UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E TECNOLOGIAS – DCHT CAMPUS XVI – IRECÊ- BAHIA

BOB DYLAN: O SINO DA LIBERDADE

ITAMAR CAMPOS RAMOS

IRECÊ-BA 2013

ITAMAR CAMPOS RAMOS

BOB DYLAN: O SINO DA LIBERDADE

Trabalho apresentado à Universidade do Estado da Bahia – UNEB, como requisito de avaliação para a disciplina TCC – Trabalho de Conclusão de Curso da docente Kedma Barreto com orientação do professor Orlando Freire Júnior.

IRECÊ-BA 2013

ITAMAR CAMPOS RAMOS

BOB DYLAN: O SINO DA LIBERDADE

Trabalho apresentado à Universidade do Estado da Bahia – UNEB, como requisito de avaliação para a disciplina TCC – Trabalho de Conclusão de Curso da docente Kedma Barreto com orientação do professor Orlando Freire Júnior.

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________ Ms. Felipe Serppa

__________________________________________________ Ms. Joabson Figueiredo

__________________________________________________ Ms. Orlando Freire Júnior(orientador)

Irecê-BA, 22 de julho de 2013.

IRECÊ-BA 2013

DEDICATÓRIA

A meus pais... Valdemar Moreira Ramos (in memoriam) e Elias Campos Ramos, por dispensarem a minha formação os valores que me acompanharam por toda vida; A meus irmãos... Valterney Campos Ramos, Rosimeire Campos Ramos e Valdemar Campos Ramos, pela influência que exerceram na minha vida, sobretudo no tema ora apresentado neste trabalho... A Minha esposa... Que soube compreender as minhas angustias e aflições nos momentos de conflitos e dificuldades; Aos meus filhos... Pedro Dylan e Carlos Magno... Serviram me de inspiração sobretudo pela perspectivas do amanhã...

AGRADECIMENTOS

A DEUS... Fundamento de toda verdade.

RESUMO

A importância de Bob Dylan dentro da cultura pop contemporânea é profundamente relevante, a sua contribuição para vários aspectos da cultura moderna marca a sua história como um das maiores artistas do mundo moderno. Influenciando gerações, a sua obra artística atravessa décadas sem perder o valor e tendo releituras por artistas mais novos, por fatos marcantes é inconcebível a cultura moderna sem a sua presença. Este trabalho teve como objetivo analisar Bob Dylan como introdutor da poesia nas canções folk, através de suas canções: Master of War, A Hard rain´s A-Gonna Fall e, principalmente, Blowin´in the Wind. Situando-as no contexto histórico social em que foram criadas. Além disto, também tem o intuito de mostrar Bob Dylan como um artista ímpar, criador de um estilo próprio. Palavras chaves: Bob Dylan, Folk Music, Os Anos 1960, Blowin´in the Wind.

ABSTRACT

The importance of Bob Dylan in the contemporary pop culture is deeply large, its contribution to various aspects of modern culture marks its history as one of the greatest artists of the modern world. Influencing generations, his artistic work crosses decades without losing the value and taking readings by younger artists, milestones for modern culture is inconceivable without his presence. This study aimed to analyze Bob Dylan as introducer of poetry in folk songs, through their songs: Master of War, A Hard Rain's A-Gonna Fall, and especially Blowin'in the Wind. Placing them in historical social context in which they were created. Moreover, it also aims to show Bob Dylan as a unique artist, creator of his own style. Keywords: Bob Dylan, Folk Music, The Years 1960 Blowin'in the Wind.

SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ---------------------------------------------------------------------------------------8

2. CAPITULO I: BOB DYLAN: A linha do tempo------------------------------------------------9 2.1 CONTEXTUALIZAÇÃO---------------------------------------------------------------------------9 2.1 A MUSICA FOLK---------------------------------------------------------------------------------20 2.2 O MOVIMENTO BEATNIK---------------------------------------------------------------------24 2.3 O MOVIMENTO PELOS DIREITOS CIVIS------------------------------------------------26

3. CAPÍTULO II: THE FREEWHELLIN ---------------------------------------------------------27 3.1 MASTERS OF WAR-----------------------------------------------------------------------------27 3.2 A HARD RAIN´S A-GONNA FALL ----------------------------------------------------------31 3.3 BLOWIN’ IN THE WIND------------------------------------------------------------------------34

4. CAPÍTULO III: A originalidade do artista-----------------------------------------------------39

CONCLUSÃO------------------------------------------------------------------------------------------43

REFERÊNCIAS ---------------------------------------------------------------------------------------44

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1. INTRODUÇÃO

Bob Dylan está no centro da cultura pop contemporânea, é um artista de grande proporção comercial e artística. Foi uma grande influência para gerações passadas e ainda é para as futuras. Artista provocador, a sua obra está em constante transformação, não se deixando se estagnar ou ser rotulada. É um artista que está sempre se reinventando e produzindo constantemente. Figura de vanguarda da contracultura, ainda que paradoxalmente tenha pouco ou nenhum interesse ativo pela política ou por causas sociais, a ponto de proclamar que a política é o “instrumento do diabo”, sua mente está em outro lugar, na linguagem e na moralidade antiga da Bíblia e na herança espiritual da música Folk americana. (SOUNES, 2002). O panorama musical dos anos 1960 foi transformado por Dylan ao trazer letras poéticas para a música pop. Ele não teve medo de falar de coisas sérias em um meio que nunca fora levado particularmente a sério, e o fez com tanta habilidade e inteligência e ardor que inspirou outros artistas a segui-lo (SOUNES, 2002). O poder da obra de Dylan é algo maior do que ser simplesmente um artista do entretenimento, que o fará ser lembrado pela grandiosidade da sua poesia. Não sendo como a maioria dos artistas a obra de Dylan ultrapassa vários períodos, dos anos 1960 aos anos 2000 a sua obra ainda é magnífica, deixando um legado de preciosidade para a cultura do mundo. (SOUNES, 2002). Suas canções Blowin´in the Wind, Masters of War e A Hard Rain´s A-Gonna Fall tem sua representação dentro de momentos cruciais da história americana. Canções essas que não ficam restritas aos anos 1960, elas ainda são tão relevantes em tempos de preocupações ecológicas e guerras súbitas quanto foi na época das lutas pelos Direitos Civis. (SOUNES,2002).

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2. CAPÍTULO 1 – BOB DYLAN: A LINHA DO TEMPO

2.1 CONTEXTUALIZAÇÃO “... para assinalar um processo da constituição do discurso: o “esquecimento número um”, de ordem ideológica e que se dá na instância do inconsciente (caracterizado como uma defesa do eu), que resulta no fato de que “temos a ilusão de ser a origem do que dizemos, quando, na realidade, retomamos sentidos preexistentes”. Esse esquecimento reflete um sonho adâmico: o de estar na inicial absoluta da linguagem, ser o primeiro homem dizendo as primeiras palavras que significariam exatamente o que queremos.” (ORLANDI, 2000, p.34-35).

Bob Dylan é um artista ímpar e multifacetado possuidor de uma extensa variedade criativa, não é possível conceber a musica pop contemporânea sem a sua influência. Rompendo com estruturas impostas, ele transita entre canções, livros e cinema, com sua inesgotável capacidade de produzir. A sua relevância na música popular moderna é quase inigualável, é o compositor mais ilustre de sua época. A sua fama não é devida ao sucesso comercial de sua obra, pois em comparação com artistas contemporâneos como os Beatles, os discos de Dylan atingem uma vendagem mediana. Mas seus discos como Blood on the tracks e Blonde on Blonde são pilares da cultura pop, devido à profundidade dos temas e a qualidade artística, o coloca como um dos artistas mais renomados do mundo (SOUNES, 2002). A criatividade de Dylan faz dele um artista irrequieto e polêmico, se apresentando incansavelmente pelo mundo, ele faz de seus shows uma grande novidade devido à habilidade de não executar as canções nas versões originais e de não tocar as canções pedidas pelo público. Dylan é compositor de mais de 450 canções originais, que são grandes clássicos da musica pop, como "Blowin´ in the Wind” “, “Like a Rolling Stone”, “ Tanged up in Blue”. Canções essas que possuem uma variedade temática tão diversa e imagens tão ricas que poderiam ter saído das mãos de um poeta ou romancista (Sounes,2002). O panorama musical a partir dos anos 1960 muda drasticamente com a presença de Dylan, falando de coisas sérias ele levou vários artista a segui-lo. Os cantores e compositores em sua grande maioria devem algo a Dylan, quer seja pela poética nas canções ou pela postura em palco. Dylan revolucionou a estrutura da

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música pop inserindo novos valores, como canções longas e sem refrãos. A banda The Beatles tem, em sua obra, grande influência de Dylan, criando letras mais sérias para suas canções antes tão vazias de temas complexos. A declaração de John Lennon para a revista Playboy de 1966 revela a importância de Dylan na obra dos “Garotos de Liverpool”. Lennon diz: “é preciso ouvir o que Dylan diz, mas não é o que ele diz e sim a maneira como diz.” (WENNER, 2001, p.43). A marca da genialidade de Dylan está na sua capacidade de continuar produzindo obras brilhantes por longo período de tempo. Enquanto outros artistas compunham em dupla como John Lennon e Paul Mcartney, Mick Jagger e Keith Richards, ele produz as canções e baseia as suas apresentações de forma solitária, tornando-se um artista auto suficiente.(Sounes,2002). Bob vai até lá sozinho. Sai do palco sozinho. Escreve aquelas músicas sozinho. Ele é senhor de si. Tem orgulho de sua posição. Não precisa de ninguém para fazer nada. Isso que é ter dom e talento. (SOUNES, 2002, p. 10)

Ícone da cultura pop, Dylan não é um mero artista do entretenimento, ele se tornou um guru para milhões de pessoas que ouvem seus sentimentos e pensamentos expressos em sua obra. As letras de suas canções tornaram-se figuras de linguagem, sendo Blowin´in the Wind a sua maior expressão. Como cantor folk o seu nome está intrinsecamente ligado aos movimentos de causas sociais, juntamente com Martin Luther king e John F. Kennedy. Em meados dos anos 1960, ele começa a utilizar o Rock and Roll como fundo para a sua poesia. A obra de Dylan não se limita a uma só fase de sua carreira, nos anos 1970 lança discos notáveis como Blood on the tracks. Nos anos 1980 lança canções importantes como “Blind Willie McTell”. Nos anos 1990 lança o álbum The Time out Mind, aclamado pela critica e público. Várias gerações cresceram o apreciando e suas canções se tornaram relevantes até hoje, como a Hard Rain A- Gonna Fall. (SOUNES, 2002). Para compreendermos a análise e contextualizar a sua canção Blowin´in the Wind é necessário mostrar elementos biográficos e contextuais de sua vida e dos estados unidos nos anos 1960. Análise deriva do grego e significa “desatar” e define-se como um conhecimento da realidade como diz o professor Massaud Moises (1997, p.13). Os discursos não estão circunscritos a um tempo e espaço mas

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estão presos a juízos de valores. Orlandi (2008, p.54) declara que: “a análise do discurso, preocupa-se compreender a língua fazendo sentido, enquanto parte do trabalho social geral, constitutivo do homem e da sua história”. Dylan se apresenta como vive e não faz uma diferenciação entre o artista e a pessoa comum. Do primeiro ao último álbum ele traz as visões de sua cidade natal e de seu ídolo Woddie Guthrie. A pessoa do discurso está sob forte influência do seu lugar de origem e dos fatos marcantes de sua vida.

A análise do discurso não trabalha com a língua enquanto um sistema abstrato, mas com a língua no mundo, com maneiras de sentidos enquanto parte de suas vidas, seja enquanto sujeitos, seja enquanto membros de uma determinada sociedade (ORLANDI, 2008, p. 15)

A poética de Dylan não é mera organização das palavras em estrutura de versos, a sua poesia é carregada de sentimentos, realidade e humor. Aos 20 anos de idade ele estava dizendo o que artistas contemporâneos e bem mais velhos nem sonhavam em dizer. Umas das marcas da sua genialidade é o fato de seu discurso ser tão intenso e desconcertante em tenra idade. O individuo faz parte da história produzindo a sua linguagem e fazendo significar-se. O blues e a música folk têm forte influência na construção do discurso de Dylan. Ele ouviu a música de seu país, a estudou, compreendeu e a ressignificou. Apresentou-a com seus elementos antigos e adicionou novos. Para compreendermos a ressignificação em sua obra é necessário recorrer aos elementos da análise do discurso. Por ter em sua centralidade o estudo do discurso Análise do Discurso, não estuda apenas a língua e a gramática como distante da realidade da qual o homem está inserido. Segundo Orlandi (2008, p.58): A Análise do Discurso concebe a linguagem como mediação necessária entre o homem e a realidade natural e social. Essa mediação, que é o discurso, torna possível tanto a permanência quanto a continuidade, quanto o deslocamento e a transformação do homem e da realidade em que ele vive. O trabalho simbólico do discurso esta na base da produção da existência humana.

E Dylan tem a base de seu discurso ancorada na tradição e na modernidade. Antes o tema do blues e da música folk era dita de uma forma direta, ele a carrega

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de poesia. Não é possível uma compreensão da sua obra sem associarmos aos locais de nascimento do seu discurso. Vindo de uma tradição de cantores itinerantes, Dylan vive como um cigano, sem “porto”. Os seus shows se prolongam indefinidamente numa turnê sem fim. Dylan canta sobre o seu tempo, mas sempre fazendo incursões no passado. O homem sempre deixa espaço para o garoto de Dululuth que vagava entre os trilhos dos trens carregados de minério. (Sounes,2002). Em seu majestoso álbum Time Out of Mind de 1997, Dylan retoma os temas das antigas canções folk dentro já da modernidade, ele modificou drasticamente a cultura pop dando-a uma nova face, mas, em nenhum momento negou as suas origens. E Com esses movimentos, permaneceu se reinventando, não permitindo a fixação de sua imagem a um aspecto de sua obra. No filme Eu Não Estou Lá (2007), o diretor Todd Haynes expõe aspectos da personalidade de Dylan. Mas sem poder determinar em qual das vertentes Dylan se encontra fixo. A transitoriedade de estados ideológicos deixou Dylan fora de enquadramento. Dizer que ele é judeu, poeta, cristão, rock star, contestador, vagabundo milionário não deixa de ser parte da verdade, mas, a sua figura transcende os liames da classificação. Dylan é um destruidor de valores e criador de outros. Nunca se propôs a ser uma foca adestrada como ele viria a dizer no inicio de sua carreira, vigora em si o real significado da palavra artista. Engenhosidade e originalidade são um dos aspectos da palavra artista. E Dylan é engenhoso. A sua biografia traz todos os elementos que esta indissociável de sua vida. A poesia de Dylan é a sua vida, grande observador da existência humana, Dylan funciona como uma antena que capta e transmite sentimentos. A Análise do Discurso visa a compreensão de como um objeto simbólico produz sentidos, como ele está investido de significância para e por sujeitos, essa compreensão, por sua vez, implica em explicitar como texto organiza os gestos de interpretação que relacionam sujeito e sentido. Produzem-se assim novas formas de leitura. (ORLANDI, 2007). A solidão e os invernos rigorosos de Dululuth fizeram de Dylan uma pessoa reflexiva e solitária levando uma vida longe dos holofotes. Dylan funciona como um prisma onde a luz da inspiração poética o perpassa e se expande em vários temas de extensa beleza. Não ficando preso aos esquemas da indústria fonográfica e fazendo de suas apresentações ao vivo sempre uma novidade, Dylan cria seu próprio estilo e produz uma forte influencia na cultura pop provocando um Boom criativo. A influência de Dylan não se revela só ao plano musical teatro, cinema, pintura, literatura em todos os setores artísticos é marcante de uma forma ou de outra a presença de Dylan. Quando se afirma como artista, Dylan também se afirma como pessoa comum, quebrando com as regras do que seja um artista, tornando-se totalmente coerente

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consigo mesmo, não se transformando em uma maquete nas mãos do público. Dylan não tenta agradar e a sua obra é o que ela diz e o corpus de sua obra é intenso e heterogêneo, transitando entre os discursos político, profético, cristão, amoroso, deixando evidente que o seu discurso é coerente com o que está sentindo no momento. Na transitoriedade do tempo a figura de Dylan configura indefinida como a própria vida, então o seu discurso não fica circunscrito a uma época: quando o queriam Folk, ele foi elétrico; quando o queriam Beat, ele foi cristão. No refrão de Like A Rolling Stone (1966) Dylan diz: “sem direção de casa.” Como se a transitoriedade de seu discurso fosse uma busca por um lar. Nessa partida do lar, como na obra On The Road de Jack Kerouack (2004) é uma busca por si mesmo, e essa busca produz vários conflitos e discursos. Dylan, como artista, quebra várias regras comportamentais, diminuindo completamente a distância entre o artista e a pessoa comum. No livro de Howard Sounes, Bob Dylan: A biografia (2002, p.14), é revelado o desconforto do artista com os aparatos da fama. Mas não se confunde simplicidade com a perda da privacidade. Dylan é uma pessoa reclusa e solitária. Mantendo sempre um distanciamento entre o publico e o privado, ele segue o lema da constituição americana que diz: toda pessoa tem o direito de ser deixada em paz. A obra de Leonor Archuf, o espaço biográfico tem como tema a questão biográfica trançando o limiar entre o público e o privado, entre o social e o nós desvelando a difícil linha tênue entre o ser e o ser social. A afirmação do sujeito moderno, o surgimento do espaço biográfico o foi também, como assinalamos, para traçar o limiar incerto entre o publico e o privado e, consequentemente, a nascente articulação entre o individual e o social (ARFUCH,2010, p14).

Robert Allen Zimmerman nasce em Dululuth no dia 24 de maio de 1941. Neto de imigrantes judeus do leste europeu, que vieram para os Estados Unidos devido a perseguição czarista ocorrida em 1905. Com o enfraquecimento do seu poder, o czar Nicholas II atribui aos judeus todos os problemas que envolviam o império russo levando a população a uma histeria anti-semita, que leva à morte milhares de judeus. Os avós de Dylan se estabelecem na cidade de Dululuth, no estado de Minnessota situada a 240 quilômetros ao norte das Cidades Gêmeas de Minneapolis e St. Paul. A escolha de Dululuth por seu avô, Zigman Zimmerman, não

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foi aleatória, pois, era muito parecida com a sua cidade natal, a portuária Odessa, no mar negro. Dululuth tinha como sua principal fonte econômica o minério de ferro do Cinturão de Ferro, que formava uma cadeia com outras cidades mineradoras que ficavam a noroeste. A pesca era também uma atividade econômica, entretanto, menos importante que o minério de ferro. O inverno em Dululuth era intenso e longo e o verão curto (SOUNES, 2002). Zigman Zimmerman, após se estabelecer como mascate, manda buscar a esposa, Anna Zimmerman. Ela traz os três filhos, Marion, Maurice e Paul. Outros três filhos Jack, Abram (apelidado de Abe) e Max nascem após o casal estar juntos nos Estados Unidos. Abe Zimmerman, pai de Dylan, nasceu em 1911. Ele engraxava sapatos e vendia jornais aos 7 anos

para ajudar a família. Abe era

músico, tocava violino e juntamente com seus irmãos formavam uma pequena banda que se apresentava na escola. Ao terminar o ensino médio em 1929, ano em que o mercado de ações de Wall Street quebra, torna-se funcionário da Standart Oil (SOUNES, 2002). A mãe de Bob Dylan, Beatrice Stone, era de renomada família judaica da cidade de Hibbing, no cinturão de ferro. Benjamin e Lybba Edelstein, avós maternos de Bob Dylan, eram judeus da Lituânia que chegaram aos Estados Unidos em 1902 e foram morar na cidade de Hibbing dois anos depois. B.H, como era conhecido seu avô, gerenciava uma rede de cinemas. Florence, a filha mais velha nascida na Lituânia, casa-se com Bem Stone, também lituano, e montam uma loja de roupas em Hibbing, tendo como clientes as famílias dos trabalhadores da mineração, que eram em sua grande maioria imigrantes. Beatrice Stone nasce em 1915, sendo a segunda de quatro irmãos. A família de Beatrice como a dos Zimmerman era musical e ela tocava piano (SOUNES, 2002). Hibbing tendo uma população de 10 mil habitantes era a maior cidade do Cinturão de Ferro. A comunidade judaica era bem pequena, com poucos judeus jovens. Sendo um dos motivos para a visita aos parentes em Dululuth. Em 10 de junho de 1934, Abe com 22 anos e Beatty com 19 se casam e vão morar na casa da mãe de Abe em Dululuth. Os Estados Unidos ainda se encontrava mergulhado na Grande Depressão. Trabalhadores do Meio-Oeste migram para o estado da Califórnia. Crimes de gângsteres era manchete frequente nos periódicos. Eram tempos difíceis e somente após a Segunda Guerra Mundial e o decreto do presidente Franklin Roosevelt é que os Estados Unidos conseguem se livrar da

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grande Depressão. Com a economia americana restabelecida, em 1941 o casal Zimmerman em uma situação mais estável, com Abe chegando ao posto de gerente na Standart Oil compram seu próprio apartamento. Quando Beatty se encontrava grávida de Bob Dylan o casal se muda para uma casa que ficava sobre uma colina em Dululuth, na noite 24 de maio a criança a criança nasce no St. Mary´s Hospital. Ao ser registrada quatro dias depois a criança recebe dois nomes, em hebraico foi chamado de Shabtai Zisel ben de Avrahan e na língua americana Robert Allen Zimmerman (SOUNES, 2002). Um ano após a Segunda Guerra Mundial, em 1946, Bob ingressa nos estudos na Nettleton School. No mesmo ano nasceu seu irmão David Benjamin. Este ano também é marcado pela primeira vez em que cantou as canções “Some Sunday Morning” e “ accentuate the positive” em uma comemoração em família do Dias da Mães, aos 4 anos de idade. Seu pai adoece devido a uma epidemia de poliomielite fazendo-o perder o emprego e deixando com sequelas pelo resto da vida. Com dinheiro escasso e com o pai desempregado os Zimmerman mudam para Hibbing, onde a família de Beatty e os irmãos de Abe tinha comércio (SOUNES, 2002). Em 1952 a televisão chega ao lar dos Zimmerman e programas musicais e de variedades, comédias e seriados de western são os novos divertimentos de Bob. Nesta mesma época começa a tocar piano ensinado por sua prima Harriet Rutstein. Antes de chegar ao violão Bob tentou tocar sax e trompete. Mas são as rádios que tem uma função fundamental na vida de Bob, pois, através delas que ele tem contato com a música de Jonhnny Ray, Muddy Waters, John Lee Hooker, Jimmy Reed, Howflin`Wolf, Hank Williams, este sendo para Bob o melhor compositor americano, e as tirava no violão. A preferência musical de Bob estava relacionada a artistas que escreviam e diziam coisas sérias como Johnny Ray e Hank Williams (SOUNES, 2002). Bill Haley atinge o sucesso com Shake Ratle and Roll e Rock Around The Clock em 1955, esta impulsionada pelo filme Blackboard Jungle. Bob forma sua primeira banda The Golden Chords, inspirado pelo seu novo ídolo Little Richard e participa de outras bandas Shadows Blasters, Elston Gunn e Rock Boppers. Toca no Festival de Talentos Estudantis de Hibbing School e não obtêm sucesso. Os astros do cinema Marlon Brando e James Dean são uma grande influência para Bob, principalmente Dean, imitando-o no jeito de falar e vestir. Em 1959 o sonho de Bob é

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fazer parte da banda de Little Richard e muda seu nome para Bob Dylan. Entra para banda The Satin Tones, toca pela primeira vez em um programa de tevê, em um baile em Hibbing e numa fita de radio (SOUNES, 2002).

O que eu ia fazer tão logo saísse de casa era me chamar de Robert Allen. Quanto a mim, eu era esse – era o nome que meus pais haviam me dado. Soava como o nome de um rei escocês, e eu gostava. Pouca coisa de minha identidade não estava nele. O que mais tarde me deixou meio confuso foi ver um artigo na revista Downbeat com a história de um saxofonista da Costa Oeste chamado David Allyn. Suspeitei que o músico tivesse trocado a grafia de Allen para Allyn. E eu podia ver por quê. Parecia mais exótico, mais inescrutável. Eu também ia fazer isso. Em vez de Robert Allen, seria Robert Allyn. Então, um tempo depois, inesperadamente, vi uns poemas de Dylan Thomas. Dylan e Allyn soavam de modo semelhante. Robert Dylan. Robert Allyn. Não conseguia decidir – a letra D vinha com mais força. Mas Robert Dylan não parecia ou soava tão bem quanto Robert Allyn. As pessoas sempre haviam me chamado ou de Robert ou de Bobby, mas Bobby Dylan soava muito boboca para mim e, além disso, já havia um Bobby Darin, um Bobby Vee, um Bobby Rydell, um Bobby Neely e um monte de outros Bobbys. Bob Dylan pareceu e soou melhor do que Bob Allyn. Na primeira vez em que me perguntaram meu nome nas Cidades Gêmeas, respondi instintiva, automática e simplesmente, sem pensar: “Bob Dylan” (DYLAN, 2005, p. 90-91)

Na festa de formatura em sua casa um dos seus tios deixa-lhe uma caixa com discos de 78 rotações de Huddie Ledbetter, conhecido como Leadbelly, cantor negro de folk e blues, que foi preso por homicídio e foi descoberto pelos musicólogos Alan e John Lomax. Leadbelly foi libertado em 1934. Uma de suas grandes canções era “Rock Island Line”. Diferente do Rock and Roll a música folk era forte e tinha algo a dizer. Dylan passa a estudar o significado e o processo de produção das canções folk (SOUNES, 2002). Dylan vai para fargo, do outo lado da fronteira com Dakota do Norte, Toca na banda The Shadows de Bobby Vee fazendo bailes, mas sai antes da banda fazer sucesso com a canção Suzie Baby. É matriculado pelos pais em uma escola particular em Devon na Pensilvânia que trata de jovens problemáticos. No verão de 1959 Dylan entra para a faculdade de Minnesota, nas Cidades Gêmeas. No campus da faculdade os jovens liam a literatura beatnik, discutiam sobre a esquerda radical e ouviam a música folk. Dylan descobre a autobiografia Bound of Glory, do cantor folk Woody Guthrie (SOUNES, 2002).

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A polifonia é aquela multiplicidade de vozes e consciências independentes e imiscíveis. Cujas vozes não são meros objetos do discurso do autor, mas os próprios sujeitos desse discurso, do qual participam mantendo cada uma sua individualidade caracterológica, sua imiscibilidade (BEZERRA, 2007). Em 1961 Dylan chega em Nova York em busca de seu ídolo Woody Guthrie que esta internado no hospital psquiátrico de Greystone Park devido a uma doença degenerativa chamada Mal de Hutington. Dylan começa a tocar no bairro boêmio Greenwich Village e se apresenta em bares e nos cafés Commons, Wha?, antes de tocar no Gerde´s Folk City. Abre shows de John Lee Hook e escreve a canção Talking New York, onde retrata seus primeiros dias na cidade. Carolyn Hester grava na Columbia e Dylan participa de três faixas e é contratado por cinco anos. (SOUNES, 2002). Em outubro é gravado o primeiro álbum de Dylan com a maioria das canções sendo covers de outros artistas, no álbum apenas duas composições de sua autoria. Em março de 1962 Dylan participa do álbum Midnigth Special de Harry Belafonte ganhando notoriedade. É também lançado seu primeiro álbum e nesse mesmo mês Dylan grava o seu segundo disco The Freewheelin´, lançado em maio de 1963 (SOUNES, 2002).

A análise do discurso não trabalha com a língua enquanto um sistema abstrato, mas com a língua no mundo, com maneiras de sentidos enquanto parte de suas vidas, seja enquanto sujeitos, seja enquanto membros de uma determinada sociedade (Orlandi, 2006, p. 15).

Sendo um artista moderno as vezes soa como algo que nunca foi ouvido, mas em sua obra sempre perpassa o fio condutor de onde esta suas raízes. (ALCANTARA, 2008, p 30).

Há pessoas na estação/ Esperando pelos trens/ Posso ouvir o bater de seus corações/ Como pêndulos balançando das correntes/ Quando pensas que tem perdido algo/ Descobrirás que sempre pode perder um pouco mais (DYLAN, 1997).

Após o lançamento do álbum The Freewheelin´, Dylan lançou discos de poderosa beleza poética como The Times They Are A-Changin’ (1964), Another Side of Bob Dylan (1964), Bringing It All Back Home (1965) e Highway 61 Revisited

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(1965). Durante este período inicial, vários fatos marcam a trajetória de Dylan. O artista vai para Londres em 1962, convidado pelo diretor da BBC, Philip Saville,de onde volta somente em 1963. Em agosto do mesmo ano, Dylan faz uma apresentação no Newport folk Festival ao lado de cantores como Pete Seeger e Joan Baez. Dylan acompanha Joan Baez na marcha pelos direitos civis, em Washington DC, onde Martin Luther King fez seu famoso discurso “I had a dream...”. Neste evento, Dylan canta Blowin in the Wind, o que lhe dá (a contragosto) o título de “a voz de uma geração”, e transforma sua música em hino dos movimentos de protesto. Outras canções, como A Hard Rain’s A-Gonna Fall e Masters Of War também tornaram-se clássicas como músicas de "protesto", por abordarem temas sociais e políticos numa linguagem poética (SOUNES,2002). No ano seguinte, mais precisamente em fevereiro de 64, Dylan faz mais uma viagem no estilo Jack Kerouac, com seus amigos Victor Maimudes, Pete Karman e Paul Clayton, passando por Dallas, San Francisco e Los Angeles. Esta viagem marca um período de mudanças em Dylan, tanto pessoais quanto musicais. De volta à Nova York, Dylan e Suze Rotolo se separam, e as músicas mudam aos poucos do estilo de protesto folk para um outro mais pessoal e voltado para o rock. Ainda em 1964, Dylan e Baez passam a ser considerados rei e rainha do movimento folk, e cantam juntos no Newport Folk Festival em julho. Mas, entre os anos de 6465, Dylan começa a afastar-se gradativamente da proposta folk seguida até então. Ele conhece os Beatles, apresenta a maconha ao grupo, e o próprio John Lennon admite ter sido influenciado por ele nas composições de A Hard Day’s Night e You’ve Gotto Hide Your Love Away. No ano seguinte, depois de lançar Bringing It All Back Home, Dylan faz sua primeira turnê no Reino Unido, e toca novamente no Newport Folk Festival. O álbum, que contém várias faixas com guitarra elétrica e uma banda de blues-rock como acompanhamento, chocou os fãs ligados ao movimento folk, que chamaram Dylan de “traidor”. Por outro lado, essa mudança no estilo ampliou o público de Dylan e chamou a atenção da crítica, transformando este disco em um dos mais apreciados de sua carreira. Também em 1965, Dylan grava o disco Highway 61 Revisited, que contém a música Like a Rolling Stone, considerada pela revista Rolling Stone a primeira das 500 melhores canções de todos os tempos. Em 1966, ele grava Blonde on Blonde, e pouco tempo depois sofre um acidente de moto, que o afasta dos palcos temporariamente. Dylan retorna com o álbum John Wesley Harding (1967), impressionando os críticos pelo formato country das

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canções. O disco seguinte, Nashville Skyline (1969), também segue a tendência country e faz sucesso com a música Lay Lady Lay. Nos anos 70, Dylan sai um pouco de cena. As produções do artista dessa época não agradam os críticos e sua carreira passa por uma fase turbulenta (SOUNES, 2002). Em 1974 ele volta a fazer turnês, acompanhado pelo grupo The Band. Dylan retoma sua carreira e produz Blood On The Tracks (1975) e Desire (1976), considerados pelos críticos seus melhores discos nos anos 70. O disco Desire tem a canção Hurricane, que fez grande sucesso, baseada na história de Rubin Carter, boxeador negro preso injustamente (SOUNES, 2002) Em 1977, Dylan separa-se de sua esposa Sara Lownes, depois de 12 anos de casamento. Com isso, vive uma crise pessoal que interfere em seu trabalho artístico. Volta-se para a música gospel, fazendo deste período o mais controverso de sua carreira. Somente em 1983 Dylan iria “reencontrar” seu estilo com o disco Infidels. O músico continua a gravar com certa regularidade, mas não faz muito sucesso nessa década, a não ser pelo álbum Oh Mercy (1989), lançado depois de uma turnê com a banda californiana Grateful Dead (SOUNES, 2002) Em comemoração aos 30 anos de carreira de Dylan, é realizado em 1992 um show tributo ao cantor na Madison Square Garden, em Nova York, com participações de artistas do rock, country e soul, como Eric Clapton, Stevie Wonder, Neil Young, Lou Reed, Eddie Vedder, Johnny Cash, entre outros (SOUNES, 2002) Em 1994, Dylan grava um acústico para a MTV; em 1997, lança o discoTime Out Of Mind, muito bem recebido pela crítica e aclamado como uma“ressurreição artística”. Em 2001 lança Love and Theft. No álbum Modern Times de 2006, Dylan conseguiu, pela quarta vez em sua carreira, conquistar o ranking de mais vendido dos Estados Unidos. Em 2009 Dylan lança dois álbuns Together Throug Life e Christmas in the Heart. E em 2012 lança Tempest disco muito discutido pelos temas que aborda. Dylan adentra os anos 2000 com todos os álbuns lançados fazendo sucesso. Em relação à filmografia sobre Dylan, quatro filmes são os principais: Don’t Look Back (1965), dirigido por D. A. Pennebaker, é um documentário sobre o auge da carreira de Dylan em 1966, e retrata a turnê britânica; Renaldo and Clara (1977), dirigido pelo próprio Dylan e co-dirigido por Howard Alk, é um road movie sobre o show Rolling Thunder, que cruzou várias cidades americanas (SOUNES, 2002). Diferentes temas, personagens e visões são ilustrados com as músicas de Dylan, e

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há tanto partes improvisadas em forma de narrativa livre, quanto técnicas de documentário, entrevistas coletivas, bate-papo na rua e apresentações. No Direction Home (2005), dirigido por Martin Scorsese, espelha o período de 1961 a 1966, exibindo desde a chegada de Dylan em Nova York até tempos antes do acidente de moto em 1966. O documentário conta com várias entrevistas com personalidades como Joan Baez, Allen Ginsberg, Suze Rotolo, Dave Van Ronk, etc., além de comentários do próprio Dylan, imagens de apresentações, fotos, vídeos raros, e muito mais. O que chama a atenção no documentário é a visível reprovação de Dylan quanto ao vínculo de sua imagem como “ícone dos movimentos de protesto”( SOUNES, 2002). No Festival de Veneza, leva o título de I’m Not There, dirigido por Todd Haynes e inspirado na vida e música de Bob Dylan. O filme é uma cinebiografia autorizada por Dylan mesmo sem ele ter visto. Elogiado pela ousadia e belas cenas, a obra tem narração não-linear e mostra momentos da vida de Dylan que influenciaram suas composições, desde a infância até os anos 60. Dylan escreveu uma autobiografia em 2005, Chronicles–Volume One (Crônicas–Volume Um), que apesar da narrativa não-linear e fragmentada, descreve com tom sincero e claro lembranças de sua infância, passando por sua chegada em Nova York em 1961, até momentos de instabilidade artística. Apesar de parecer complexo e multifacetado, e de levar jornalistas quase à loucura em suas entrevistas com respostas imprevisíveis e sarcásticas, Bob Dylan teve e tem até hoje a mesma maneira exclusiva de enxergar as coisas. Desinteressado de assuntos políticos e manifestações populares, Dylan chegou a trocar de endereço várias vezes para poder ficar junto de sua família em paz, e mais perto de sua música, arte essa que ele inovou tantas vezes, durante toda sua carreira, sem se preocupar com a crítica ou até mesmo com a opinião dos próprios fãs.

2.2 A MÚSICA FOLK A música Folk e os elementos das canções populares americana vão acompanhar Dylan por toda a sua obra. Tendo Woddy Guthrie como seu maior ídolo, Dylan incorpora a linguagem e a versatilidade dos antigos cantores Folk. Em seus shows as canções sempre ganham nova roupagem e às letras das músicas são inseridas novos versos. A tradição Folk relata nas canções acontecimentos

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marcantes como assassinatos, injustiças sociais, racismo, amores frustrados, fazendo uma crônica do seu tempo. O contato de Dylan com a música Folk ocorre através dos discos de Leadbelly e Woody Guthrie (SOUNES, 2002).

O que eu tocava na época (fim dos anos 50) eram a canções de folk com letras atrevidas, e você não precisa de pesquisas de opinião para saber que elas não combinavam com nada das rádios. Falando em termos práticos, a cultura dos anos 50 era como um juiz em seus últimos dias de magistratura. Estava prestes a desaparecer. Em um período de dez anos, tinha lutado para se erquer e então se esborracharia no chão. Com canções de folk incrustadas na minha mente como uma religião, isso não importava. As canções folk transcendiam a cultura imediata (DYLAN, 2005, p.49).

Hudie Leadbetter nasceu em 15 de janeiro de 1888 na Plantação Jeter, perto de Mooringsport, Louisiana e começou a se interessar por música aos 5 anos de idade quando ganhou um acordeão do seu tio. Quando jovem, Leadbetter era forte e podia carregar grande quantidade de algodão, o que lhe daria uma condição vantajosa anos depois, quando esteve preso. Ele descobriu o violão em 1903 e, com sua dança e voz logo estava tocando em festinhas na sua localidade. Um ano depois já lotava os bailes do Baixo St. Paul, uma famosa área de Shreveport, em Louisiana (SOUNES, 2002). Leadbetter tinha acesso a uma variedade de músicas na Rua Fannin, onde havia diversos bares, bordéis e salas de dança. Até 1908 ele andou por Louisiana escutando Jelly Roll Morton em New Orleans, antes de chegar em Dallas, Texas, quando pegou uma doença grave e precisou voltar para a casa dos pais em Louisiana. Dois anos depois, estava de volta a Dallas, desta vez com um violão de 12 cordas. Adotou o nome artístico de Leadbelly e começou a tocar com Blind Lemon Jefferson, que viria a ser o bluesman mais bem sucedido da época. Esta parceria que durou cerca de cinco anos expôs Leadbelly a uma infinidade de blues que ele viria a incorporar a seu repertório. Com sua guitarra de 12 cordas que combinava com sua voz clara e alta ele conseguia se fazer ouvir apesar do barulho das casas noturnas (SOUNES, 2002). O cantor começou a ter sérios problemas com a lei a partir de 1915. No ano seguinte já era procurado e, durante um tempo, usou o nome de Walter Boyd Ledbelly. Em dezembro de 1917, quando fugia de uma perseguição da polícia, matou Will Stratford. Ele foi rapidamente preso, julgado e condenado A cumprir pena no Presídio Estadual Shaw, em Hunstville, Texas, onde passou a maior parte dos

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sete anos seguintes e se tornou uma lenda pela sua força de trabalho e pela voz poderosa. Em janeiro de 1924 teve a oportunidade de cantar uma balada para o governador Pat Neff, na qual pedia perdão, que lhe foi concedido um ano depois. Quando foi libertado, escutou os discos da cantora Bessie Smith, do amigo Blind Lemon Jefferson e de Big Bill Broonzy e logo incorporou as músicas ao seu repertório e disse que eram dele. De 1925 a 1930 Leadbelly viveu em Shreveport e Houston, mas, ao contrário de Blind Lemon, da Memphis Jug Band e de Jim Jackson que haviam gravado sucessos, Leadbelly não fez gravações comerciais (SOUNES, 2002). Leadbelly voltou a ser preso em 1930, por tentativa de homicídio e foi mandado pra a penitenciária estadual de Luisianna, a famosa Angola Prison, onde tocava seu violão aos domingos e nas horas de folga e ganhava popularidade entre os presos e os guardas. Quando o pesquisador de folclore John Lomax e seu filho Adam passaram lá, procurando “músicas negras de trabalho” para a Biblioteca do Congresso foram apresentados a Leadbelly, que os impressionou com seus talentos. Um ano depois os Lomax voltaram para gravar novamente com ele, alguns meses antes de receber a liberdade condicional. Leadbelly passou a acompanhar os Lomax em suas visitas a outras prisões do Sul, ajudando com os equipamentos e mostrando aos presos que tipo de música os pesquisadores buscavam e logo virou sensação nos concertos em sociedades linguísticas, clubes e faculdades. Fez suas primeiras gravações comerciais em 1935 para o selo ARC, em Nova Iorque e tornouse um símbolo do movimento folk que emergia no final dos anos 30 e durante a próxima década. Leadbelly morreu no dia 6 de dezembro de 1949 e foi enterrado no cemitério da Igreja Batista de Shiloh (SOUNES,2002). A maior influencia que Dylan teve em sua carreira foi a do cantor folk Woddy Guthrie. Dylan ficou tão fascinado pela obra de Guthrie que partiu para encontrá-lo em um hospital já totalmente debilitado de saúde. Dylan carregará a influência de Guthrie por toda a sua vida. Dylan como Guthrie é um cronista de seu tempo( SOUNES, 2002). Woody Guthrie foi um cantor e compositor americano de Folk Music. Seu legado musical é composto por centenas de músicas, baladas e obras improvisadas que abrangem desde temas políticos, músicas tradicionais até canções infantis. Guthrie tocava frequentemente com sua guitarra que possui o slogan "This machine kills fascists" ("Esta máquina mata fascistas"). É talvez mais bem conhecido por sua canção "This Land Is Your Land", regularmente cantada nas escolas americanas.

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Muitas de suas músicas gravadas estão arquivadas na Biblioteca do Congresso, nos Estados Unidos. Guthrie viajou com trabalhadores migrantes de Oklahoma para a Califórnia e aprendeu canções de folk e blues tradicionais. Suas canções contam suas experiências na Dust Bowl durante a Grande Depressão, fazendo com que ele ganhasse o apelido de "O trovador Dust Bowl." Guthrie foi associado a grupos comunistas nos Estados Unidos, mas nunca tornou-se membro do comunismo (SOUNES,2002). Foi casado três vezes e teve oito filhos, incluindo o músico de folk Arlo Guthrie. É avô da cantora Sarah Lee Guthrie. Guthrie morreu de uma complicação neurológica degenerativa conhecida como Doença de Huntington. Apesar de sua doença, durante seus últimos anos Guthrie serviu como uma figura a ser seguida na música folclórica, proporcionando inspiração para uma nova geração de músicos folk, incluindo as relações com o mentor Ramblin 'Jack Elliott e, em menor grau, com Bob Dylan. Woody Guthrie é tambem autor de livros. “Bound of Glory” e “Seeds of Man” são as suas histórias no meio das histórias dos outros. Em ambos os casos, cumprem a mesma função que as suas (e de todos) canções, sobretudo temas como “This is Your Land”, “Pastures of Plenty” ou “Deportee”: construir o testemunho artístico de uma consciência americana que habitualmente escapa às narrativas mais mediáticas que nos chegam sobre os EUA. Guthrie era um cantor de protesto e sua marca registrada era denunciar as mazelas que o cercava, como exposto em Sounes (2002, p. 78) Nas praças da cidade, Na sombra de um campanário; No intervalo do escritório, eu vi o meu povo. Tinham fome, e eu estava lá perguntando, Esta terra é feita para você e para mim? Quando andava, eu vi uma placa, E na placa, Dizia "não invadir". Mas no outro lado, ela não dizia nada! Esse lado foi feito pra você e para mim

A música folk e Guthrie surgem para Dylan como algo sério, o que Rock and Roll não expressava. Dylan incorpora a musica Folk como propulsora de seu

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discurso. Diferente do rock and roll, a música Folk não soava como modismo e não estava engolfada no pagamento de propina para ser executada nas rádios. Era uma música ouvida pelos jovens universitários e por pessoas engajadas na luta pelos Direitos Civis.

2.3 O MOVIMENTO BEATNIK

Para termos uma compreensão do discurso de Dylan faz-se mister revelar as influências para a criação de seu discurso. Dylan como observador do seu tempo, recebe, digere e transforma o que lhe é passado. A influência beat em sua obra é marcante, como os beats Dylan cria o seu discurso com elementos antigos, mas sempre os pondo sob uma abordagem transcendente. A geração Beat está circunscrita ao movimento da contracultura. Os movimentos contraculturais sempre surgem quando as expressões artísticas estão estagnadas e inibidas pelas regras do

establishment.

A

contracultura

está

relacionada

à

transgressão,

uma

contracultura seria uma subcultura que se define em oposição à cultura dominante, numa postura transgressora. Contracultura é uma cultura marginal, uma anticultura.

A contracultura é “ruptura” por definição, mas também é uma espécie de tradição. É a tradição de romper com a tradição, ou de atravessar as tradições do presente de modo a abrir uma janela para aquela dimensão mais profunda da possibilidade humana que é a fonte perene do verdadeiramente novo – e verdadeiramente grandioso - na expressão e no esforço humano. Dessa forma, a contracultura pode ser uma tradição que ataca e dá início a quase todas as outras tradições (JOY, 2004, p. 13).

O discurso de Dylan é influenciado por várias vozes, pois os discursos não podem nascer de si mesmos. O discurso tem sua origem na relação entre os vários campos do conhecimento e dos espaços sociais, criando estados ideológicos. A cultura libertária beatnik surgida nos anos 1950 tem sua origem influenciada pelo poeta americano Walt Whitman, em seu livro, Folhas da Relva (2009) e nas improvisações jazzísticas de Charlie Park. Não há uma originalidade nata e sim uma polifonia, a captação de várias vozes e sua transformação em discurso próprio. A situação econômica e social dos Estados Unidos da América nos 1950 leva a juventude a renunciar uma vida de conformismo e consumismo que era oferecida

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por uma sociedade com ideias pré-estabelecidas. O marcathismo atacava a todos que eram vistos como comunistas ou socialistas. O surgimento do discurso é indissociável do campo social. Vários fatores convergem para o discurso. Os beats têm o seu estado ideológico gerado em confronto como uma sociedade estagnada e apática: Os beats se destacaram da sociedade hiperconformista americana dos anos 1950 por intermédio de um dialeto distintivo, de estilos de vestir atípicos e de uma recusa a participar do joguinho econômico mesmo com o risco da pobreza (JOY, 2004, p. 57).

A arte e a poesia estavam sufocada pelos valores de consumo. Os beats surgem como contracultura, como um movimento de vanguarda, transgressivo, em busca de uma dilatação estética e quebra das ideias convencionais sobre o mundo. Uma maneira de viver a vida diferente da coisificação do ser humano. Os beats propunham uma vida mais intensa, amável, verdadeira. Dylan absorve o menosprezo pela politica na literatura beat. Jovens que cresceram entre a Grande Depressão e a Segunda Guerra Mundial, os hipsters não se interessam pela mudança radical do mundo, mas, viver a vida com toda a intensidade. Os beats tem seus principais expoentes na “trindade” são Jack Kerouac (On the Road – Pé na estrada, 1957), Allen Ginsberg (Howl – Uivo,1956) e William Burroughs (Naked Lunch – Almoço Nu, 1959). A partir dos anos 50, a escrita ganhou som, fúria e movimento nas mãos ligeiras de jovens escritores que decidiram encarar o conservadorismo moral vigente nos EUA e instaurar uma nova maneira de enfrentar o mundo. Essa geração, que passaria a ser reconhecida como “beat”, protagonizou uma reformulação em termos de comportamento, desenvolveu a expansão da consciência por meio de experiências alucinógenas e ganhou a admiração de jovens insatisfeitos da classe média (MASINI, 2006). Lawrence Ferlinghetti, dono da livraria City Lights, em San Francisco, que fazia publicações independentes é tambem um dos grandes nomes do movimento beat. Sem seguir um padrão estético a literatura beat era algo vertiginoso e selvagem. Totalmente musical. Era uma literatura para ser lida em voz alta. Segundo Kerouack as palavras repetiam a sonoridade do jazz. Tendo sua grande influencia

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nos jazzistas negros Charlie Parker e Dexter Gordon. Dylan convive com os beats e traz elementos em sua obra principalmente na fase de transição da musica folk para elétrica, “para se inventar, Dylan fundiu poesia e música como os beats tinham tentado antes dele, mas jamais conseguiram” (DYLAN, 2005).

2.4 O MOVIMENTO PELOS DIREITOS CIVIS Na metade dos anos 1950, nasciam nos Estados Unidos movimentos pelos direitos civis dos negros, por causa da segregação racial. Em 1955, o líder negro Martin Luther King iniciou uma série de movimentos de combate ao racismo. Principalmente nos Estados Unidos, todas as manifestações da cultura jovem foram acompanhadas de perto pelo movimento denominado Black Power ou poder negro. O racismo da classe dominante branca excluía o negro do american way of life, os jovens rebeldes de classe média passaram a apoiar a luta dos negros contra a discriminação e a segregação sociorracial. Para esse jovem branco, o negro se tornou um símbolo de rebeldia diante do sistema. A cultura jovem dos anos 60 foi sensível a todas as movimentações de grupos étnicos ou culturais que ocupavam posições marginais nas sociedades ocidentais. O marco inicial deste movimento se deu no sul eminentemente racista do país, na cidade de Montgomery, estado do Alabama, em 1 de Dezembro 1955, quando a costureira negra Rosa Parks (“A Mãe dos Direitos Civis”) entrou num ônibus de volta para casa após um dia de trabalho e, estafada, sentou-se nos bancos da frente do ônibus, local proibido aos negros pelas leis segregacionistas do estado. Intimada a dar seu lugar a um passageiro branco e sentar no fundo do veículo, recusou-se, depois de uma vida inteira de submissão, e foi presa, julgada e condenada. Seu ato e sua prisão deflagraram uma onda de manifestações de apoio e revolta, além do boicote da população aos transportes urbanos, dando início, de forma prática, à luta da sociedade negra por igualdade com a sociedade branca perante as leis americanas. Convocado pela liderança negra da cidade e com o apoio de diversos brancos, o boicote aos transportes públicos durou 386 dias, quase levando à falência o sistema urbano de transportes (a maioria dos passageiros era de negros pobres) e acabando somente quando a legislação que separava brancos e negros nos ônibus de Montgomery foi extinta. Foi através dessa atitude que o

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então jovem pastor negro Martin Luther King Jr., concordando com a atitude de Rosa Parks, incentivava em seus sermões os negros fiéis a fazerem o mesmo.

3. CAPITULO 2 - THE FREEWHELLIN Em maio de 1963 Dylan lança o seu segundo album The Freewhellin´Bob Dylan, produzido por Pete Yarrow, sendo a grande maioria das canções composições próprias. O álbum inicia-se com Blowin´in the Wind, canção que vai colocar Dylan entre os maiores compositores da música americana, é uma canção que sobreviverá por muitas gerações. Girl From The North Country, canção carregada de lirismo, uma das marcas de Dylan. Down The Highway trata das temáticas do blues. Master of War essa canção começou a ser chamada cançãoprotesto. A Hard Rain´s a-gonna Fall, traz a mesma temática da canção anterior, mais trabalhada. Don´t Think Twice, It´s All Right, uma conversação consigo mesmo. Bob Dylan´s Dream requiem triste sobre as amizades que desaparecem com o tempo. Oxford Town, tema feito para banjo que Dylan executa com guitarra. Honey, Just Allow Me One More Change, blues falado um dos estilos que Dylan desenvolve. Talkin´ World War III, a história de um psiquiatra que sonha sobre a Terceira Guerra Mundial. Corrina, Corrina canção cover que Dylan modificou varias vezes (SOUNES, 2002). The Freewhellin´é um marco na cultura na pop. Além de apresentar Dylan como poeta de renome, o álbum traz temas marcantes que vai ser ressignificado por gerações futuras. O disco coloca Dylan entre os maiores artistas contemporâneos, e traz uma ruptura com os discos folk do passado, pois Dylan insere o texto poético no âmbito das canções folk. Uma das marcas registradas de Dylan é o seu poder de dar uma nova roupagem para temas antigos. Três canções no álbum merecem grande destaque devido a sua construção poética e processo histórico no qual estão inseridas: Masters Of War, A Hard Rain´s A-gonna Fall e Blowin´in The Wind.

3.1 MASTERS OF WAR

A partir dessa canção as canções que tratam de guerra, fome, miséria, injustiça social passaram a ser chamadas de canções de protesto (FROES, 1997). A

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voz política do artista intervindo na realidade da nação. Dylan inaugura um novo campo para as canções, usando temas sérios de forma poética, introduzindo a poesia na musica pop. O que o difere de outros artistas é justamente como se produz o seu discurso poético, a sua maneira de dizer as coisas que todos dizem, levando a linguagem das canções para outro patamar, mais profundo e lírico. Sob o pesadelo dos mísseis postos na Ilha dos Porcos, em Cuba, pelo governo da antiga URSS, o compositor relata a impotência das pessoas em relação aos senhores da guerra. Ele é um sujeito de discurso, compreende seu tempo e o processo histórico em que está inserido, a sua voz ressoa como denúncia. É como um sino que convida a todos a comparecerem para ouvirem e se alertarem da realidade vigente, conforme explicita Orlandi (2001, p. 43):

A noção de formação discursiva, ainda que polêmica, é básica Análise do Discurso, pois permite compreender o processo produção dos sentidos, a sua relação com a ideologia e também ao analista a possibilidade de estabelecer regularidades funcionamento do discurso.

na de dá no

Masters of War traz em seu corpo toda a tragédia que as guerras produzem em nome da paz. Inspirada na corrida armamentista da Guerra Fria, ela viria a ser muito significativa durante a iminente Guerra do Vietnã, e ainda soava verdadeira quase três décadas depois, durante a Guerra do Golfo, em 1991(SOUNES, 2002). Em seus versos, Dylan é claro e sarcástico ao descrever os senhores da guerra, os senhores sem rostos. Ele os desmascara, os denuncia, indo além do que o establishment propaga. Revela o mundo perigoso e medíocre que a sua raça e classe social criaram. Um mundo terrível, sanguinolento. Um mundo onde não se devem pôr crianças. O discurso surge do que se está acontecendo ao redor. Dylan não viveu os horrores da guerra no campo de batalha, como muitos de sua geração, mas ele captou o sentimento, a dor, o medo e expôs acima das mentiras que causam todas as guerras, sendo sensível como uma ferida aberta, onde qualquer toque é sentido: Etimologicamente a palavra discurso contém em si a idéia de percurso, de correr por, de movimento. O objeto da Análise do Discurso é o discurso, ou seja, ela se interessa por estudar a “língua funcionando para a produção de sentidos”. Isto permite analisar unidades além da frase, ou seja, o texto (ORLANDI, 1999, p.17).

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O sentimento de raiva é exposto de forma contundente, revelando o mal estar do poeta ao compreender o jogo dos senhores da guerra. Por isso o desejo pela sua morte e a segurança de que esteja efetivamente morto é tão veemente. Dylan sugere que ficará em pé sobre o túmulo criando uma imagem emblemática, detendo sobre os seus pés o que está morto e impedindo qualquer novo surgimento. Masters of War é uma das maiores canções de Dylan, mas nomeá-lo apenas como um simples “cantor de protesto” é subestimar a sua grandiosidade criativa, o que com o passar dos anos foi comprovado. Masters Of War Come you masters of war You that build the big guns You that build the death planes You that build all the bombs You that hide behind walls You that hide behind desks I just want you to know I can see through your masks You that never done nothin' But build to destroy You play with my world Like it's your little toy You put a gun in my hand And you hide from my eyes And you turn and run farther When the fast bullets fly Like Judas of old You lie and deceive A world war can be won You want me to believe But I see through your eyes And I see through your brain Like I see through the water That runs down my drain You fasten the triggers For the others to fire Then you set back and watch When the death count gets higher You hide in your mansion As young people's blood Flows out of their bodies And is buried in the mud You've thrown the worst fear That can ever be hurled Fear to bring children Into the world For threatening my baby Unborn and unnamed You ain't worth the blood

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That runs in your veins How much do I know To talk out of turn You might say that I'm young You might say I'm unlearned But there's one thing I know Though I'm younger than you Even Jesus would never Forgive what you do Let me ask you one question Is your money that good Will it buy you forgiveness Do you think that it could I think you will find When your death takes its toll All the money you made Will never buy back your soul And I hope that you die And your death'll come soon I will follow your casket In the pale afternoon And I'll watch while you're lowered Down to your deathbed And I'll stand o'er your grave 'Til I'm sure that you're dead Senhores Da Guerra Venham seus senhores da guerra Vocês que constroem as grandes armas Vocês que constroem os aeroplanos da morte Vocês que constroem todas as bombas Vocês que se escondem atrás das paredes Vocês que se escondem atrás das mesas Eu só quero que vocês saibam Que eu enxergo através de suas mascaras Você que nunca fez nada A não ser criar para a destruição Você brinca com meu mundo Como se fosse seu pequeno brinquedo Você coloca uma arma em minha mão E se esconde da minha vista E se vira e corre longe Quando as rajadas de balas voam Como um Judas do passado Você mente e engana Uma guerra mundial pode ser vencida Você quer que eu acredite Mas eu enxergo através de seus olhos E eu enxergo através de sua mente Como enxergo através da água Que escorre pelo meu ralo Vocês apontam os gatilhos Para os outros atirar Então vocês se afastam e assistem Enquanto a contagem dos mortos aumenta

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Vocês se escondem em suas mansões Enquanto o sangue dos jovens Escorre pelos seus corpos E são enterrados na lama Vocês jogaram o pior dos medos Que possa ser lançado Medo de trazer crianças Para o mundo Por ameaçarem meu filho Ainda por nascer e sem nome Vocês não valem o sangue Que corre pelas suas veias O quanto que eu sei Para falar fora de hora? Você pode dizer que sou jovem Você pode dizer que sou inculto Mas há uma coisa que eu sei Embora eu seja mais novo que você Nem Jesus jamais poderia Perdoar o que você faz Deixa eu te fazer uma pergunta Será que seu dinheiro é mesmo tão forte? Poderia comprar seu perdão? Você acredita que pode? Acho que irá descobrir Quando sua morte te encontrar Que todo o dinheiro do mundo Não comprará de volta sua alma E eu espero que você morra E sua morte logo virá Seguirei seu caixão Na tarde pálida E assistirei enquanto eles lhe abaixem Para seu leito de morte E ficarei de pé sob seu túmulo Até ter certeza que estiver morto

3.2 A HARD RAIN´S A-GONNA FALL Como Masters of War, A Hard Rain´s A-gonna fall trata do mesmo tema da guerra. Dylan expõe o desespero de uma guerra nuclear. Após instalarem mísseis nucleares na Turquia apontados para a URSS, os americanos viram seu arquiinimigo fazer o mesmo ao colocar mísseis na costa de Cuba, todos apontados para o território rival. Apelidada de Crise dos mísseis, a tensão ia além de um iminente embate: era a consolidação de uma guerra nuclear. Uma guerra que poderia ficar sem vencedores, já que devastaria boa parte do nosso planeta – ou simplesmente sua totalidade (SOUNES, 2002)

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Com imagens tenebrosas as palavras de Dylan revelam um mundo destroçado pelas armas nucleares deixando a humanidade em farrapos. Questionando o que restara ao seu pequeno filho, ele nos induz a pensar o que estamos fazendo para o futuro das novas gerações. Um mundo distorcido e envenenado pelas armas nucleares é o novo habitat da humanidade pós-guerra nuclear. O discurso de Dylan soa profético, compreendendo as possibilidades que podem produzir determinado ações no futuro. A Hard Rain´s A-gonna fall é uma canção sombria, carregada de imagens fortes e poéticas. A chuva como sendo algo que atinge a todos, é uma imagem das catástrofes que irá atingir a humanidade. Dylan aos 21 anos de idade demonstra a profundidade e beleza de seu discurso, como se tivesse vivido muitos anos. Ele compreende a existência humana e lança novas perspectivas sobre ela. Dylan trata o homem a partir da sua nudez, não sobre os valores aos quais o homem está atado, é sobre realmente quem é o homem em estado natural. “Você entra para o quarto/ Com o seu lápis em sua mão/ você vê alguém nu/ e diz: quem é esse homem?” (DYLAN,1966 ). Suas poesias desvestem os poderosos de seus adereços para tentar enxergar o homem, à mercê das paixões, da cobiça, da inveja e do ciúme (ALCANTARA, 2006). A Hard Rain's A-Gonna Fall Oh, where have you been, my blue-eyed son? Oh, where have you been, my darling young one? I've stumbled on the side of twelve misty mountains, I've walked and I've crawled on six crooked highways, I've stepped in the middle of seven sad forests, I've been out in front of a dozen dead oceans, I've been ten thousand miles in the mouth of a graveyard, And it's a hard, and it's a hard, it's a hard, and it's a hard, And it's a hard rain's gonna fall. Oh, what did you see, my blue-eyed son? Oh, what did you see, my darling young one? I saw a newborn baby with wild wolves all around it I saw a highway of diamonds with nobody on it, I saw a black branch with blood that kept drippin', I saw a room full of men with their hammers a-bleedin', I saw a white ladder all covered with water, I saw ten thousand talkers whose tongues were all broken, I saw guns and sharp swords in the hands of young children, And it's a hard, and it's a hard, it's a hard, it's a hard, And it's a hard rain's gonna fall. And what did you hear, my blue-eyed son? And what did you hear, my darling young one? I heard the sound of a thunder, it roared out a warnin', Heard the roar of a wave that could drown the whole world,

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Heard one hundred drummers whose hands were a-blazin', Heard ten thousand whisperin' and nobody listenin', Heard one person starve, I heard many people laughin', Heard the song of a poet who died in the gutter, Heard the sound of a clown who cried in the alley, And it's a hard, and it's a hard, it's a hard, it's a hard, And it's a hard rain's gonna fall. Oh, who did you meet, my blue-eyed son? Who did you meet, my darling young one? I met a young child beside a dead pony, I met a white man who walked a black dog, I met a young woman whose body was burning, I met a young girl, she gave me a rainbow, I met one man who was wounded in love, I met another man who was wounded with hatred, And it's a hard, it's a hard, it's a hard, it's a hard, It's a hard rain's gonna fall. Oh, what'll you do now, my blue-eyed son? Oh, what'll you do now, my darling young one? I'm a-goin' back out 'fore the rain starts a-fallin', I'll walk to the depths of the deepest black forest, Where the people are many and their hands are all empty, Where the pellets of poison are flooding their waters, Where the home in the valley meets the damp dirty prison, Where the executioner's face is always well hidden, Where hunger is ugly, where souls are forgotten, Where black is the color, where none is the number, And I'll tell it and speak it and think it and breathe it, And reflect it from the mountain so all souls can see it, Then I'll stand on the ocean until I start sinkin', But I'll know my song well before I start singin', And it's a hard, it's a hard, it's a hard, it's a hard, It's a hard rain's gonna fall. Uma Chuva Forte Vai Cair Oh, onde você esteve meu filho de olhos azuis? Oh, onde você esteve, meu jovem querido? Tropecei ao lado de doze montanhas nebulosas Eu andei e engatinhei em seis estradas tortuosas Eu pisei no meio de sete florestas tristonhas Entrei e saí da frente de uma dúzia de oceanos mortos Estive dez mil milhas na boca de uma sepultura E é uma forte, e é uma forte, é uma forte, e é uma forte, E é uma forte chuva que vai cair Oh, o que você viu, meu filho de olhos azuis? Oh, o que você viu, meu jovem querido? Eu vi um bebê recém nascido com lobos selvagens lhe rondando, Eu vi uma estrada de diamantes sem ninguém sobre ela, Eu vi um galho negro com sangue que pingava, Eu vi um quarto cheio de homens com seus martelos sangrando, Eu vi uma escada branca toda coberta de água, Eu vi dez mil oradores cujas línguas estavam dilaceradas, Eu vi armas e espadas afiadas nas mãos de crianças pequenas, E é uma forte, e é uma forte, é uma forte, é uma forte, E é uma forte chuva que vai cair.

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E o que foi que você ouviu meu filho de olhos azuis? E o que foi que você ouviu meu jovem querido? Eu ouvi o som do trovão e seu estrondo era um aviso, Ouvi o ronco de uma onda que poderia afogar o mundo inteiro, Ouvi mil bateristas cujas mãos estavam em brasa, Ouvi dez mil sussurrando e ninguém estava ouvindo, Ouvi uma pessoa morrer de fome, ouvi muitas rindo, Ouvi a canção de um poeta que morreu na sarjeta, Ouvi o som de um palhaço que chorava no beco, E é uma forte, e é uma forte, é uma forte, é uma forte, E é uma forte chuva que vai cair. Oh, quem você encontrou meu filho de olhos azuis? Quem foi que você encontrou meu jovem querido? Eu encontrei uma criança jovem ao lado de um potro morto, Encontrei um homem branco que passeava com um cachorro preto, Encontrei uma jovem mulher cujo corpo estava queimando, Eu encontrei uma jovem menina, ela me deu um arco-íris, Eu encontrei um homem que estava ferido em amor, Eu encontrei um outro homem que estava ferido em ódio, E é uma forte, é uma forte, é uma forte, é uma forte, E é uma forte chuva que vai cair. Oh, o que farás agora, meu filho de olhos azuis? Oh, o que farás agora, meu jovem querido? Vou voltar lá pra fora antes que a chuva comece a cair, Vou andar até as profundezas da mais negra floresta, Onde o povo é tamanho e suas mãos estão vazias, Onde as cápsulas de veneno estão afogando suas águas, Onde o lar no vale encontra a prisão úmida e suja, Onde o rosto do executor está sempre bem escondido, Onde a fome é feia, onde as almas são esquecidas, Onde preto é a cor, onde nada é o número, E eu posso contá-lo e pensa-lo e dize-lo e respira-lo, E refleti-lo das montanhas para que todas as almas possam vê-lo, Então ficarei em pé sobre o oceano até começar a afundar, Mas eu conhecerei bem minha canção antes de começar a canta-la, E é uma forte, é uma forte, é uma forte, é uma forte, E é uma forte chuva que vai cair.

3.3 BLOWIN’ IN THE WIND

Blowin´ in the wind é uma das canções mais importantes da cultura pop contemporânea, inserida em uma época de grandes transformações sociais, como a luta pelos direitos civis nos Estados Unidos, ela traz em seu corpo elementos questionando sobre o sentido do mundo em que se vive. Expondo de uma forma poética enunciados sobre o porquê de o mundo ser um lugar tão contraditório. Inaugurando um estilo poético que não existia em sua época, pois os temas sérios não eram tratados na cultura pop de forma poética, Dylan se torna percussor de uma

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transformação cultural que vai ser seguida por outros artistas. Vindo da tradição folk, que trazia em suas composições crônicas do cotidiano relacionadas a injustiças sociais, racismo, assassinatos, relacionamentos. Dylan também relata a realidade mais de forma carregada de linguagem conotativa. As canções folk funcionavam como um jornal que trazendo em suas letras mais uma exposição de fatos. Os enunciados das canções folk contextualizam um dado momento circunscrito no espaço-tempo. A comoção trazida pelas canções folk era devido à própria injustiça do fato e não pela elaboração poética; eram canções temáticas sobre questões humanitárias e direitos civis (SOUNES, 2002). Os cantores folk como Woody Guthrie colocava as letras sob a base melódicas de clássicas antigas canções folk, tratando de temas atuais como a luta contra a segregação no sul dos estados unidos nos anos 1960. Segundo Marcelo Froes: “é nessa atmosfera que surgiu a canção de protesto, como um desenvolvimento da onda folk. Antes, mesmo politicamente engajados, os cantores folk se limitavam a recolher temas do cancioneiro tradicional que se pudessem aplicar a situações de sua época.”

Dylan também usa dos mesmos mecanismos para enunciação de seu discurso. A relevância de Blowin´in the Wind esta associada a sua contextualização ao momento que se encontrava os estados unidos nos anos 1960. Ela surge como uma voz para os que não tinham espaço. O incidente com a costureira negra Rosa Parks e a marcha pelos direito civis tornam-se campus para que Blowin in the Wind se torne um hino. Esses fatos são marcantes para a constituição do discurso.

Podemos considerar as condições de produção em sentido estrito e temos as circunstancias da enunciação: é o contexto imediato. E se as considerarmos em sentido amplo, as condições incluem o contexto sócio- histórico, ideológico. (ORLANDI, 2006, p. 30).

Desde o seu surgimento Blowin´in the Wind foi incorporada por vários movimentos engajados na luta pelos direitos de minorias. É uma canção atemporal, quebrando os liames do tempo-espaço. Se Blowin´in the Wind fosse a única composição de Dylan, ele já merecia um lugar na história da musica pop devido a sua originalidade, soando como algo totalmente novo. Blowin´in the Wind inicia-se

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questionando quantas estradas um homem deve andar para ser aceito como homem. A pergunta traz em si o questionamento sobre a realidade vigente de seu país nos anos 1960 e ao mesmo tempo se projeta para o futuro como uma denúncia a todo tipo de opressão. O discurso de Dylan vem amparado por vários outros discursos, pois não é o primeiro a questionar as injustiças sociais, sendo isto já tema frequente nas canções folk. Mas Dylan insere um texto poético em um tema politico, o tornando um diferencial na cultura musical em que estava inserido.

As condições de produção que constituem os discursos funcionam de acordo com certos fatores. Um deles é o que chamas relação de sentidos. Segundo essa noção, não há discurso que não se relacionem com outros. Em outras palavras os sentidos resultam de relações: um discurso aponta para outros que o sustentam, assim como para dizeres futuros. Todo discurso é visto como um estado de um processo discursivo mais amplo, continuo. Não há desse modo, começo absoluto com outros dizeres realizados, imaginados ou possíveis (ORLANDI, 2008, p. 39).

O enunciado no corpo de Blowin´in the Wind não exige uma resposta difícil. No próprio questionamento a resposta se levanta naturalmente, deixando o interlocutor num estado de “suspenção”, onde a mente não reage com ideias preconcebidas. Blowin´in the Wind é uma canção carregada de humanidade, ela tanto absorve a sociedade da qual se tem a sua origem, como também revela o homem que a criou. É uma canção curta em relação aos dois minutos e trinta segundos de sua duração, mas tem em seu discurso a perenidade, pois, enquanto o mundo for um lugar de opressão e medo, Blowin´in the Wind levantará como um hino. O pronome interrogativo quantos é reiterado buscando um sentido para a problemática criada, o levantamento do questionamento traz em seu corpo uma relação de indignação. O não dito releva no discurso. Para Orlandi (2006) quando se lê, considera-se não apenas o que está dito, mas também o que está implícito: aquilo que não está dito e que também está significando. E o que não está dito, mas que, de certa forma, sustenta o que está dito; o que está suposto para que se entenda o que está dito; aquilo a que está dito se opõe; outras maneiras diferentes de se dizer o que se disse e que significa com nuances distintas.

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O processo de segregação nos Estados Unidos faz surgir vozes, como em toda a efervescência de uma revolução faz surgir líderes. E Dylan surge como um porta voz da mensagem da liberdade. Convocando a todos como um sino para a luta pelos seus ideais. No verso “Quantas estradas um homem de andar para ser aceito como homem?” traz em si o questionamento de um Dylan ainda jovem, mas com toda a compreensão de sua realidade, indicando que não é necessário passar por tudo na vida para ser um homem. Para Dylan a dignidade está na própria pessoa humana e não nos títulos que se carrega. A imagem da senhora Rosa Parks sendo expulsa do ônibus e presa por policiais brancos demonstra claramente o porquê de Blowin´in the Wind juntamente com a canção folclórica We Shall Overcome que fora adaptada de um velho hino religioso negro, com novas letras e um novo arranjo, feito em uma sociedade folclórica do sul, ter uma veemente importância no Movimento

Pelos

Direitos

Civis.

Ela

surge

como

uma

consciência,

um

desnudamento da realidade, uma derrota da mentira, ela tem o poder de fazer o homem voltar para si mesmo e questionar o sentido de seus atos (SOUNES, 2002). No segundo verso da primeira estrofe “quantos mares uma gaivota irá sulcar pra poder descansar na areia?”, Dylan continua na mesma vertente questionando o esforço necessário para que se dele possa descansar. No não dito, Dylan revela uma sofreguidão pela conquista desenfreada dos bens materiais. No terceiro verso “quanto tempos as balas dos canhões explodirão antes de serem para sempre banidas?”, a guerra é tratada como algo que carece de sentido, onde os diálogos são silenciados brutalmente pelas vozes das armas. No refrão “A resposta meu amigo está soprando no vento/ a resposta está soprando no vento, não é que a resposta está em qualquer lugar e sim que está presente no coração do homem. Dylan diz de forma indireta, mas todo o ouvinte sente a presença que a resposta não está numa busca árdua, e que toda mazela humana é gerada pelo egoísmo. Dylan leva a mente do ouvinte ao esquema gerado pelos Koan´s do Zen Budismo, onde a resposta está no estado natural da mente: qual o som de uma palma só (CHOGYAM THRUNGPA, 1965). A segunda estrofe se apresenta como a primeira, com Dylan levantando questionamentos sobre a realidade da existência e a necessidade de ser assim: “Sim, e quanto tempo pode uma montanha existir/ antes que o mar a desfaça?/ Sim, e quanto tempo pode um povo viver sem conhecer a liberdade?/ sim e quantas vezes o homem deve virar a cabeça/ fingindo não ver o que esta vendo?”. Blowin´in the Wind é uma canção simples, sem grandes elaborações técnicas, a sua

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força está na sua poética. Esse é o diferencial de Dylan ante os antigos cantores Folk que só relatavam o cotidiano como uma crônica. Dylan ultrapassa os problemas de seu tempo, deixando o seu texto aberto não delimitando um tempo.Usando a linguagem, o homem modifica a realidade em que está inserido, atribuindo-lhe sentido. A última estrofe continua os questionamentos: “e sim, quanta vezes deve o homem olhar para cima para poder ver o céu?/ sim, e quantos ouvidos um homem deve ter para ouvir os lamentos do povo?/ sim, quantas mortes ainda serão necessárias/ para que se saiba que já matou demais?”. A canção se encerra deixando o ouvinte num estado de perplexidade, exercendo o texto o seu sentido poético. Segundo Moises Massaud (1997, p 29.): “a característica específica da poesia reside antes na visão própria que oferece da realidade que no fato de ser expressa em versos, sua análise há de implicar, sobretudo, e em última instância, essa concepção de mundo”.

Dylan construiu um texto simples e profundo, carregado de poesia, Blowin´in the Wind fez de Dylan um poeta célebre, mas o enunciado exposto na canção não é particularmente seu, pois Blowin´in the Wind é uma canção humana, pertence a toda humanidade. Blowin' In The Wind How many roads must a man walk down Before you can call him a man? How many seas must a white dove sail Before she can sleep in the sand? Yes and how many times must cannonballs fly Before they're forever banned? The answer, my friend, is blowin' in the wind The answer is blowin' in the wind Yes and how many years can a mountain exist Before it's washed to the sea Yes and how many years can some people exist Before they're allowed to be free? Yes and how many times can a man turn his head Pretend that he just doesn't see? The answer, my friend, is blowin' in the wind The answer is blowin' in the wind Yeah and how many times must a man look up Before he can see the sky? Yes and how many ears must one man have Before he can hear people cry? Yes and how many deaths will it take till he knows That too many people have died

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The answer, my friend, is blowin' in the wind The answer is blowin' in the wind? Soprando No Vento Quantas estradas um homem deve para que se possa chamá-lo de homem? Quantos mares uma pomba branca precisará sulcar Para que possa descansar na areia? Sim, e quanto tempo as balas de canhão voarão Antes de serem para sempre banidas? A resposta, meu amigo, está soprando no vento A resposta está soprando no vento. Sim, e quantos anos uma montanha pode existir Antes que o mar a desfaça? Sim, e quantos anos podem um povo existir Sem conhecer a liberdade? Sim, e quantas vezes um homem pode virar sua cabeça E fingir que ele simplesmente não vê? A resposta, meu amigo, está soprando ao vento A resposta está soprando ao vento Sim, e quantas vezes um homem precisará olhar para cima Antes que ele possa ver o céu? Sim, e quantas ouvidos um homem precisará ter Antes que ele possa ouvir as pessoas chorar? Sim, e quantas mortes ele causará até saber Que pessoas demais morreram? A resposta, meu amigo, está soprando no vento A resposta está soprando no vento?

4. CAPITULO III: A originalidade do artista

Bob Dylan é inconstante e controvertido em sua obra, a única regra para ele é quebrá-las. Desde o seu primeiro álbum que era composto em sua maior parte de covers, já estava presente a sua originalidade. Quando se firma como compositor célebre já no seu segundo álbum, ele faz um percurso diferente dos ídolos pop, deixando sua obra falar por ele. Caetano Veloso (2003, p.178) em seu livro Verdade Tropical faz uma declaração que dá um pouco a entender a dimensão e importância de Dylan na cultura pop:

Os Beatles pareciam muito mais construtivos e enxutos. Por outro lado, o experimentalismo ostensivo de "Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band" estava mais próximo não só do que fazíamos como dos grandes artistas que eu admirava, fossem eles Godard, Oswald, Augusto de Campos, João Cabral, Joyce, Lewis Carrol e Cummings. Embora os Beatles fossem obviamente mais ingênuos, Dylan parecia atrelado a uma concepção romântica do poeta, sem as excursões (explícitas) pela metalinguagem, pelo atonalismo e pelo concretismo que

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os Beatles apresentavam. Além disso, nunca me senti atraído pelo ambiente country americano, do qual ele tanto se aproximou. Até hoje, no entanto, a densidade de Dylan me interessa e sua personalidade artística me apaixona. Observo que o ouço hoje mais do que ouço os Beatles - e para maior proveito. Recentemente vi, por acaso, um número do seu "Acústico MTV" (era "With God on our side") e fiquei profundamente comovido. Ele é uma figura a um tempo central e à parte no panorama dos anos 60 - e um traço forte do século. Um dos mais impressionantes exemplos da pujança criativa da cultura popular americana, da cultura americana tout court. No momento em que os ingleses dominavam o jogo com sua versão do rock'n'roll do lado de lá do Atlântico, do lado de cá Dylan já apresentava o espessamento desse caldo em que Beatles e Rolling Stones beberam, mostrando onde está a nascente e de onde jorra a energia. E a gente sabe que Hendrix deve a ele tudo o que não deve aos grupos inglês (embora deva "tudo" ao público inglês). Dylan é um artista moderno, conceito que se define pelo talento em controlar os impulsos entre manter a coerência e buscar a originalidade. Dylan já soou como algo que as pessoas nunca tinham ouvido antes muita vezes. Nos Estados Unidos, Dylan pertence ao mesmo filo de Ralph Waldo Emerson, Walt Whitman e John Steinbeck, os mesmos antepassados culturais de seu primeiro ídolo, Woody Guthrie. As características básicas dessa linhagem é o idealismo, aceitação de que a natureza e os desvalidos do mundo têm as respostas que a aristocracia, a tecnologia, a erudição e as religiões estabelecidas não podem dar. Nos primeiros anos de sua carreira, essa foi a sua influencia mais decisiva sobre Dylan. Ela iria se diluindo mais tarde, mas nunca desapareceu completamente. “only a pawn in their game”- apenas um peão no jogo deles- é tudo que Dylan evitou ser. Por isso morrendo e deixando a pele pelo caminho, frustrando, primeiro os folcloristas, os puristas da Country music e, depois, os que esperavam que fosse apenas entertainer nos shows, alguém que cantasse as musicas preferidas da platéia. Ora um amatore rico, sem patrão canta o que quiser (ALCANTARA, 2008, p, 57). Nos anos 1963 Dylan já era um dos nomes mais aclamados da cultura americana, mas nunca aceitou ser o líder de nenhum segmento. O público folk o considerava como seu porta voz, título que ele nunca assumiu. O discurso de Dylan é coerente com a sua vida no momento, ele vai atravessando e deixando para trás as várias roupagens que usou.

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A forma sujeito histórico que corresponde à da sociedade atual representa bem a contradição: é um sujeito ao mesmo tempo livre e submisso. Ele é capaz de uma liberdade sem limites e uma submissão sem falhas: pode tudo dizer, contanto que se submeta à língua para sabê-la. Essa é a base do que chamamos assujeitamento (ORLANDI, 2001, p.50). Dylan rompe com a música folk e demonstra a sua não fixação a uma obra, em 1966 com o uso da guitarra elétrica escreve outra página grandiosa na música pop ao escrever a canção Like a Rolling Stone, que foi escolhida pela revista Rolling Stone, a canção pop mais importante. Não se arraigando a nenhum estilo, a sua obra é coerente, pois, sempre nos remete ao ponto de partida. As influências que sua música sofreu é vista de forma bem evidente em sua obra. O rompimento com a música folk acontece no festival de Newport de 1965 quando Dylan apresenta para o público sua nova canção amplificada (SOUNES, 2002). A ruptura de Dylan com a música folk provoca um choque cultural, se antes era visto como herói agora se torna traidor. Mas ser amado e odiado vai sempre estar em segundo plano na sua carreira. Antes de entreter o público, Dylan tenta ser fiel consigo mesmo. Caetano Veloso (2003, p. 82), um dos maiores compositores do mundo e admirador da obra de Dylan, percebe esse

distanciamento dele da criação do ícone: Bob Dylan não era um fenômeno comercial como os Beatles, mas, de certa forma, era mais conhecido do que os Rolling Stones no Brasil quando essas novidades nos foram apresentadas. Os Stones podiam ter tido "Satisfaction" nas paradas, mas Dylan já tinha admiradores seletos havia muito mais tempo. Lembro mesmo de ouvir um lado inteiro de um LP seu com Toquinho, em sua casa, na época em que andávamos juntos, ele, Chico e eu, por São Paulo, antes de eu me mudar pra lá. Toquinho queria minha opinião, pois lhe parecia demasiadamente enfadonho um disco - segundo lembro de ouvi-lo frisar - com todas as músicas cantadas e tocadas no mesmo tom. Achei curiosa a voz fanha e o jeito sujo de tocar violão e gaita. Não entendia nada das letras e terminei por me aborrecer também. Agora, o tropicalismo estabelecido, eu ouvia e reouvia maravilhado "Bringing it all back home", que Peticov me recomendara. Até hoje, esse é o disco de Dylan que mais me emociona. Eu continuava a não entender quase nada das letras, mas a atmosfera, a emissão vocal, o bem captado desleixo, o timbre geral de sofisticação alcançada sem o esforço de elaboração dos Beatles. Lembro de muitas vezes ter entendido erradamente o texto das canções e, sabendo que ele não estava dizendo o que eu supunha ouvir, ter chegado a frases e idéias que me soavam maravilhosas, algumas das quais eu talvez tenha usado como sugestão para letras de minhas próprias canções. Mas não se pode dizer que eu preferisse Dylan aos Beatles. Eu sabia de sua respeitabilidade e seu som sugeria uma mente mais culta do que a dos melhores roqueiros ingleses, mas, comparados a verbosidade de suas canções

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caudalosas e a retórica que se adivinhava do que era inteligível nas letras (meu inglês era meramente ginasial).

Dylan criou um conjunto de obra que, em estilo e tema, traça os contornos e as perspectivas da canção popular da metade do século. Sendo o centro gravitacional da musica pop, ele exercia influência decisiva sobre a música dos Beatles. John Lennon, com seu estilo involuntário de destruir homenageando, entronizou na canção Mother, (1979) Dylan no “altar”: “ Não acredito em Zimmerman.” Bob Dylan se fundamenta como um dos pilares da cultura pop, é muito difícil que um novo artista consiga superar com efeito a trajetória de Dylan, ou mesmo exercer papel tão importante na música popular.

CONCLUSÃO

A expressividade da obra de Bob Dylan marca definitivamente os anos 1960 e se expande para os anos 2000. A consistência de suas canções as tornaram clássicas, existindo como parte do inconsciente coletivo das gerações. A sua personalidade tornou-se modelo para vários artistas, como influencia e inspiração. O seu segundo álbum The Freewhellin´Bob Dylan de 1963 é um marco histórico na musica pop, através das canções Masters of War, A Hard Rain´s AGonna Fall e, principalmente Blowin´in the Wind, tornaram-se hinos em movimentos de contestação social. Essas canções além de sua importância politica estão associadas ao uso da poesia nas canções folks, Dylan usa a poesia para tratar de temas sérios como guerra, racismo e injustiça social. Blowin´in the Wind canção emblemática que marca a entrada de Dylan no estrelato da musica pop, também surge como a canção que introduz o texto poético na musica folk. A importância de Blowin´in the Wind ultrapassa os anos 1960, no

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qual esta marcada juntamente com a luta pelos Direitos Civis, essa canção atinge a todo tempo em que manifestará lutas pelos direitos sociais. Bob Dylan cria na atividade artística uma forma diferenciada do artista se portar, não sendo apenas joguete nas mãos do publico. Dylan não propõem ser um mestre de divertimento para a plateia, a sua coerência esta afixada a sua obra. E a sua obra fala por si.

REFERÊNCIAS

ORLANDI, Puccinelli Eni. Análise de Discurso. São Paulo: Pontes, 2008. ______. Discurso e Leitura. São Paulo: Cortez, 2008. MOÍSES, Massaud. A Análise Literária. São Paulo: Cultrix, 2008. DYLAN, Bob. Crônicas Volume I. São Paulo: Planeta do Brasil, 2005. GOFFMAN, Ken; JOY, Dan. Contracultura através dos Tempos. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004. KEROUAC, Jack. On the Road – Pé na Estrada. Porto Alegre: L &PM Pocket, 2006, p. PEREIRA, Carlos Alberto. O que é contracultura? Col. Primeiros Passos – Nova Cultural/Brasiliense, 1983. Citado em: . Acesso em: 19 jul. 2013.

44

MASINI, Fernando. A revolução beatnik. Disponível em: . Acesso em: 20 jul. 2007. REVISTAS: REVISTA BRAVO. Em Busca de Bob Dylan. Por Euripedes Alcantara 2008. REVISTA BRAVO. A Era Bob Dylan . Por Euripedes Alcantarade 2006.

LETRAS DE MÚSICAS: DYLAN, Bob. Blowin’ in the Wind: The Freewheelin’, 1963. Disponível em: . Acesso em: 20 jul. 2013. DYLAN, Bob. Masters of War: The Freewheelin’, 1963. Disponível em: . Acesso em: 20 jul. 2013. DYLAN, Bob. A Hard Rain´s A-Gonna Fall: The Freewheelin’, 1963. Disponível em: . Acesso em: 20 jul. 2013. DISCOGRAFIA: DYLAN, Bob. Bob Dylan: 1962. __________. The Freewheelin’: 1963. __________. The Times They Are A-Changin’: 1964. __________. Another Side of Bob Dylan: 1964. __________. Bringing It All Back Home: 1965. __________. Highway 61 Revisited: 1965.

DOCUMENTÁRIOS / FILMES: PENNEBAKER, D. A. Don’t Look Back: 1965. ROWARD, Alk. Renaldo and Clara: 1975. SCORSESE, Martin. No Direction Home: 2005. HAYNES,Tood. Eu Não Estou Lá. 2007.

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