UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE PESCA CURSO DE ENGENHARIA DE PESCA

KATIANE BARBOSA GUIMARÃES

PESCARIAS URBANAS DE FORTALEZA - CEARÁ

FORTALEZA 2010

KATIANE BARBOSA GUIMARÃES

PESCARIAS URBANAS DE FORTALEZA - CEARÁ

Monografia submetida ao Departamento de Engenharia de Pesca, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do título de Engenheiro de Pesca. Área de concentração: Engenharia de Pesca. Orientador: Prof. Dr. Reynaldo Amorim Marinho.

FORTALEZA 2010

KATIANE BARBOSA GUIMARÃES

PESCARIA URBANA DE FORTALEZA - CEARÁ

Monografia submetida ao Departamento de Engenharia de Pesca, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do título de Engenheiro de Pesca. Área de concentração: Engenharia de Pesca.

Aprovada em 02/12/2010

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. Dr. Reynaldo Amorim Marinho (Orientador) Universidade Federal do Ceará - UFC

________________________________________ Dra. Alessandra Cristina da Silva Universidade Federal do Ceará - UFC

________________________________________ Prof. Dr. Raimundo Nonato de Lima Conceição Universidade Federal do Ceará - UFC

À minha família.

AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, por sempre me dar forças e coragem quando eu pensava que não podia mais.

Aos meus pais, Cleto Lopes e Célia Barbosa, por toda a educação e amor, sendo minha fonte de luz e vida, dando-me apoio e carinho sempre. Às minhas irmãs, Cristiane, Clécia Cristina, Maria Valnélia (irmã do coração), que são irmãs-amigas e estão sempre presentes em minha vida, ajudando-me e incentivando-me. Ao Maury Lukas (Kinha), por ser o irmão que não tive e por estar sempre disposto a me ajudar quando preciso.

À Família Castro, que me acolheu como parte da família.

Às minhas amigas Yzabella Queiroz, Angélica Fernandes (Anjo) e Karolyne Araújo, por serem e se fazerem presentes em todas as horas.

Ao meu querido Mestre e Professor Carlos Augusto (Carlão), por me fazer crescer humanamente e me ensinar a sempre trabalhar em equipe.

Ao Professor Marcelo Augusto (Tubarão), por todos os ensinamentos e por ter me dado oportunidade de sonhar com um futuro profissionalizante na área.

Ao Professor Reynaldo Marinho, pelo apoio e ajuda na elaboração e orientação desse trabalho e por solidificar essa minha vontade de trabalhar profissionalmente na área.

À Alessandra Cristina da Silva, pela sua amizade, credibilidade, confiança e por sempre estar me ensinando e me fazendo amadurecer como pessoa e como profissional.

A todas as pessoas que passaram na minha vida acadêmica construindo laços de afeto e de amizades, principalmente: Andrezza, Alyne Castelo, Anelayne Ribeiro, Aretha Alves, Bruno Batista, Belisa Aguiar, Clara Coe, Daniele Marques, Elaine de Fátima, Edirsana Maria, Elana Carolina, Fátima Nogueira, Francisco Arruda (in memoriam), Glácio, Heloisa

Cunha, Iole, Janaína Bernardo, Janaina Sales, Luciana Kelly (Militante), Paula Andréa, Roberta Mayra, Raimundo Nonato, Robério Lopes, Tiago Carvalho, Úrsula Beatriz.

Aos meus queridos amigos, que se fizeram presentes nessa fase tão difícil e especial para mim, Frederico Magalhães (Frodo), Juarez Coelho (Juá) e Rochelle Bezerra (Roches).

A toda a equipe do IBAMA, em especial ao Dr. Cláudio, à Gleiciane, ao Vladimir e ao seu Casimiro, pois, sem eles, parte desse trabalho não teria sido concretizada.

Aos pescadores de Fortaleza, por terem colaborado para que eu pudesse ter realizado esse trabalho.

A todos os Professores do Departamento de Engenharia de Pesca, que contribuíram para a minha formação profissional e pessoal, em especial à Professora Silvana Saker Sampaio.

“Eu sou apenas uma gota no meio do Oceano, mas o Oceano seria menor se lhe faltasse essa gota.” (Madre Teresa de Cálcutá)

RESUMO

O objetivo principal deste trabalho foi descrever a pesca urbana em Fortaleza, Ceará. Os dados foram obtidos de duas fontes de informação: banco de dados do Projeto de Estatística Pesqueira (ESTATPESCA/CE), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), do ano de 2009 e questionários não estruturados aplicados durante as viagens de campo com os pescadores, no período de agosto a novembro de 2010. Para a aplicação do questionatio não estruturado, formam escolhidos dois locais de desembarque: Barra do Ceará, representando o lado oeste e o Mucuripe, representando o lado leste. Na Barra do Ceará foram aplicados 20 questionários, sendo assim distribuidos: 7 entrevistas com mestres de lancha e 13 entrevistas com mestres de paquete. No Mucuripe foram aplicados 25 questionários, sendo assim distribuídos: 10 entrevistas com mestres de jangada, 5 entrevistas com mestres de lancha e 10 entrevistas com mestres de bote a remo. Totalizando 45 questionários. Para a caracterização das embarcações e aparelhos-de-pesca (quantidade e tipos), as informações foram obtidas do banco de dados do Projeto ESTATPESCA. Por meio das entrevistas, foi possível descrever os métodos de navegação, as técnicas de pesca, a forma de identificação do pescado e os pontos de desembarque, sendo esse último avaliado quanto à infraestrutura, higiene e condições sanitárias. A partir da análise dos dados, observou-se que no litoral de Fortaleza atuaram cinco tipos de embarcações: bote à vela, bote a remo, paquete, jangada e lancha motorizada. Os principais aparelhos-de-pesca de pesca utilizados nas pescarias foram a rede-de-espera e a linha-de-mão. Os pescadores utilizaram dois métodos de navegação: visual e eletrônica. A identificação do pescado era realizada com diferentes cortes na nadadeira caudal e na cabeça dos peixes. Nos locais de desembarque (venda do pescado), observou-se que estes apresentaram grande carência de estrutura física. A pesca artesanal realizada em Fortaleza é uma atividade de grande importância econômica para a região, mas há necessidade de estudos nessa área para que se possa garantir um gerenciamento adequado.

Palavras-chave: Pesca Artesanal. Portos de desembarque. Embarcações pesqueiras.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Localização da área de estudo, destacando os principais pontos de desembarque de pescado no litoral de Fortaleza/CE...........................................................

15

Figura 2 - Bote à vela utilizada nas pescarias artesanais da Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE...................................................................................................................

19

Figura 3 - Bote a remo utilizado nas pescarias artesanais do Mucuripe, no município de Fortaleza/CE.........................................................................................................................

20

Figura 4 - Paquete utilizado nas pescarias artesanais da Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE. .......................................................................................................................

20

Figura 5 - Jangada utilizada nas pescarias artesanais do Mucuripe, no município de Fortaleza/CE. ......................................................................................................................

21

Figura 6 - Posição dos pescadores no porão da jangada durante o pernoite........................

22

Figura 7 - Lancha motorizada utilizada nas pescarias artesanais da Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE. .................................................................................................

23

Figura 8 - Porcentagem de desembarques, considerando os aparelhos-de-pesca empregados pela frota artesanal no município de Fortaleza/CE, no ano de 2009...............

23

Figura 9 - Exemplo de um aparelho portátil de navegação eletrônica com o sistema de posicionamento global (GPS) utilizado pelos pescadores artesanais de Fortaleza/CE........

26

Figura 10 - Método de navegação visual (A) e instrumento utilizado para a confirmação do pesqueiro quanto à profundidade e tipo de substrato (“sassanga”) (B) utilizado pelos pescadores do município de Fortaleza/CE...........................................................................

27

Figura 11 - Posicionamento utilizado pelos pescadores nas pescarias de jangada com linha-de-mão no município de Fortaleza/CE.......................................................................

28

Figura 12 - Método de marcação do pescado adotado pelos pescadores do município de Fortaleza/CE. .......................................................................................................................

29

Figura 13 - Vista parcial do trapiche (A) e do escoamento de águas servidas sem tratamento (B) na Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE......................................

30

Figura 14 - Vista parcial do local de desembarque dos paquetes (A) e da construção da via de acesso na orla (B), deslocando os paquetes para locais inapropriados (C) na Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE.............................................................................

31

Figura 15 - Vista parcial dos boxes (A), da mesa de manipulação (B) e do “banheiro” (C) no ponto de venda de pescado no Pirambú (localidade Marinha), no município de Fortaleza/CE.........................................................................................................................

32

Figura 16 - Caracterização do local de desembarque no Mucuripe, município de Fortaleza/CE. (A) Cacimba e (B) bomba d’água utilizadas para lavar o material de pesca. ...................................................................................................................................

33

Figura 17 - Caracterização do local de desembarque no Mucuripe, município de Fortaleza/CE. (A) Caixas para guardar o material de pesca e (B) rede sendo organizada..

34

Figura 18 - Vista parcial dos boxes de madeira (A) e alvenaria (B) para a venda de pescado no Mucuripe, no município de Fortaleza/CE. .......................................................

35

Figura 19 - Comercialização do pescado no Mucuripe, no município de Fortaleza/CE. (A) Exposição sob a lona e (B) em contato direto com a areia da praia..............................

36

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Distribuição da frota cadastrada, por localidade, no município de Fortaleza/CE no ano de 2009..........................................................................................

18

Tabela 2 - Número e percentual de desembarques controlados por tipo de pescaria no município de Fortaleza, no ano de 2009.........................................................................

24

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 13 2 MATERIAL E MÉTODOS................................................................................................ 15 2.1 Área de Estudo.................................................................................................................. 15 2.2 Coleta e análise de dados................................................................................................. 16 2.2.1 Caracterização das embarcações..................................................................................... 17 2.2.2 Caracterização dos aparelhos-de-pesca........................................................................... 17 2.2.3 Técnicas de pesca............................................................................................................ 17 2.2.4 Locais de Desembarque................................................................................................... 17 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO....................................................................................... 18 3.1 Caracterização das embarcações.................................................................................... 18 3.1.1 Bote à vela....................................................................................................................... 19 3.1.2 Bote a remo...................................................................................................................... 19 3.1.3 Paquete............................................................................................................................. 20 3.1.4 Jangada............................................................................................................................ 21 3.1.5 Lancha............................................................................................................................. 22 3.2 Caracterização dos aparelhos-de-pesca.......................................................................... 23 3.4 Técnicas de pesca.............................................................................................................. 26 3.5 Locais de desembarque.................................................................................................... 29 4 CONCLUSÃO...................................................................................................................... 37 REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 38 APÊNDICE..............................................................................................................................40

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1 INTRODUÇÃO

A pesca é tão antiga quanto à caça e a agricultura como atividade extrativa de produtos alimentícios para o homem, sendo praticada no Brasil antes da chegada dos portugueses, cujas primeiras pescarias foram relatadas em várias cartas de Pero Vaz de Caminha, encaminhadas para o Rei Dom Manoel I (FONTELES FILHO, 1997). Das várias pescarias exercidas em todo o litoral brasileiro, no período colonial, a pesca da baleia foi a mais importante em termos econômicos, principalmente para os Estados da Paraíba, Bahia e São Paulo, onde a captura ocorria com mais freqüência. Essa pescaria aconteceu entre os séculos XVII a XVIII, sendo praticamente extinta no século XIX devido à concorrência estrangeira, sobretudo de norte-americanos e ingleses (DIEGUES, 1999). Desse modo, para que outras pescarias não tivessem o mesmo destino, foi criado em 1846 a Capitania dos Portos, que deu início ao primeiro levantamento de todos os barcos de pesca e pescadores nacionais, com o objetivo de conhecer a estrutura das pescarias e assim administrá-las com mais eficácia. Uma forma de gestão era a cobrança de impostos sobre o pescado que poderia ser por meio do dízimo ou sobre a comercialização (PAIVA, 2004). No início do século XX, pescarias que anteriormente eram caracterizadas como de pequena escala foram classificadas como industriais devido ao aumento gradativo da produção de pescado, a exemplo da pesca da sardinha no litoral do Estado do Rio de Janeiro, que utilizava grandes redes-de-cerco nas capturas. Essa excelente oferta de matéria-prima promoveu a construção de indústrias de beneficiamento, sendo a salga, secagem e enlatamento, como métodos mais utilizados no processamento da sardinha capturada (DIEGUES, 1999). Com essa expansão na indústria pesqueira, o Ministério da Marinha, no âmbito do Ministério da Agricultura, viu a necessidade de criar normas para fins de organização do sistema pesqueiro, elaborando assim em 1934, o primeiro documento oficial direcionado a pesca, o Código de Caça e Pesca (PAIVA, 2004). Na década de 60, foi criada a Superintendência do Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE) que por meio de incentivos fiscais, proporcionou melhorias no setor pesqueiro, com aquisição de novas embarcações e equipamentos de pesca e implantação de unidades de beneficiamento do pescado (CARDOSO, 2001). Entretanto, uma grave crise ocorreu na década de 80, quando a maioria das indústrias de pesca faliu, devida principalmente à rápida sobrepesca dos recursos; a recessão econômica que limitou o aporte dos recursos financeiros

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obtidos facilmente pelas empresas e a falta de treinamento e qualificação de técnicos e pescadores para o setor industrial (DIEGUES, 1999). Desse modo, a pesca artesanal começou a demonstrar grande importância para o setor pesqueiro, em termos de volume de captura, quantidade e tipos de embarcações e aparelhos-de-pesca e número de pescadores envolvidos nessa atividade. No litoral brasileiro, a pesca artesanal é predominantemente praticada na região nordeste do Brasil devido às condições oceanográficas na faixa intertropical que determinam a existência de uma grande diversidade específica e pequena abundância individual, o que aumenta a dispersão da atividade ao longo da zona costeira e a variedade da exploração em termos de tipos de embarcações, métodos e aparelhos-de-pesca, caracterizando as pescarias como um complexo sistema de produção (DIAS NETO; DORNELLES, 1996). O Estado do Ceará com 573 km de costa tem o seu litoral dividido em duas áreas: leste e oeste, tendo como marco divisor a cidade de Fortaleza. Nesse litoral estão localizados 20 municípios costeiros e 113 pontos de desembarque de pescado, sendo a pesca artesanal a atividade mais praticada ao longo de toda a costa (BRASIL, 2006). Nas pescarias são utilizadas embarcações movidas principalmente à vela ou a remo, a exemplo das canoas, das jangadas, dos paquetes e dos botes, assim como vários aparelhos-de-pesca (rede-de-espera, linha-de-mão e armadilha) (CASTRO e SILVA, 2004). Em 2007, foram registradas 7.402 embarcações artesanais que juntas contribuíram com 58% da produção total desembarcada no litoral cearense (BRASIL, 2008), sendo Fortaleza um dos munícipios de maior produção de pescado desembarcado, tendo a Barra do Ceará, Pirambu, Serviluz e Mucuripe como os principais locais de desembarque de peixes e a crustáceos (guaiúba, serra, cavala, sirigado, cioba, dentão, lagostas vermelha e verde), dentro de um porcesso extrativo primitivo em que a figura do atravessador, pessoa que intermedia a venda do produto, tem bastante influência no escoamento da produção (ROGRIGUES; MAIA, 2007). No entanto, os pescadores artesanais enfrentam diversos obstáculos para garantir o sucesso das pescarias e consequentemente a sua qualidade de vida, como a falta de infraestrutura nas comunidades e melhoria nos equipamentos de pesca, que para serem sanadas é necessário o conhecimento prévio da realidade local. Neste contexto, o presente trabalho teve como objetivo caracterizar a pesca artesanal urbana de Fortaleza, através da descrição das embarcações, aparelhos-de-pesca, técnicas de pesca e locais de desembarque.

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2 MATERIAL E MÉTODOS

2.1 Área de estudo

A cidade de Fortaleza está situada no litoral setentrional do nordeste brasileiro (latitude 03°43'02''S e longitude 038°32'35''W), cuja costa possui uma extensão de 23 km, tendo como limites a foz do Rio Cocó, a leste e a foz do Rio Ceará, a oeste (FECHINE; PONTES, 2008). Neste litoral existem oito locais de desembarque de pescado, que são: Barra do Ceará, Goiabeira, Pirambú, Arpoador, Casas Novas, Marinha, Mucuripe e Serviluz (Figura 1).

41°W

40°W

39°W

38°W 3°S

4°S

5°S

6°S

7°S

8°S

Figura 1 - Localização da área de estudo, destacando os principais pontos de desembarque de pescado no litoral de Fortaleza/CE.

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Em relação ao clima, a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) é um dos mais importantes eventos meteorológicos responsável pela precipitação na região nordeste do Brasil. Com o seu deslocamento sazonal, a presença de chuvas ocorre quando a ZCIT está posicionada mais ao sul, entre os 5ºS, em março; ocorrendo o oposto, quando sua posição é ao norte, entre os 10ºN, em setembro (SOUSA FILHO; ZANELLA; MAGALHÃES, 2009).

2.2 Coleta e análise de dados

Os dados utilizados neste trabalho foram obtidos de duas fontes de informação: (a) banco de dados do Projeto de Estatística Pesqueira (ESTATPESCA/CE), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), no ano de 2009 e (b) questionário não estruturado aplicado aos mestres de embarcação durante as viagens de campo, no período de agosto a novembro de 2010. Inicialmente, uma viagem de reconhecimento da área de estudo foi realizada com a finalidade de verificar quais locais de desembarque seriam visitados posteriormente para o levantamento das informações. Os critérios adotados para a seleção dos locais foram: (a) ponto de desembarque ativo; (b) maior variedade de tipos de embarcações e aparelhos-depesca; (c) maior quantidade de pescado desembarcado e (d) presença de pontos de venda de pescado. Desse modo, foram selecionados quatro locais: Barra do Ceará, Goiabeiras, Marinha e Mucuripe. Para a aplicação do questionário não estruturado (Apêndice A), foram escolhidos dois locais de desembarque: Barra do Ceará, representando o lado oeste e o Mucuripe, representando o lado leste do litoral de Fortaleza. Na Barra do Ceará foram aplicados 20 questionários (7 com mestres de lancha e 13 com mestres de paquete) e no Mucuripe 25 questionários (10 com mestres de jangada, 5 com mestres de lancha e 10 com mestres de bote a remo), totalizando 45 entrevistas. As entrevistas não estruturadas são instrumentos que possibilitam uma maior proximidade entre entrevistador e entrevistado, permitindo uma elasticidade quanto à duração da entrevista e uma cobertura mais profunda do assunto abordado (BONI; QUARESMA, 2005; LEITE FILHO; MARINHO; FURTADO-NETO, 2008).

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2.2.1 Caracterização das embarcações

A caracterização das embarcações foi realizada com base nas informações do banco de dados do Projeto ESTATPESCA, onde foram obtidos as quantidades e os tipos de embarcações existentes no litoral de Fortaleza.

2.2.2 Caracterização dos aparelhos-de-pesca

A caracterização dos aparelhos-de-pesca foi feita com os dados coletados nos questionários aplicados aos mestres de embarcação e no banco de dados do Projeto ESTATPESCA (número de desembarques controlados). Com essas informações foi possível conhecer e descrever os principais aparelhos-de-pesca, assim como, distinguir os tipos de pescarias (embarcação/aparelho-de-pesca) atuantes no litoral cearense.

2.2.3 Técnicas de pesca

Por meio das entrevistas, foram obtidas informações sobre as técnicas de pesca quanto ao método de navegação e posicionamento da tripulação a bordo da embarcação. Como informação adicional, foi descrito o método de marcação dos peixes adotado pelos os pescadores quando do desembarque do pescado.

2.2.4 Locais de desembarque

Os locais de desembarque foram qualificados com base em observações in loco em três importantes pontos de venda do pescado: Barra do Ceará, Marinha e Mucuripe. Durante as visitas nesses locais, foi possível avaliar a infraesturura de apoio à pesca e as condições sanitárias.

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3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Caracterização das embarcações

A composição da frota compreendeu cinco tipos de embarcações: o bote à vela, o bote a remo, o paquete, a jangada e a lancha. No ano de 2009, o número total de embarcações registradas no cadastro do ESTATPESCA, no município de Fortaleza, foi de 464 unidades (17 botes à vela, 87 botes a remo, 158 paquetes, 84 jangadas e 118 lanchas). Desse total, 43,7% dos barcos desembarcaram no Mucuripe. Dentre os tipos de embarcações, os paquetes e as lanchas foram as mais freqüentes, representando 59,5% do total de barcos cadastrados em Fortaleza (Tabela 1).

Tabela 1 - Distribuição da frota cadastrada, por localidade, no município de Fortaleza/CE no ano de 2009.

Tipo de embarcação Localidade

Bote à vela Bote a remo

Paquete

Jangada

Lancha

Total

Arpoadores

-

-

31

13

-

44

Barra do Ceará

5

-

27

-

18

50

Cais pesqueiro

-

-

-

-

18

18

Casas novas

-

-

18

3

-

21

Mucuripe

6

76

21

59

41

203

Pirambú

-

-

12

9

-

21

Porto dos botes

6

-

1

-

41

48

Serviluz

-

11

48

-

-

59

17

87

158

84

118

464

Total

Fonte: banco de dados do Projeto de Estatística Pesqueira (ESTATPESCA/IBAMA/CE).

Nas pescarias, a linha-de-mão, a rede e a armadilha, foram os aparelhos-de-pesca mais empregados por essas embarcações que possuem as seguintes características:

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3.1.1 Bote à vela

O bote à vela é uma embarcação cujo tamanho variou de 8 a 12 m e apresentou autonomia de mar de 12 dias. Construído de madeira, com quilha, cuja função é equilibrar a embarcação e proteger o leme. O mastro, que é fixo na proa do bote, possui uma estrutura chamada de verga, com a finalidade de segurar a vela (Figura 2). A tripulação foi composta, em média, por cinco pescadores que utilizavam nas pescarias somente a linha-de-mão.

Figura 2 - Bote à vela utilizada nas pescarias artesanais da Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE.

3.1.2 Bote a remo

O bote a remo é uma embarcação com comprimento médio de 3 m. Construído de madeira, possuindo casco chato, sem quilha e um banco de governo (Figura 3). Com seu curto raio de ação, as pescarias foram realizadas em um dia, conhecida como pesca de “ir e vir”. Essa embarcação, quando direcionada à pesca do camarão, conduz a bordo uma caixa isotérmica com gelo escamado ou britado para a conservação do pescado. A tripulação foi composta por um ou dois pescadores. Foi observado que alguns botes possuíam um pequeno motor, conhecido como “rabeta”, utilizado para diminuir o tempo de locomoção da embarcação durante o seu regresso ao local de desembarque.

20

Figura 3 - Bote a remo utilizado nas pescarias artesanais do Mucuripe, no município de Fortaleza/CE.

3.1.3 Paquete

O paquete é uma embarcação construída de madeira, sem quilha, casco chato e com revestimento interno de isopor. A propulsão é a vela e o comprimento variou entre 2,00 e 5,98 m (Figura 4). Essa embarcação realizou pescarias de curta duração, chamada de “ir e vir” e dessa forma, o pescado capturado era mantido fresco dentro de um cesto confeccionado de cipó (samburá). A tripulação foi composta de dois ou três pescadores.

Figura 4 - Paquete utilizado nas pescarias artesanais da Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE.

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3.1.4 Jangada

A jangada é uma embarcação semelhante ao paquete, porém o comprimento observado foi superior a 5,98 m e a boca (maior largura de uma embarcação) variou de 1,50 a 1,80 m. Construída de madeira, possui banco de governo, banco de vela e uma bolina (tábua inserida no centro da embarcação com função de quilha) (Figura 5). A autonomia de mar foi de três dias e as pescarias eram realizadas geralmente em um dia (“ir e vir”). A tripulação foi composta, em média, de quatro pescadores. O pescado foi conservado em uma caixa isotérmica contendo gelo escamado ou britado. Para aumentar o tempo de conservação, o procedimento adotado pelos pescadores era de fazer camadas alternadas de gelo e pescado, iniciando-se com uma de gelo.

Figura 5 - Jangada utilizada nas pescarias artesanais do Mucuripe, no município de Fortaleza/CE.

A jangada possui um porão com profundidade que varia de 40 a 80 cm, sendo utilizado para armazenar o material de pesca e abrigar os pescadores, durante o pernoite. Para dormir, os pescadores geralmente utilizavam tapetes sobre as tábuas da embarcação e acomodam-se dentro da jangada, obedecendo a sequência de entrada pelo porão, do menor para o maior pescador. Quando em alto mar, durante o pernoite, a embarcação é ancorada paralelamente à linha de costa, de modo que a posição da popa está para oeste e da proa para leste. Com esse posicionamento, a tripulação está perpendicular à linha de costa (largura da embarcação), com a cabeça direcionada para o mar e os pés para a terra (Figura 6).

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Posição dos pescadores durante o pernoite

Porão

Figura 6 - Posição dos pescadores no porão da jangada durante o pernoite.

Segundo os pescadores, esse posicionamento era mais confortável para dormir porque a parte mais pesada do corpo (cabeça e tronco) fica direcionada para o mar, diminuindo a sensação de movimento devido às oscilações da maré, assim como diminui a probabilidade da embarcação emborcar.

3.1.5 Lancha

A lancha é uma embarcação motorizada, construída de madeira, que possui uma casaria (cabine) no convés, podendo esta localizada na popa ou na proa do barco e o dormitório é provido de beliches para a acomodação da tripulação (Figura 7). O comprimento variou de 10 a 18 m, cuja esta amplitude é classifica em três tamanhos: pequena (10 a 12 m), média (12 a 16 m) e grande (16 a 18 m). A tripulação era composta, em média, de cinco pescadores e o tempo de pescaria era de cinco dias. As pescarias eram destinadas para a captura de peixes, com o emprego da rede e do espinhel e para a captura de lagostas, utilizando o manzuá, a rede-de-espera e o mergulho com compressor. Para conservar o pescado era utilizado o gelo.

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Figura 7 - Lancha motorizada utilizada nas pescarias artesanais da Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE.

3.2 Caracterização dos aparelhos-de-pesca

Nas pescarias, foram empregados sete tipos de aparelhos-de-pesca; a linha-demão, o espinhel, a rede-de-espera, a rede-de-arrasto, o arpão e o manzuá, sendo este último destinado para o peixe e para a lagosta. No ano de 2009, o número de desembarques controlados pelo ESTATPESCA, no município de Fortaleza, foi de 869 desembarques. Desse total, 328 foram de embarcações operando com rede-de-espera (37,7%), 288 com linha-de-mão (33,1%), 183 com manzuá para lagosta (21,1%), 50 com espinhel (5,8%), 8 com manzuá para peixe (0,9%), 8 com arpão (0,9%) e 4 com rede-de-arrasto (0,5%) (Figura 8). Rede-de-espera

37,7

Aparelho-de-pesca

Linha-de-mão

33,1

Manzuá/lagosta

21,1

Espinhel

5,8

Arpão

0,9

Manzuá/peixe

0,9

Rede-de-arrasto

0,5 0,0

10,0

20,0

30,0

40,0

Desembarques (%)

Figura 8 - Porcentagem de desembarques, considerando os aparelhos-de-pesca empregados pela frota artesanal no município de Fortaleza/CE, no ano de 2009.

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Quanto aos tipos de pescarias (embarcação/aparelho-de-pesca) foram registrados 17 tipos, sendo as pescarias de bote a remo com rede-de-espera, paquete com linha-de-mão, paquete com rede-de-espera e lancha com manzuá para lagosta as mais frequentes em termos de número de desembarques (Tabela 2).

Tabela 2 - Número e percentual de desembarques controlados por tipo de pescaria no município de Fortaleza, no ano de 2009.

Pescaria Embarcação

Aparelhos-de-pesca Linha-de-mão

Bote à vela

Bote a remo

Paquete

Jangada

Lancha

Desembarques N

%

17

2,0

Manzuá/lagosta

6

0,7

Rede-de-espera

165

19,0

Linha-de-mão

4

0,5

Rede-de-espera

92

10,6

Linha-de-mão

136

15,7

Manzuá/lagosta

54

6,2

Rede-de-espera

2

0,2

Linha-de-mão

85

9,8

Manzuá/lagosta

35

4,0

Rede-de-arrasto

4

0,5

Rede-de-espera

69

7,9

Linha-de-mão

46

5,3

Manzuá/lagosta

88

10,1

Espinhel

50

5,8

Manzuá/peixe

8

0,9

Arpão

8

0,9

869

100,0

Total

Fonte: banco de dados do Projeto de Estatística Pesqueira (ESTATPESCA).

De acordo com as informações registradas durante as entrevistas em campo e do banco de dados do ESTATPESCA, foi possível descrever três aparelhos-de-pesca: rede-deespera, linha-de-mão e manzuá para lagosta. As características desses aparelhos estão descritas a seguir:

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(a) Rede-de-espera: é uma rede retangular disposta verticalmente na coluna d’água por meio de bóias na tralha superior e chumbadas na inferior. Pode ser de deriva ou fixa e atuar na superfície, meia água ou no fundo. O comprimento, a altura, o tamanho da malha, o número de bóias e de chumbadas variavam de acordo com a espécie a ser capturada. As embarcações que mais utilizavam a rede-de-espera foram o bote a remo, o paquete e a lancha, sendo o camarão e o camurupim as espécies mais capturadas. Para a captura de peixes de pequeno e médio porte a rede-de-espera utilizada possuía as seguintes características: tamanho da malha entre nós - 5,0 e 9,0 cm, diâmetro do fio poliamida (PA) monofilamento - 0,3 a 0,6 mm, número de bóias - 40 a 120, peso da chumbada - 3,0 a 8,0 kg. A rede utilizada na pesca do camarão apresentou as seguintes características: tamanho da malha entre nós - 5,0 e 6,0 cm, diâmetro do fio (PA) - 0,2 mm, número de bóias - 30 a 40, peso da chumbada - 1,0 a 3,0 kg. Na pesca do camurupim, a rede utilizada possuía um tamanho de malha entre nós de 25,0 a 30,0 cm, o diâmetro do fio (PA) variou entre 1,8 a 2,0 mm e uma garatéia de 15 kg para fixar a rede ao fundo.

(b) Linha-de-mão: é um petrecho que pode ser utilizado em pescarias de superfície (linha de corso) ou de fundo com o uso de chumbadas. O diâmetro do fio (PA), o número do anzol e o peso da chumbada variavam de acordo com o peixe a ser capturado. As embarcações que mais empregaram a linha-de-mão foram os paquetes e as jangadas. Em um estudo realizado por Castro e Silva (2004) no Estado do Ceará, foram observadas características semelhantes, em que, há uma grande variedade em termos do número do anzol (Nº 4 a 15), peso da chumbada (100 a 400 g) e diâmetro do fio (PA) (0,5 a 1,4 mm) utilizados na captura de várias espécies de peixe (sirigado, arabaiana, cavala, cioba, dentão, dourado, guaiúba, biquara, serra, garajuba, sapuruna, mariquita e cangulo).

(c) Manzuá para lagosta: é uma armadilha com formato hexagonal que possui uma abertura quadrada de 12,0 cm de cada lado. É construída de madeira (marmeleiro, ubaia, goiabinha, sipaúba ou mufumbo) e revestida com uma tela de poliamida monofilamento. A embarcação que mais empregou esse tipo de aparelho-de-pesca foi a lancha. Em um estudo realizado por Barroso et al. (2009) no município do Trairi , observou-se que para manter o manzuá fixo ao fundo são utilizadas duas garrafas de polipropileno preenchidas com areia. Cada garrafa é fixada na extremidade da armadilha em sentidos opostos.

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3.3 Técnicas de pesca

Nas pescarias, os pescadores utilizaram dois métodos de navegação: eletrônica ou visual. No método eletrônico, as embarcações que mais utilizavam esse tipo de equipamento eram as jangadas e as lanchas, por meio do Sistema de Posicionamento Global, mais conhecido como GPS. Esse sistema é disponibilizado por meio de um aparelho receptor móvel, que utiliza a navegação via satélite (Figura 9).

Figura 9 - Exemplo de um aparelho portátil de navegação eletrônica com o sistema de posicionamento global (GPS) utilizado pelos pescadores artesanais de Fortaleza/CE.

Segundo Peroni (2004), o GPS é um sofisticado sistema eletrônico de navegação, baseado em uma rede de satélites que permite a localização instantânea em qualquer ponto da Terra com alta precisão, utilizando o sistema de coordenadas geográficas como referencial. Esse sistema consiste basicamente de três partes: um complexo sistema de satélites orbitando ao redor da Terra, estações rastreadoras localizadas em diferentes pontos do globo terrestre e os receptores GPS nas mãos dos usuários. O GPS conta com 26 satélites orbitando a Terra a 20.000 km de altitude. Desse modo, a qualquer momento, pelo menos cinco satélites estarão disponíveis para o receptor de um usuário em qualquer ponto do mundo, sendo possível obter três coordenadas geográficas: (1) altitude: distância de um ponto, na vertical, ao nível do mar, (2) latitude: distância de um ponto na superfície da Terra em relação à sua origem (linha do Equador) e (3) longitude: distância de um ponto na superfície da Terra em relação à sua origem (o Meridiano de Greenwich).

27

No método visual, o pescador utilizava quatros pontos visíveis em terra, em que a marcação desses pontos é efetuada por meio de duas linhas de posição (caminho e assento). O caminho é alinhamento formado pelo os pontos fixos em terra (dois pontos), assim embarcação percorre em direção ao pesqueiro. No litoral de Fortaleza, geralmente são utilizados como pontos fixos as Serras (Maranguape, Serrinha, Serra do sul), os prédios e as antenas. O assento é o alinhamento entre o caminho que a embarcação percorreu e os pontos fixos em terra, em que o cruzamento das duas linhas de posição (caminho e assento), indica a localização do pesqueiro. Para confirmar essa localização, alguns mestres de botes a remo, paquetes e jangadas utilizavam um instrumento chamado de “sassanga”. Esse instrumento era constituído de uma linha poliamida, tendo em toda a sua extensão vários nós que estão dispostos a um intervalo de 1,5 m (uma braça - unidade de medida utilizada pelos pescadores), com a finalidade de medir a profundidade do local. Para identificar o tipo de substrato, uma chumbada preenchida com sabão é presa na extremidade do fio, que em contato com o fundo traz fragmentos do mesmo, permitindo sua identificação (Figura 10). Mar

Pesqueiro Caminho

Assento

Marcação Pontos fixos Terra

Pontos fixos

A

B

Figura 10 - Método de navegação visual (A) e instrumento utilizado para a confirmação do pesqueiro quanto à profundidade e tipo de substrato (“sassanga”) (B) utilizado pelos pescadores do município de Fortaleza/CE.

Quanto à estratégia adotada para a captura do pescado, foi observado que os pescadores que utilizam a linha-de-mão efetuam procedimentos em relação ao posicionamento da tripulação a bordo. Como se trata de uma pescaria individual, cada pescador, de acordo com a sua função na embarcação, possuía o seu local para pescar. Desse modo, foram observados cinco posicionamentos na embarcação: (1) popa à boreste da embarcação - proeiro (2) popa a bombordo da embarcação - mestre, (3) proa - bico de proa, (4) centro à boreste da embarcação - pescador de “cinco” e (5) centro a bombordo da embarcação - rebique de proa (Figura 11).

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Pescador de “cinco” Proeiro

Bico de proa

Rebique de proa

Mestre

Figura 11 - Posicionamento utilizado pelos pescadores nas pescarias de jangada com linha-de-mão no município de Fortaleza/CE.

Segundo os pescadores, o melhor posicionamento para pescar foi o da popa, tanto à boreste quanto a bombordo da embarcação, que são os locais ocupados pelo proeiro e pelo mestre, respectivamente. Como a embarcação era provida de um banco de governo na popa, a probabilidade da linha emaranhar-se em outras é pequena, o que favorece ao pescador utilizar uma maior quantidade de linhas, aumentando assim a probabilidade de capturar mais indivíduos. Os pescadores afirmaram ainda, que há uma maior possibilidade de capturar peixes de grande nessa posição. Os demais posicionamentos são menos favorecidos, devido ao constate emaranhamento das linhas, principalmente para o pescador posicionado no bico de proa, que era o local considerado como o mais desfavorecido dentre as demais posições. Somam-se a essas informações, um procedimento adotado pelos pescadores após a captura dos peixes, ilustrando o modo de organização dos mesmos. Desse modo, para identificar o peixe capturado, cada pescador fazia uma determinada marca no pescado, de acordo com a sua função na embarcação, sendo as seguintes (Figura 12):

(a) Mestre: nenhum corte é realizado (“rabo inteiro”). (b) Proeiro: corte na parte superior da nadadeira caudal (“rabo de cima”). (c) Bico de proa: corte na parte inferior da nadadeira caudal (“rabo de baixo”). (d) Rebique de proa: corte na parte superior e inferior da nadadeira caudal (“dois rabos”); (e) Pescador de “cinco”: corte na parte superior da cabeça (“cabeça de cima”). (f) Pescador de “seis”: corte na parte inferior da cabeça (“cabeça de baixo”).

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Mestre (“rabo inteiro”) Pescador de seis (“cabeça de baixo)

Rebique de proa (“dois rabos”)

Bico de proa (“rabo de baixo”) Pescador de cinco (“cabeça de cima”)

Proeiro (“rabo de cima”)

Figura 12 - Método de marcação do pescado adotado pelos pescadores do município de Fortaleza/CE.

3.5 Locais de desembarque

Na Barra do Ceará foram detectados dois locais de desembarque, sendo um próximo ao Rio Ceará, conhecido como Barra do Ceará e o outro na extremidade oposta do anterior, chamado de Goiabeiras. Na Barra do Ceará foram encontrados três trapiches (dois de madeira e um de alvenaria), onde ficam atracados os botes à vela e as lanchas motorizadas. Um dos trapiches de madeira é privado e o proprietário oferece poucas condições de trabalho para os donos das embarcações, dispondo de balança, acomodação do material de pesca e comercialização do pescado. Além disso, entre os dois trapiches de madeira foi observada uma grande descarga de águas servidas sem tratamento (Figura 13).

30

A

B Figura 13 - Vista parcial do trapiche (A) e do escoamento de águas servidas sem tratamento (B) na Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE.

No segundo local de desembarque (Goiabeiras) foi observado que o tipo de embarcação mais encontrado é o paquete. Nesse local, os pescadores tinham sido atingidos diretamente pela urbanização. No entanto, a Prefeitura possuía um projeto de revitalização da orla marítima da costa oeste de Fortaleza (Projeto Vila do Mar). Segundo os pescadores, esse projeto deveria fornecer suporte para a pesca local, com boxes para a venda do pescado e um pequeno local para consertos de embarcações. No entanto, as obras de infraestrutura para a pesca ainda não foram iniciadas e com a construção da nova via de acesso, o local onde os paquetes atracavam foi destruída, deixando-os em locais inapropriados (Figura 14).

31

A

B

C

Figura 14 - Vista parcial do local de desembarque dos paquetes (A) e da construção da via de acesso na orla (B), deslocando os paquetes para locais inapropriados (C) na Barra do Ceará, no município de Fortaleza/CE.

Em relação ao ponto de venda, o pescado é vendido de duas formas: (a) para o consumidor, em que a comercialização é realizada sob a via de pedestres, sendo a pesagem do pescado feita na balança dos próprios pescadores e (b) para o atravessador, em que parte da produção desembarcada era armazenada em uma caixa de fibra de vidro com destino à comercialização. Este local desprovido de infraestrutura possuía somente uma pequena fábrica de gelo, que comercializa o produto em grandes sacos de polipropileno, em que os pescadores adquiriam para conservar o pescado a bordo da embarcação. As espécies mais desembarcadas nessas localidades foram: a serra, a garajuba, o camurupim, a cavala, a sardinha e a lagosta.

32

No Pirambú, na localidade Marinha, foi encontrado um ponto de venda de pescado com 10 boxes, sendo seis ativos e quatro desativados. Dos seis ativos, cinco comercializavam pescado e um vende bebidas. Segundo informações obtidas no local, os boxes existem a 20 anos, cuja manutenção durante este período, foi realizada pelos proprietários, no entanto de forma inadequada. Esse fato pode ser constatado pelas más condições dos equipamentos. As balanças e os freezers estavam totalmente oxidados e a mesa de manipulação do pescado, feita de madeira, encontrava-se em péssima condição de higiene. Além disso, as condições sanitárias apresentavam-se impróprias, pois o único “banheiro” existente foi construído com pedaços de madeira amarradas a um tronco de coqueiro (Figura 15) e a presença de animais próximos ao pescado era constante.

A

B

C

Figura 15 - Vista parcial dos boxes (A), da mesa de manipulação (B) e do “banheiro” (C) no ponto de venda de pescado no Pirambú (localidade Marinha), no município de Fortaleza/CE.

33

No Mucuripe, o maior local de desembarque de pescado do município de Fortaleza, foi observado a existência de cinco locais de desembarque: bote a remo, boi moído, capatazia, porto dos botes e cais pesqueiro, assim chamados pelos pescadores. Nesses locais, embora sejam urbanizados, existiam vários pontos de águas servidas sem tratamento, que eram utilizadas pelos pescadores para lavar o pescado. As espécies mais desembarcadas nessa localidade foram: a pescada, o boca mole, a guaiúba, a carapitanga, a cavala, a mariquita, o camarão e a lagosta. A construção e o reparo das embarcações eram feitos ao ar livre, tanto sob as árvores existentes no local, quanto ao sol. A energia elétrica utilizada tinha origem nos dos boxes turísticos e dos boxes de venda de pescado. A água empregada pelos pescadores para a limpeza dos materiais de pesca pode ser obtida de três formas: cacimba, poço com auxilio de bombas d’água ou da Companhia de Água e Esgoto do ceará (CAGECE). O material de pesca era armazenado em caixas de madeira, que se encontravam em péssimo estado de conservação. A organização e confecção do material de pesca eram feitas na via de pedestres (Figuras 16 e 17).

A

B Figura 16 – Caracterização do local de desembarque no Mucuripe, município de Fortaleza/CE. (A) Cacimba e (B) bomba d’água utilizadas para lavar o material de pesca.

34

A

B Figura 17 - Caracterização do local de desembarque no Mucuripe, município de Fortaleza/CE. (A) Caixas para guardar o material de pesca e (B) rede sendo organizada.

Quanto à estrutura para a venda do pescado, foram observados aproximadamente 35 boxes, sendo 15 de madeira e 20 de alvenaria (Figura 18). Em relação às condições de higiene do pescado, alguns dos manipuladores não utilizavam luvas e toucas e o vestuário foi considerado inapropriado (uso de bermudas e chinelo). Para a entrada e saída dos manipuladores nos boxes não havia um pé-de-lúvio (local com germicida colocado nas áreas de produção, para a desinfecção dos calçados daquelas pessoas que ingressam no local de manipulação de produtos). No entanto, os boxes de alvenaria tinham condições sanitárias melhores do que os de madeira, pois atrás de cada boxe de alvenaria existia um guardavolume e um banheiro.

35

A

B Figura 18 - Vista parcial dos boxes de madeira (A) e alvenaria (B) para a venda de pescado no Mucuripe, no município de Fortaleza/CE.

Outra forma de comercialização do pescado desembarcado era realizada na areia da praia, local de intensa movimentação de pessoas, animais e da própria sujeira do local. Alguns pescadores expunham o pescado sobre pequenas lonas ou em contato direto com a areia da praia (Figura 19). Segundo os pescadores, essa forma de comercialização fornecia um melhor retorno financeiro, pois a venda era feita diretamente ao consumidor, ou seja, não existia a figura do atravessador. Entretanto, o consumidor adquiria um produto de baixa qualidade.

36

A

B Figura 19 - Comercialização do pescado no Mucuripe, no município de Fortaleza/CE. (A) Exposição sob a lona e (B) em contato direto com a areia da praia.

Apesar de ter sido observado que os locais de desembarque não possuíam uma infraestrutura adequada, 75% dos entrevistados afirmaram que são bons pontos de venda, pois conseguem realizar uma boa comercialização do pescado. Foi importante também observar que, nos últimos anos, os pescadores de Fortaleza perderam seu espaço físico em terra, provavelmente devido à urbanização da cidade e a exploração imobiliária desordenada. Segundo os pescadores, propostas de implementação de projetos (e.g construção de galpões e fornecimento de energia para os carpinteiros) já foram encaminhadas para os órgãos competentes, entretanto, até o presente momento, nenhum foi aprovado.

37

4 CONCLUSÃO

A pesca artesanal exercida no litoral cearense foi caracterizada como multiespecifíca, pois apresentou uma grande diversidade de embarcações, aparelhos-de-pesca e espécies capturadas, que são desembarcadas no munícipio de Fortaleza. Essa configuração conferiu à Fortaleza o terceiro lugar em volume de pescado desembarcado. No entanto, os locais de desembarque não apresentaram uma infraestrutura adequada, cujo o atual quadro é de completo abandono, pela falta de administração e desinteresse por parte do poder público e dos próprios pescadores. Nesse contexto, algumas ações podem ser realizadas para melhorar a cadeia produtiva de pescado, como por exemplo: reestruturação física dos pontos de venda do pescado, para o fornecimento de produtos com adequadas condições de higiene e capacitação dos pescadores e vendedores, para a melhoria da qualidade de vida dos mesmos.

38

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Monitoramento da atividade pesqueira no litoral nordestino. Tamandaré, PE: IBAMA, 2008. 385p.

CARDOSO, E. S. Pescadores artesanais: natureza, território, movimento social. 2001. 143 f. Tese (Doutorado em Geografia Física) – Departamento de Geografia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001.

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39

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PAIVA, M. P. Administração Pesqueira no Brasil. Rio de Janeiro: Interciência, 2004. 177p.

PERONI, R. L. Apostila 4: fundamentos de GPS. Paracatu: FINOM, 2004. 37p. Disponível em: Acesso em: 16 dez. 2010.

BONI, V.; QUARESMA, S. J. Aprendendo a entrevistar: como fazer entrevistas em ciências sociais. Revista eletrônica dos pós-graduandos em sociologia política da UFSC, Florianópolis, v. 2, n. 1, p. 68-80, 2005.

RODRIGUES, R. A; MAIA, L. P. Caracterização sócio-econômica das comunidades de pescadores do município de Aquiraz. Arquivo de Ciências do Mar, Fortaleza, v. 40, n. 1, p. 16-23, 2007.

40

APÊNDICE

Questionário não estruturado aplicado aos mestres de embarcação no munícipio de Fortaleza

1. Nome: _____________________________________________________ 2. Tipo de embarcação:____________________

Idade:______

Número de tripulantes:______

3. Quanto ao pesqueiro: (a) Qual método de navegação é utilizado para chegar ao pesqueiro? Descreva. (b) Quanto tempo leva-se para chegar ao pesqueiro? (c) Como se sabe que é o pesqueiro certo? (d) Quais são os nomes dos pesqueiros? 4. Quanto aos aparelhos-de-pesca: (a) Quais aparelhos-de-pesca são utilizados nas pescarias? (b) Caracterizar as partes de cada aparelho-de-pesca: diâmetro da linha; quantidade de anzóis; peso e localização da chumbada; tamanho da malha da rede; comprimento da rede; posição da rede; número de boias. (c) Quais espécies são capturadas? 5. O Pescado é marcado? Como é feita a marcação? 6. Em qual a posição os pescadores ficam sobre a embarcação? Por quê? 7. Como é feita a conservação do pescado? 8. Como é feita a alimentação e a dormida quando se está no mar? 9. Quanto as condições dos locais de desembarque: (a) Adequado? Sim ou não? (b) O que acha da estrutura física? (c) Tem água? (d) Tem balança? (e) Tem câmara frigorífica? (f) Tem freezer? (g) Tem energia? 10. O que você acha da urbanização? Afetou na pescaria?

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