e seu filho D. Pedro foram personagens fundamentais no processo que inaugurou a Monarquia Constitucional em ambos os países - D. João VI jurando a Constituição de 1822; D. Pedro elaborando a primeira Constituição Brasileira de 1824 e outorgando a Carta Constitucional Portuguesa de 1826. Como não podia deixar de ser, cada uma destas constituições foi celebrada pelos liberais com muitas festas, nas quais a música tomou parte em forma de cantatas, elogios, dramas alegóricos e hinos, sem falar na música instrumental. Grande parte dos compositores e poetas, desde os diletantes até os profissionais mais prestigiados, esforçaram-se para homenagear estas leis numa produção poética e musical numerosa e variada. O próprio D. Pedro foi responsável pela composição de alguns hinos, de entre os quais o "Hino da Carta", que acabou por se tornar o hino nacional português, até ser substituído pela actual "A Portuguesa". Mas este repertório vai além dos hinos, como pode ser visto, por exemplo, na "Relação dos festejos que tiverão lugar em Lisboa […] por occasião do juramento prestado à carta", de 1826, e tantos libretos de produções dramático-musicais impressos naqueles dias. Por outro lado, a música foi também usada pelos absolutistas, liderados por D. Miguel I, como forma de contestar a nova ordem política, em especial, sob a forma de hinos e canções políticas. O que se pretende nesta comunicação é mostrar como esta produção musical foi ferramenta usada para divulgar o discurso político dos grupos que disputavam o poder neste momento histórico, além de demonstrar a que ponto a música estava relacionada com os mecanismos de legitimação do poder real, em especial num momento em que a própria monarquia luso-brasileira era posta em discussão.
Santos Luís (CESEM) Música e civilização: o discurso sobre música no periódico Amphion (1884-1898) Na segunda metade do século XIX, o plano cultural português foi marcado pelo ímpeto renovador representado pela chamada Geração de 70. Conscientes do «atraso» português em relação do mundo «civilizado» da actualidade europeia, os protagonistas desta geração advogavam uma arte socialmente empenhada, considerando que esta era a única que poderia corresponder aos imperativos do progresso da Humanidade, que se dirigia inexoravelmente para uma época que traria a libertação das opressões políticas, económicas e religiosas. Neste sentido, atribuíam ao intelectual, particularmente ao poeta, a missão de conduzir a Humanidade a esse tempo perfeito utópico. A cultura era, assim, elevada ao estatuto de um instrumento reformador da sociedade. O meio musical português da época registou igualmente as consequências deste processo. Figuras como as de Joaquim José Marques, José Ferreira Braga, Ernesto Vieira e Júlio Neuparth manifestaram a sua preocupação com o progresso social e cultural, reservando um papel fundamental para a música no processo de regeneração da sociedade. Esta ideia materializou-se de forma duradoura no periódico musical Amphion, fundado em 1884, no qual era evidente a atribuição de uma missão civilizacional à música, bem como a ideia de que o artista «genial» possui uma perspectiva privilegiada da realidade, proporcionando à Humanidade os meios para a sua regeneração. Esta situação verificava-se em especial no discurso sobre a música sinfónica, nomeadamente no contexto das séries de concertos empreendidas na década de 1880 pela orquestra da Associação Música Vinte e Quatro de Junho. Nesta comunicação pretende-se explorar o discurso sobre música publicado no periódico Amphion (1884-1898), com o objectivo de identificar
as bases ideológicas de um discurso que atribuía à música um “poder” civilizacional. Pretende-se, igualmente, conhecer os motivos para a preferência pela música sinfónica germânica, bem como demonstrar como o periódico se assumiu como veículo ideológico, tendo desempenhado um papel central na formação da opinião pública.
Campos, Ana Rita; Marques, Sónia (Universidade do Minho) EDUARDO da FONSECA e CÉSAR das NEVES: um discurso musical pela Pátria. O Hino Patriótico enquanto prenúncio de um pensamento nacionalista Numa época conturbada política, social e culturalmente, Eduardo da Fonseca e César das Neves surgem como dois vultos incontornáveis no panorama musical português. Uma monarquia fragilizada marca a viragem do século. O confronto directo com a maior potência imperial da época culmina com o Ultimato Inglês de 1890, transformando-se num dos maiores confrontos internacionais vivido pela nação portuguesa. O regicídio de 1908 prenuncia já o triunfo de uma nova ideologia política que se concretizará na implantação da república em 1910. Neste clima de instabilidade político-social, multiplicam-se as manifestações musicais patrióticas. São inúmeros os compositores que neste período dedicam a sua atenção à composição de hinos de louvor à pátria. Disso é exemplo “A Portuguesa” de Alfred Keil, adoptado como hino nacional em 1911, ou mesmo, o “Hymno Patriótico” de Eduardo da Fonseca e César das Neves, nosso objecto de estudo. Pedagogos, compositores, tipógrafos e editores musicais estabelecidos na cidade do Porto, Eduardo da Fonseca e César das Neves iniciam, neste período, uma estreita cooperação, sendo o “Hymno Patriótico” fruto deste trabalho conjunto. Esta comunicação centrar-se-á numa obra musical que se constitui como um reflexo de uma sociedade dividida entre monarquismo e republicanismo, mas definitivamente com um pendor nacionalista.
Elisa Lessa (Universidade do Minho) Música e expressão ideológica: Buchenwald para piano solo de Eurico Thomaz de Lima (1908-1989) A presente comunicação pretende dar a conhecer alguns factos reveladores do pensamento político e intelectual do compositor Eurico Thomaz de Lima. De forma sucinta caracteriza-se o estilo musical da sua obra e, em particular, Buchenwald - Protesto musical para piano solo. Trata-se de uma obra referencialmente política enquanto denunciadora de uma realidade específica, cujo conteúdo musical revela múltiplos significados.
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Paula Guimarães
Pisarska, Katarzyna (Marie Curie-Skłodowska University) Music as the Colonizing Other in Iain Banks’s Canal Dreams This paper seeks to explore the relation between music and cultural identity in Canal Dreams, one of the lesser known mainstream novels by the Scottish writer Iain Banks, which combines the poetics of Künstlerroman and the formula of a political thriller. Depicting the life of Hisako Onoda, a Japanese cellist who builds her personal world around the Western values and classical music and distances herself from her native Japanese culture, the novel invites the investigation of the ways in which both the artistic identity and the cultural Self of the protagonist are constructed through the adoption of the Western Other. In the paper I postulate that classical music in Canal Dreams functions as the colonizing force, due to which Hisako develops a substitute Westernized Self while her Japanese Self is relegated to the position of the Other and pushed into the realm of the personal unconscious. In consequence, she is slowly alienated from her native cultural space and unresponsive to its signs and symbols, which turns music into a tool of the Western world’s cultural hegemony. Moreover, by her immersion in music Hisako finds refuge within the culture of peace, which paradoxically prevents the heroine from embracing her Japanese heritage associated in the novel with the atrocities of war and violence (she is a posthumous child of a soldier father who died as a result of the Hiroshima blast). The heroine’s colonised Self, battling against the false identity, repeatedly resurfaces through violent dreams full of Japanese cultural symbolism. The analytical basis of the paper is provided by the structural-semiotic methodology of Tartu-Moscow School, (Lotman, Uspiensky, Toporov) and especially the concept of the semiosphere. Among the relevant critical works that are likely to contribute to the understanding of the problematics of the novel are B. Anderson's "Imagined Communities" and Levinas's "Alterity and Transcendence".
El Hosseiny, Alya (Cairo University) Mirrors and Reflections: Propaganda in Salah Jahin’s ‘Soara’ Nasser's regime, established in Egypt between 1954 and 1970, was at once dictatorial and highly popular. This paper focuses on a propaganda song by Egypt's most popular modern poet, Salah Jahin, to promote Nasser's regime. Jahin produced a large body of work in colloquial Egyptian Arabic, which has received little attention in academia, despite its significance from both a literary and a cultural viewpoint. This paper aims to show how pro-Nasser argumentation is relayed using different means, including the structure of the text, stylistic devices and its performance as a song. It demonstrates how multilayered rhetoric permeates the poem and how interdisciplinary perspectives help analyze the text to realize its full meaning.
Semião, Mario (University of Dalarna) Musicalization and Self-Reflexivity: The Case of Gabriel Josipovici’s “Fuga” Published in 1987, “Fuga” is included in Gabriel Josipovici’s notable collection of short stories, In the Fertile Land. Like his oeuvre as a whole, the collection is made up of texts not only generally characterised as experimental, but which display a strong intermedial dimension. While some of the stories include specific references by the author to artists from other media, “Fuga” does not provide any explicit hint about a musicalizing intent, except for its title.
This paper shall thus, on a first stage, discuss the concept of musicalization, focusing on what is meant by musicalized fiction and reflecting on whether “Fuga” constitutes such a case. Drawing on a reading of Josipovici’s short story, the study moves on to assess the function of music as a dynamizing element in the text, serving to lay bare its own linguistic and textual premises. The appropriation of music by the story represents thus a self-reflexive act, a way to reflect upon and problematize its own form. While taking “Fuga” and Josipovici’s work as a point of departure, the discussion comprises theoretical reflections on the intermedial relationship between literature and music. This paper aims thus to propose the existence of an inherent metadimension underlying musicalized fiction in general.
Arnold, Michael (University of Minnesota) th
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Invective Poetry in 15 Century Spain and 21 Century American Gangsta Rap In this paper I focus on some commonalities between several different aspects of two genres of poetry which couldn’t be more distinct at first glance, yet through careful investigation, prove to have much in common: Fifteenth century Spanish court poetry and the genre referred to today as Gangsta Rap. Gangsta Rap is a dominant subgenre of rap that was established during the mid-1990s. The themes include gang-related violence, pornography, misogyny, and homophobia, and it is often characterized musically by a driving beat and caustic lyrics. The lyrical focus revolves around African-American inner city (ghetto) problems and the violent lives and lifestyles of street-thugs and urban gangsters. To compare the two genres, I look at two overarching characteristics they share in common: invective poetry as product of resistance due to a marginalized state in regards to race and religion under an oppressive society; and lyrics (products of the aforementioned situation) which are used as weapons to attack the oppressor or, alternatively (and more frequently), used to attack other marginalized poets in order to establish the author as superior to his target. In order to do this I will look at the socio-economic state of both groups as well as the lyrics these situations produced through their respective writers. I also contrast the distinct genres, focusing on the ways the two communities saw themselves and constructed themselves through their poetry. The biggest difference I noticed was the overall intent of the final product: to assimilate into the dominant culture (as in the case of the converso court poets during the century in which Spain would see the expulsion of all Jews by the court of Ferdinand and Isabel in 1492), or to separate from the dominant culture (as in the case of the self-marginalization of politically-charged rap of the late twentieth and early twenty-first century). In the spirit of Barbara Fuchs’ argument in her article “Postcolonial Past” (Co-written with David J. Baker), I consider the identities of both groups from the perspective that the colonial period really has neither beginning nor end, and thus these two genres can fall into a perspective that gives us a better idea of the artistic production of these “colonized” groups and a shared identity that falls outside of the post-modern Western constructions that had defined them.
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Eunice Ribeiro
MENDES, MARIA DO CARMO (DEPL / ILCH, Universidade do Minho) O jazz na literatura moçambicana da Negritude Enquanto género musical de origem negra, o jazz norte-americano afirmou-se como mecanismo de revolta contra preconceitos raciais e desigualdades socio-económicas, e de protecção dos mais desfavorecidos. Idênticos valores nortearam os fundamentos das literaturas africanas de língua portuguesa, designadamente a literatura moçambicana. A influência do jazz e de alguns dos seus principais intérpretes – Miles Davis, Billie Holiday e Louis Armstrong – foi marcante no apelo poético à dignificação dos negros e dos seus valores culturais, expresso em escritores como Noémia de Sousa, José Craveirinha e Rui Knopfli. Os objectivos principais da comunicação são, assim: 1) demonstrar que quer o jazz norteamericano, quer a poesia da Negritude tiveram idênticos propósitos de valorização dos negros; 2) evidenciar a aclamação, na poesia da Negritude, de intérpretes de jazz; 3) identificar composições poéticas moçambicanas que recorreram ao intertexto musical como referência para a denúncia da opressão dos povos africanos; 4) comprovar que o jazz foi um instrumento de poder para a afirmação da literatura moçambicana.
Diogo Martins (CEHUM, Universidade do Minho) Discurso(s) do corpo, da letra e da música: a violência segundo Alanis Morissette A escrita confessional de Alanis Morissette, cantora e compositora canadiana, é perspectivada pela própria, não apenas como um processo de desinibição catártica ou de auto-indulgência poética, mas também como um exercício simultaneamente psicológico e político: aquilo que metaboliza o solipsismo do texto poético e/ou musical não é mais do que um sintoma ou uma consequência do cenário globalizante da sociedade. Assim, esta comunicação pretende elucidar o modo como algumas letras de Alanis Morissette desenvolvem o conceito de violência num sentido transpolítico. Por intermédio da hermenêutica de um corpus musical específico, procurar-se-á assinalar as simetrias entre a “guerra fria” conjugal e a “guerra fria” sociopolítica, partindo do diálogo intersemiótico propiciado pelas lyrics, textos que articulam complexamente o silêncio grafémico do poema per se, por um lado, com a voz da artista, o corpo, os arranjos musicais e a performance em palco, por outro, enredando toda uma série de discursos convergentes. Interessa-nos, assim, na senda do corrente debate em torno do pós-humanismo, da identidade sem corpo e da hiperrealidade – sob as lentes transfiguradoras dos mass media –, compreender de que forma a dramaturgia musicalmente eclética de Alanis Morissette, com base no álbum e na tournée denominados Feast of Scraps (2002), permite uma reflexão (1) sobre o lugar que ainda está garantido para a violência real, em vez de torná-la hedonista, alienante e virtual; (2) sobre a violência num estado de sublimação eticamente comprometido, em vez de estar situada no facilitismo atrófico da desumanização; (3) sobre a assunção da responsabilidade moral perante o Outro, quando vivemos numa sociedade líquida e num regime que facilita a transgressão dos interditos. Por outras palavras, será o amor, no nosso discurso ético, um reflexo nítido ou derivante do imperativo categórico kantiano, ou teimamos em convertê-lo numa sentimentalidade excessiva, que está a mais no nosso corpo até perder toda a sua significação? Alanis Morissette ensaia as suas próprias respostas, ainda que reticentes.
Ribeiro, Ana (UM) A música em representações literárias do transporte de escravos
Como informa George O. Nedge no seu Culture and customs of Mozambique, a música é um elemento omnipresente nas diversas actividades dos africanos. Esta característica está patente nas representações de África feitas em textos como Nação crioula ou O outro pé da sereia, embora tenham por contexto períodos diferentes da história africana. Notámos que, com maior ou menor destaque, a música é um ingrediente comum aos episódios que, nestas obras, relatam o transporte de escravos. A identificação das características dos cânticos africanos entoados num navio negreiro permitirá a indicação dos efeitos ideológicos subjacentes a esta manifestação, efeitos que se vêem potenciados quando, como no romance de Mia Couto ou no célebre “Navio negreiro” de Castro Alves, entra em cena música de outros continentes.
Maria do Rosário (DER/ILCH, Universidade do Minho) FALTA ------- FALTA ------- FALTA ------- FALTA ------- FALTA ------- FALTA -------
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Maria do Rosário Santos
Fonseca, Ricardo (Universidade do Minho) Oppositional discourses on Fado music: a love-hate relationship Fado has always been subjected to various appropriations and approaches, depending on the political views or social status of the person discoursing about it. If on one hand it was initially praised by left wing supporters of the Republic and communists in general, on the other it was detracted in the early stages of Salazar’s Estado Novo by the regime’s cohorts. The leftist supporters of the genre appreciated its popular and activist roots (vd. Sousa, Avelino de) whereas the fascist critics wrote against its melancholic, hammer and sickle-like, self-defeating nature (vd. Moita, Luiz). It is only with the inception of national radio, in 1933, that Fado becomes a national symbol, and, with the city’s plans to modernize the historical and traditional quarters of Alfama and Mouraria, the genre symbolically evolves from fado menor to fado canção (vd. Colvin, Michael). The Regime then adopted it as an exportable cultural object, a perfect example of the new Lisbon and the new Portuguese nation. Nevertheless, on the 25th of April of 1974, the Estado Novo falls to the revolution and the general discourse, now mostly from left-wing and center political opinion circles, harshly criticizes and once again condemns the genre, now linked to over 40 years of authoritative, rightwing dictatorship. In recent years, Fado music has been the subject of a strong revivalism in a myriad of ways: it has been praised as the nation’s strongest musical expression, and it is now on the verge of achieving world heritage status, while evolving in various directions as a musical genre. Through the analysis of oppositional discourses surrounding the genre, this paper will thus argue that much like any cultural manifestation, Fado is equally liable to political manipulation, and is not exempt from social appropriation.
Gomes, Ana (Universidade do Minho) Musicoterapia: Prática de Saúde e Educação ao Longo da Vida Nesta análise apresenta-se uma abordagem teórica da prática da musicoterapia enquanto processo de promoção de educação, desenvolvimento e (re)surgimento do indivíduo para a sociedade, promovendo a sua saúde individual e comunitária. Neste sentido compreende-se a importância de caracterizar devidamente esta prática de saúde, recorrendo e reflectindo sobre a evolução histórica e conceptual da terapêutica pela música. Da mesma forma, consideramos pertinente perceber a real influência que a terapia musical pode causar no indivíduo através da percepção do cérebro humano da recepção de musicoterapia numa perspectiva holista e da influência corporal inerente a esta percepção do sistema nervoso. Procuramos portanto analisar o real tratamento de patologias através de experiências musicoterápicas e assim perceber, mais concretamente, a concepção de música curativa. Apresentamos uma análise que pretende levar-nos a perceber como, através da audição ou prática musical, é possível o restabelecimento da homeostasia natural do ser humano numa perspectiva permanente de auto-organização da pessoa humana enquanto elemento da natureza, bem como compreender a música enquanto produção natural, biológica e consumada pelo Homem para o Homem. A aquisição de competências através da musicoterapia, pelo poder curativo da música, apresenta-se inalienável neste compêndio e é premente a abordagem ao modelo que nos possibilita falar em desenvolvimento integral do indivíduo em mudança pela música, o modelo de empowerment. A capacitação das pessoas pela musicoterapia é assim apontada como objectivo primordial desta prática, sendo através dela possível a descoberta de novas mestrias e uma nova actividade do ser para o mundo e do mundo para o ser.
A nossa abordagem final reflecte a importância da prática musicoterápica enquanto um processo de educação ao longo da vida e de promoção permanente de saúde, apresentando-se como a forma que o doente tem para se encontrar ou reencontrar consigo mesmo, se conhecer e reconhecer como membro pertencente a uma sociedade, comunidade e se perceber nas suas singularidades.
Cravinho, Pedro (Universidade de Aveiro) ‘A música agora é o jazz’: O Jazz como palco de resistência em Portugal, entre 1971 e 1973 “A música agora é o jazz” é o título do panfleto que circulou no Festival Internacional de Jazz em Cascais, em 1973. Entre 1971 e 1973, no contexto do Estado Novo, no cenário de guerra colonial/independência e em plena “primavera marcelista” realizaram-se em Portugal os primeiros Festivais Internacionais de Jazz. Estes eventos, configuram um espaço de resistência política e contestação à guerra colonial, explorado por músicos no palco e vivenciados pelos milhares de jovens presentes. Os Festivais Internacionais de Jazz de Cascais tiveram na sua primeira edição o patrocínio da Secretaria de Estado de Informação e Turismo, órgão que tutelava os serviços de censura. Todavia, apesar do controlo institucional, o evento criou oportunidades de reivindicação do direito à livre expressão. Neste estudo parto da dedicatória de Charlie Haden aos movimentos de libertação de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau, e da exaltação proferida por Roland Kirk, formuladas no decorrer das suas actuações nos festivais de Jazz de 1971 e 1973, respectivamente, para proceder à análise do alcance social e politico da música Jazz, em Portugal, nos primeiros anos da década de 1970. Na verdade, o Jazz, no contexto dos Festivais Internacionais de Cascais, parece ter propiciado a criação de um palco de luta política, possibilitando a identificação de jovens com um modelo de sociedade alternativo ao regime autocrático vigente. Com esta comunicação pretendo discutir o papel do Jazz, enquanto prática social à escala do palco (Stokes 1997) e como potenciador de experiência de realidades “possíveis”, ou seja, para lá “do que nós já pensamos e experimentámos” (Turino 2008).
Eakins, Keith Rollin and Sarah Tillotson (University of Central Oklahoma) Indie Rock Bands and Environmental Activism For decades, rock musicians have been involved in politics. Beyond using their artistic expression as a medium for political advocacy, they have participated in events to benefit and raise awareness of numerous causes ranging from famine relief to nuclear disarmament. In recent years, “Indie Rock” artists have been promoting environmental causes and striving to engage in their profession in ways that minimize environmental degradation and consume fewer resources. This article examines the nature of indie rock musicians’ involvement in environmental activism, attempts to explain the reasons for this involvement, and speculates on the impact thereof. It first addresses the difficulties and controversies related to forming a precise definition of indie rock then describes the characteristics of indie rock, the culture associated with it, and the socioeconomic characteristics of its fan base. The article then argues that indie rock musicians and indie culture are well-suited for environmentalism. For example, indie rock’s “do it yourself” (DIY) ethic, insistence of authenticity, aversion to corporate control and excess, austerity in production, and penchant for veganism are values and practices tailor-made for embracing eco-activism. The article then explains how indie rock musicians’ approaches to political activism differ from those of rock musicians from earlier eras in that the rhetoric is less strident and “preachy” and there tends to be a focus on leading by example. It asserts, furthermore, that given their audience’s pre-existing concern about environmental issues these artists’ political advocacy is “safe” as it is unlikely to upset or alienate their fans. The article then chronicles the types of environmental advocacy undertaken by indie rock musicians including organizing benefits for environmental causes, holding festivals emphasizing green practices (e.g. Bonnaroo), cooperating and strategizing with environmental advocacy groups such as the Natural Resources Defense Council, and establishing record labels that manufacture products in environmentally-friendly ways. The article concludes that although the current popularity
of indie rock may seem to be at odds with its independent, outsider, anti-corporate ethos, it seems likely that its practitioners’ environmental advocacy will continue potentially fostering greater environmental consciousness and greener practices in society.
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Vítor Moura
Costa, Marta Nunes (CEHUM, Universidade do Minho)
Adorno Revisitado - entre a indústria cultural e a filosofia do silêncio
Adorno é conhecido por ser um intelectual crítico do status quo, com background em música que lhe confere um outro tipo de autoridade nas críticas que faz. A sua obra insere-se no contexto da tradição crítica da Escola de Frankfurt onde, filósofos e pensadores, confrontados com as atrocidades da Segunda Guerra Mundial, são obrigados a rever e redefinir os parâmetros pelos quais as grandes disciplinas se regiam, tais como a Filosofia enquanto Metafísica e a sua relação com a verdade, ou a Moral enquanto critério universal versus Ética enquanto possibilidade de conduzir uma vida moral. Esta apresentação pretende ser apenas um prelúdio à obra densa e vasta de Adorno, concentrando-me numa questão principal, a saber, como podemos pensar a moral hoje. Para isso farei uma reflexão sobre a tensão imanente entre, por um lado, a indústria cultural em que estamos submersos, e da qual a música assume uma função exemplar e, por outro lado, a promessa de libertação através da figura do intelectual e artista, isto é, através da promessa de autonomia da obra de arte. Nesta dialéctica auscultarei os argumentos a favor e contra a filosofia como grito de independência da comodificação cultural. No entanto, ao limitarmo-nos a Adorno na nossa busca de moral, condenamo-nos a uma filosofia do silêncio e resignação, onde pouco ou nada pode ser feito para contrariar as tendências de comodificação. Para contrariar tais tendências considero alternativas onde o paradigma musical assume papel catalizador e transformador da sociedade.
Chaib Danilo (Universidad de Granada) Critica a los tipos de escuchas del discurso musical de Adorno – Del oyente solitario al oyente solidario T.W. Adorno en su libro “Introducción a la sociología de la música” sugiere siete tipos de “comportamiento musical” en el cuál clasifica las reacciones de las personas al discurso musical: 1)El tipo del oyente experto; 2)El tipo del buen oyente, 3)El tipo del oyente con formación también llamado por Adorno como consumidor cultural, 4)El tipo del oyente emocional, 5)El tipo del oyente resentido, 6)El tipo del oyente entretenido, en las palabras de Adorno, que “que escucha la música como entretenimiento y nada más”, y como última categoría, 7)El tipo del oyente indiferente, no musical y antimusical. El oyente de música en solitario es un personaje moderno, afirma Storr, pero este estudio trae la figura del oyente bajo la luz del paradigma comunicativo: El oyente solidario como resultado de un ambiente igualitario. A partir de un estudio de caso de una Tertulia Musical en Barcelona, el estudio cuestiona la validez de esta clasificación de Adorno, donde la omisión de la solidaridad en la escucha musical no considera el cambio multicultural de las personas que tienen la experiencia de escuchar la música, y sus consecuencias en su aprendizaje. Estos elementos causados por la solidaridad es relacionada con seis principios del Aprendizaje Dialógico, desarrollado por Flecha y CREA a través de estudios en la educación de adultos: 1)Diálogo Igualitario; 2)Igualdad de Diferencias; 3)Inteligencia Cultural; 4)Creación de Sentido; 5)Dimensión Instrumental y 6)Transformación. Para romper barreras elitistas, desarrollaron actividades para personas transformar conceptos antes distantes y ajenos como la música clásica, llamadas Tertulias Musicales. El esquema propuesto por Adorno es testado en este estudio, en el que la solidaridad se
solidifica en un espacio de diálogo igualitario, y se da más importancia a las diferencias de cada uno, valorando la inteligencia cultural de cada oyente, dando más sentido social a la escucha, como un instrumento de valorar las personas y sus experiencias intimas.
Martingo, Ângelo (Universidade do Minho) The force of structure: Music, language, and the sweet power of expression Music has often been discussed in terms of language (Adorno, 1956), and the structural similarity of speech and musical communication has been object of ample empirical research. Namely, Lerdahl and Jackendoff’s (1983) Generative Theory of Tonal Music has proved to be an invaluable instrument for modeling music cognition. Derived from linguistic models, it shows that a listener familiarized with tonal music organizes discrete elements into coherent hierarchical pitch and tonal structures. In particular, grouping structure, time-span reduction and prolongation reduction (Lerdahl and Jackendorf 1983:229), are inferred from musical surface according to well formedness rules, transformational rules, and preference rules. When such hierarchical relations are quantified in terms of tension and attraction, Generative Theory of Tonal Music and related models of music perception and cognition have also been shown to enlighten expressive deviations in performed tonal music, as well as expert listener’s preferences regarding recorded music interpretations notably, interpretations in which expressive deviations are correlated to music structure cognitive models are preferred to the detriment of interpretations in which such correlation are not the case. Reviewing the literature on music and language, while at the same time considering established theory on the mechanisms of social circulation of music, namely, music preferences as a factor of distinction, this paper aims at situating music in the light of Bourdieu’s notion of symbolic power, insofar as it constitutes a structured and a structuring form of communication.
Telmo Rodrigues (Instituto de Filosofia e Linguagem) Uma Questão Sensual e Uma Questão Moral Propõe-se uma releitura de alguns momentos da ópera Don Giovanni, de Mozart, à luz de dois textos sobre a mesma: «The Immediate Erotic Stages or The Musical Erotic», de Soren Kierkegaard, parte integrante de Ou/Ou, e «Don Giovanni as an Idea», incluído em On Opera, de Bernard Williams. Uma das frustrações ao ler trabalhos sobre as qualidades da música advém da dificuldade inerente a esta, por não possuir correspondentes directos entre os seus elementos e conceitos ou objectos definidos fora dela, e concretiza-se numa tendência para a generalização, para uma tentativa de resolver os problemas que a música enquanto arte levanta através do recurso a noções etéreas sobre o inatingível. De certa forma, e apesar de se apresentar desde o início como uma correcção a estas posições, o ensaio «The Immediate Erotic Stages or The Musical Erotic», de Soren Kierkegaard, contém em si algo desta frustração, ainda que de uma forma particular. Propõese aqui uma análise de Kierkegaard em relação directa com o texto de Bernard Williams, «Don Giovanni as an Idea». O texto de Williams é já em si uma correcção a esta tendência generalista, não só em relação ao texto de Kierkegaard, mas também em relação a outras análises e trabalhos sobre a temática da ópera de Mozart. O que se pretende fazer é rever a ópera à luz destes dois textos, olhando-os como complementares, e introduzir duas releituras de dois momentos centrais em cada um: no texto de Kierkegaard pretende-se rever a forma como a música pode transmitir a ideia do sensual, enquanto, no que respeita ao texto de Williams, se pretende reavaliar a leitura do final da ópera. Em ambos os casos, olhar-se-á para a possibilidade de a música poder introduzir leituras inesperadas em excertos linguísticos que, caso não viessem acompanhados dessa música, teriam interpretações díspares daquelas aqui sugeridas.
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Margarida Pereira
Matthias-Tshikuna, Nakia (Ohio University) In Search of Informal Strategies in Popular Music to Guide Social and Behavioral Change in Communication Agendas The formal use of social and behavioral communication strategies in popular music has proven to foment social change (Dutta, 2006). However, informal and intrinsically viable devices situated within popular music discourses are often dismissed and underestimated via the superordination of formal communicative strategies. This is especially evident through the use of Entertainment-Education (Dutta, 2006) strategy as a means to generate discourses through the supplantation of ideas and messages amongst targeted audiences with the aim of influencing social and behavioral change. This paper summons the acknowledgement and valuation of the socio-cultural productions and reproductions that are manifested as popular music. A review of the literature illustrates the dialogical and transformational attributes of popular music amongst the social realm. This is achieved by locating the purposive use of narrative and discursive devices in three musical genres and presenting musicians as narrators and discursive agents. Simultaneously, the work calls for the increased consultation of popular music discourses in the creation of formal strategic communication agendas that seek to affect social change. A historical view to the African musical genres of Zou Glou, Raï and Bongo Flava exemplifies their function as sites and spaces for subversion, negotiation and contestation via ‘informally’ strategic discourses. These musical genres engaged power structures as platforms for the registry of generational, political, religious, gender and class dialogues. These discourses parade the creative and socio-culturally grounded presentation of issues, while their mere existence indicates real and imagined transformation. Ultimately, they are social change exemplars as they challenged mainstream realities and eventually became products of mainstream popular culture. The definition of existing and perceived social issues is central to the utility of popular music (Ntarangwi, 2007; Storey, 2003). As the grounds for social change are rooted in socio-culturally driven discourses (Dutta, 2007; Storey, 2003), popular music genres may provide formal communicative strategies with the most salient, timely and nuanced impetus for social change agendas (Ntarangwi, 2007).
Szarecki, Artur (University of Warsaw) Emancipation of the Listening Body: Popular Music, Power and the Body in TwentiethCentury Polish Culture Despite the dynamic rise of interest in the problem of embodiment in the last 30 years, the relation between body and music is still a marginalized area of sociological inquiry. The aim of my presentation will be, at least partially, to fill this gap. I am mainly concerned with the role of the body in the process of music listening conceived not as perception of sounds but as a set of meaningful social practices. Drawing from the work of Michel Foucault, Pierre Bourdieu and Jacques Attali, I argue that the listening-body must be situated in relation to social order and power relations constituting the field of art. The scope of my presentation will be limited to public acts of listening in the musical culture of the twentieth-century Poland which was characterized by a constant struggle between the emancipatory drives of popular culture and the repressive politics of the Communist Party. The regime of a disciplined body associated with the philharmonic and classical music, was gradually undermined with the advent of jazz, rock and techno, each forming a distinctive bodily mode of listening. Formerly silent and motionless audiences were thus filled with active and self-
aware bodies, connected with each other and the music. An outline of each mode does not represent a full account of bodily practices associated with music listening of the period, but enables me to provide a general frame that would allow for further and more detailed studies in the field. The case of Polish culture in the twentieth century seems especially interesting in this context because the rise of popular music and the politicization of artistic field altogether illustrate how the listening-body becomes the subject of discursive struggle and relations of power.
Carić, Jelena Knešaurek (University of Zagreb) Public Discourse through Professional Music Critics: Two Simultaneous and Diverse Standpoints on Key Issues of a Transitional Society From the very end of the 1980’s, and especially during the 1990’s and 2000’s, Croatia has been transformed into a transitional society, in which culture, and music as its significant part, also became the subject of a highly ideological public discourse. Ideology represents a set of ideas, values or assumptions, which a large number of people in a given society believe in at one time, and which aid in the perpetuation of existing social relations. This set of ideas, values or assumptions can be, more or less clearly, found in every aspect of social life. As music also plays a significant role in a given society, then we have to consider the manifestations of diverse ideologies in the discourse on music. This article will try to show how the same cultural conditions at a particular time and place can create convincing, informed, suggestive and yet ideologically opposite discourses on music, and that all types of discourse are highly politically and ideologically motivated. During the last decades, there were several writers writing very extensively on musical life in Croatia, two of which, Nedjeljko Fabrio, well known Croatian writer, and Bosiljka Perić Kempf, musicologist, regularly published their critics on musical performances. While Fabrio has modestly declared himself as a “pupil of a Maestro”, thus seemingly avoiding a true critical position, his critics emphasize milestones of cultural and national identity in music. On the other hand, B.P.K. is taking the position of someone “who knows” and thus claiming credibility to take position by disclosing the establishment of new elites in the 90’s transition that design classical, state-financed musical production. Through their critical reviews we can follow two diverse ways of creating the discourse on music: one is a positivistic discourse intending to educate and promote artistic achievements of the musicians taking important roles in the society; the other discourse intending to present objective musical criticism and disclose the mechanisms of success, power and credibility in musical life.
Sousa, Marta Noronha (ICS, Universidade do Minho) O Poder Invisível da Música do Cinema: por uma Análise mais Interdisciplinar A maior parte dos discursos produzidos sobre cinema tem historicamente dado particular ênfase a dois elementos constituintes do filme: a imagem e a palavra. Por um lado, os autores ligados aos estudos fílmicos tendiam a estudar, no cinema, quase exclusivamente o que viam como seu elemento constituinte: a imagem. Por outro lado, a análise estrutural da narrativa e a análise textual, mais presas à “letra” do filme, foram muito prolíferas em publicações. Mas, um filme também é feito de som; mesmo quando era mudo, o cinema era acompanhado de música. Hoje, nenhum autor ignora a importância do som fílmico e, dentro dele, da música. Ainda assim, o discurso científico, voluntária ou involuntariamente, continua a dar ao som um lugar subsidiário em relação à imagem. Consequentemente, a maioria das análises fílmicas centra-se em aspectos visuais e não auditivos. Para além da sua função estética, a música serve para construir sentido, suscitar emoções e criar espectáculo, e os cineastas – talvez mais conscientes do seu poder do que os teóricos – usam-na voluntariamente para criar esses efeitos e, assim, partilhar a sua visão particular do mundo. No entanto, a música é invisível. Ela é frequentemente entendida pelos espectadores como um complemento da imagem e da história e eles não têm geralmente consciência dessa possível
intenção. Ao ser recepcionada de forma silenciosa, quase subliminar, e pela sua força para mover o público, a música tem um poder acrescido na persuasão do espectador. O problema é que os estudiosos do cinema não têm, geralmente, as competências necessárias para uma análise satisfatória da música fílmica. Por outro lado, uma análise puramente musical das composições poderá não conseguir alcançar o todo da obra fílmica. A minha apresentação visa, através de alguns exemplos práticos, alertar para este poder silencioso da música do cinema e para a necessidade de uma colaboração mais estreita entre teóricos das duas áreas. Esta interdisciplinaridade poderá ainda, numa altura em que se revela urgente uma educação mediática que ultrapassa a velha noção de literacia verbal, contribuir de forma muito relevante para essa educação.
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B2
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Elisa Lessa
DI Rosa, Giampaolo (ILCH, UM) Considerações (per)formativas do discurso na improvisação musical A colocação do objecto musical enquanto fenómeno e consequente necessidade da sua identificação, constitui o ponto de partida para apresentar a qualidade discursiva de qualquer processo musical, cuja individuação é alcançada através das estruturações lógicas integrantes das formas musicais (típicas ou não). Neste sentido, a consideração fenomenológica do objecto musical oferece uma possível abordagem analítica, juntamente com a consideração estética da forma musical. O objecto musical definido pode assim, com alguns vínculos, ser reconduzido ao âmbito meramente performativo e pragmático – faltando, neste caso, um texto de identificação prévia - da improvisação. A falta deste texto de identificação determina a mudança dos elementos de relacionamento - quer para o performer, quer para o ouvinte - com a actuação musical. Neste caso, analisando a potencialidade performativa improvisatória, poderão ser definidas e identificadas estruturas de matriz narrativa, que implicam relações de comunicação entre, pelo menos, os dois actores mencionados: performer e ouvinte. O performer tem o poder de orientação do processo musical, com finalidade expressiva em tempo real; o ouvinte tem o correspondente poder de recepção auditiva com capacidade analítica e crítica. Em conclusão, pode ser definido um conceito de poder como acção de eficácia expressiva comum, em correspondência aos actores participantes no processo do discurso produzido pela performance/ objecto de audição em tempo real. A configuração actorial passa a ser equilibrada reciprocamente numa perspectiva discursiva de comunicação face ao evento realizado.
Marques, Rui Filipe Duarte (Instituto de Etnomusicologia: CEMD – Aveiro) FALTA ------- FALTA ------- FALTA ------- FALTA ------- FALTA ------- FALTA -------
SANTANA, Helena; SANTANA, ESECD (Instituto Politécnico da Guarda) O Nacionalismo e a definição de discursos políticos e musicais – a resistência política em Portugal e a obra de Freitas Branco A música erudita em Portugal, desde finais do século dezanove até à queda da Monarquia e construção da Primeira República, revela ideias e ideais progressistas desenvolvidos e implementados por numerosos e proeminentes intelectuais. Simultaneamente, a renovação da sociedade e o processo de industrialização, promovem a circulação de ideias e acentuam a busca de uma identidade nacional. É patente o interesse crescente pelas raízes étnicas e culturais, conduzindo diversos artistas e criadores na procura, ininterrupta e metódica, de fontes de inspiração e criação de natureza mais genuína, reflexo de uma sociedade e materialidade portuguesas. Iniciam-se, assim, diversas pesquisas no campo da música folclórica, pesquisas essas que ajudam na definição de uma arte nacional, uma arte que se revelará contrária à tradição italiana dominante no nosso país desde o século dezoito. Todavia, o interesse conhecido por materiais, componentes e/ou fontes de carácter mais genuíno, não desatende o interesse conhecido por todas as actividades de cariz mais intelectual e artístico pelo que se faz além fronteiras e que procura
colmatar deficiências várias, nomeadamente deficiências de formação e informação existentes em Portugal em algumas áreas do conhecimento, procurando a sintonia com diversos centros europeus tais que Paris, Londres ou Berlim. Nesta comunicação analisaremos a forma como os compositores no século precedente utilizam o discurso musical imbuindo as suas obras de um forte cariz político e nacional, gravando nelas traços de uma cultura prenhe de idiomas únicos, onde a luta dos trabalhadores em tempos de enorme dificuldade social, política e cultural, é o que as define enquanto obras de arte portadoras de uma linguagem e significado nacionais. A melodia, o ritmo e a harmonia transparecem nas obras destes autores, demonstrando na formalização dos conteúdos, obras de uma beleza e complexidade ímpares, onde a afirmação da luta cruel de um povo pela libertação das amarras invisíveis de uma monarquia decadente, é o grito libertador para o homem que batalha pela liberdade e pela igualdade de oportunidades no trabalho e na sociedade em que se insere. Buscaremos igualmente a forma como estes elementos se apresentam na criação de símbolos nacionais que definem estruturas musicais plenas de significação.
Gama, Joana (Investigadora independente) "Lisztomania" – The attractive power of Franz Liszt “After beginning his career as a handsome, impetuous young rebel, the idol of the salons of Paris, he conducted several well-publicized affairs and ended up by turning to the consolations of religion” (Reich & Cunningham 2006: 435). The aim of this article is to draw attention to the figure and image of Franz Liszt (1811-1886), regarding the impressive popularity he enjoyed during his lifetime. Having started as a child prodigy, he turned into a virtuoso pianist that was received in mass hysteria by the audiences (specially by women), so that Heinrich Heine coined the term “Lisztomania” to describe the phenomenon. Liszt was a prolific composer (with a very fresh and personal style), a highly-searched piano teacher, a conductor, but it was as a pianist that he obtained an unmatched success in the History of Music. Although he performed a wide range of the piano repertoire, it was when playing his own compositions that he reached an incredible level of virtuosity and expressiveness. In his piano production we can find an enormous contrast of moods, ranging from bucolic and delicate pieces (as “Eglogue” or “Au bord d'une source”) to the “Mephistophelian” pieces (as “Mephisto Waltz” or “Csárdás macabre”), a contrast that he communicated not only with sound, but with gestures and facial expressions. In fact, Liszt's style at the piano is well documented in many caricatures of the time, that always show him in a very energetic position at the piano. Although the so called “virtuoso years” only lasted eight years (1839-1847), during this time, Liszt toured in more than ten countries, when traveling was not easy, and was presented with numerous international distinctions (including the Portuguese “Ordem de Cristo” in 1845 from Queen Maria II). Also known for his generosity, Liszt supported numerous charity and humanitarian causes and was actively involved in the fund raising for the “Beethoven Monument” in Bonn.