Jefferson C. Boechat

O estado do desenvolvimento e o desenvolvimento do Estado: lições do passado imediato para o futuro imediato. “O cientista político argentino Guillermo O´Donnel afirma que em seu país ‘o Estado acabou’. Isso explica a forma espontânea com que se desenrolaram as manifestações de rua, sem que existam sindicatos ou partidos que comandem os protestos. O Estado, diz ele, é historicamente para a sociedade uma referência de organização e de ordem. Mas, nos últimos 25 anos, as elites que governaram a Argentina se empenharam no desmonte das instituições oficiais. A sociedade, sem interlocutores, passou então a dialogar de maneira dispersa com fragmentos da antiga autoridade estatal. Nas últimas horas, diante do palácio presidencial, em Buenos Aires, manifestantes entram em confronto com a polícia. Um fragmento de Estado está presente. Mas nas periferias da cidade,(...) a mesma polícia autoriza saques a supermercados e pede, em troca, que os saqueadores dividam os mantimentos saqueados com ela...”1

P

ara aqueles que militam tanto no campo do Desenvolvimento Econômico, como no da Administração Pública, no Brasil, a assertiva do

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Folha de S. Paulo, Caderno Especial, 21 de dezembro de 2001, grifo nosso.

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professor argentino da Universidade de Notre Dame tem a terrível propriedade de ser uma verdade dolorosamente auto-evidente. Lamentavelmente, a discussão sobre o papel do Estado no desenvolvimento econômico no Terceiro Mundo ficou emudecida graças à unanimidade Rodriguesiana que se formou em torno do famigerado Consenso de Washington. Infelizmente, para os países ao sul do Equador, as reformas propostas pelas instituições de Bretton Woods não diferenciaram entre os vários papéis que o Estado desempenhava na esfera econômica do mundo em desenvolvimento. Assim, as oligarquias nacionais, que nesses países são as eternas responsáveis pelos ciclos de modernização conservadora, no afã de sua busca incessante por rendas econômicas geradas a partir da usurpação secular do poder estatal, optaram por implementar um pacote de reformas centrado, acriticamente, no tripé privatização, liberalização comercial e desregulamentação, que acabou desprovendo o aparelho estatal de sua principal capacidade operativa: a de planejar e implementar políticas públicas que, como veremos ao fim deste documento, complementam-se sinergicamente numa economia de mercado dando, a um país, uma certa trajetória de desenvolvimento. Sintomaticamente, no Brasil, este movimento iniciou-se ainda antes mesmo da formação do mencionado consenso, e materializou-se, como política pública, ainda ao final do governo de José Sarney, com a publicamente declarada “Operação Desmonte”. Desde então, o que se viu nos governos que lhe seguiram foi o aprofundamento sistemático daquele desiderato, não como opção de política, mas como uma forma historicamente determinada de não-política, dada a recorrente ameaça de colapso dos canais tradicionais de financiamento do setor público. De certa forma, a tragédia argentina vem anunciar ao mundo em desenvolvimento, ainda que com uma defasagem temporal de cerca 10

de cinco anos em relação ao “centro”, que o Consenso efetivamente falhou.2 O que deve vir depois é, uma vez mais, outro esforço de reconstrução econômica que recolocará a questão do papel do Estado no centro das discussões políticas e acadêmicas, e que exigirá das classes governantes uma “reforma da reforma” do aparelho estatal, a um custo social muito superior ao que seria originalmente necessário não tivesse sido a máquina “desmontada”. Como já se deveria saber de Lênin, e do socialismo real, o passo que se dá para frente, imediatamente após ter-se dado outro para trás, não só é crescentemente mais custoso como indica que a ação coletiva está, ciclotimicamente, fazendo-se no sentido contrário ao que seria desejado isoladamente por cada um de seus elementos constitutivos. Se o termo subdesenvolvimento tem algum sentido prático, este é um deles.

A QUESTÃO DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: 50 ANOS DE TEORIZAÇÃO! Na publicação Frontiers of Development Economics, editada pelo Banco Mundial em 2001, os economistas Gerald Meier e Irma Adelman fazem duas instigantes resenhas dos últimos cinqüenta anos de elaboração científica no campo do desenvolvimento econômico. Neste “longo ciclo de Kondratieff”, 2

A ironia amarga aqui é o fato de que o próprio Banco Mundial já reconhecera as deficiências do Consenso de Washington seis anos antes desta prova empírica, quando da publicação do Relatório de Desenvolvimento Mundial de 1997. Curiosamente, este documento não surtiu qualquer impacto visível nas ações da corrente do “pensamento único” que dominou a formulação de políticas públicas no Brasil desde o início da década de noventa, ainda que saibamos que nossos principais policymakers tenham, todos, dele tomado conhecimento.

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nos ensinam, conviveram três gerações de teóricos cujo pensamento descrevemos, sintetizando os autores, a seguir. A primeira geração, surgida logo após a Segunda Guerra Mundial, teve como missão reinventar o campo de conhecimento como instrumento de reconstrução acelerada das nações destruídas pelo conflito. Para aqueles economistas, o importante era formular grandes modelos que conseguissem capturar, e concatenar, as principais variáveis que, para eles, seriam responsáveis pela acumulação de riqueza. Neste sentido, desenvolveram-se as técnicas de planejamento e programação econômica que deveriam operacionalizar fórmulas abstratas, tais como a desenvolvida por Solow.3 Uma questão fundamental a ser resolvida é a do tratamento dos fenômenos característicos do subdesenvolvimento, as chamadas “falhas de mercado”, e que acabou por marcar indelevelmente o seu receituário de políticas. Modelos sucessivos, como os de Rostow, Nurkse, Rosentein-Rodan, Prebisch-MyrdalSinger, Leibenstein, e Chenery, levaram este grupo a concluir que: 1) A industrialização seria a força dinâmica que levaria à aceleração do crescimento econômico, visto pelos teóricos da primeira geração como mera acumulação de estoque de capital, graças à massificação do consumo de bens duráveis e não-duráveis por parte de uma população que apresentava uma enorme demanda potencial por tais produtos, dada a repressão do consumo verificada no período de beligerância em que os recursos econômicos se realocaram para a produção de bens de guerra e que; 3

Em seu modelo, uma derivação direta de uma função produção do tipo Y = F(K, L, t), o processo de crescimento do produto Y se dava pelo que hoje se chamaria de combinação sinérgica, no tempo (t), de dois fatores de produção, Capital (K) e Trabalho (L) que resultava, além do próprio crescimento do estoque de ambos, na formação de um “resíduo”, conhecido no jargão econômico como Produtividade Total dos Fatores, e por ele assumido como sendo progresso técnico.

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2) A principal instituição que funcionava como vetor de aceleração do processo de acumulação de riqueza na economia capitalista, o mercado, não era suficientemente desenvolvido nos países periféricos para assumir o papel que desempenhava nos países desenvolvidos. As principais falhas de mercado percebidas por esses estudiosos eram: sistema de preços ineficiente, insipiente capacidade empresarial, deficiências estruturais abrangentes, tais como: rigidez social, defasagens e inadequações na incorporação de tecnologia, baixa elasticidade de oferta e demanda, inflação crônica (estrutural) e pessimismo externo. Assim sendo, não haveria outro agente econômico capacitado a liderar o esperado rápido processo de crescimento econômico que não o próprio Estado. Logo, formou-se um consenso de que o poder político estatal deveria ser utilizado para coordenar a mobilização e alocação dos recursos que se fizessem necessários ao processo de alavancagem da acumulação capitalista, levando até a que o Estado se tornasse, em algumas situações, ele mesmo, agente semi-autônomo de uma grande empreitada industrializante4. Mas, se, para a primeira geração, a não-completude do mercado era o maior obstáculo a ser superado, e as variáveis fundamentais a serem manipuladas eram, todas, macroeconômicas, isto é, os três preços fundamentais da economia: do capital (juros diferenciados), do trabalho (salário real deprimido), e das importações (câmbio múltiplo), já muito cedo no processo de implementação das políticas econômicas embasadas nesta visão, uma segunda geração de estudiosos do desenvolvimento se pôs a estudar, segundo a ótica dos pressupostos neoclássicos, as implicações microeconômicas - ao 4

Vê-se, assim, que a opção pelo Estado não foi de caráter ideológico mas, sim, pragmático.

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nível do projeto individual efetivamente implantado - desta macroestratégia de transformação estrutural das economias subdesenvolvidas, a fim de medir possíveis distorções econômicas. Ora, como seria apenas razoável esperar, tais estudos de fato verificaram inúmeras “distorções” que imputavam derivar de políticas públicas “totalmente equivocadas”. Tais falhas, que chegaram a ser assumidas por alguns economistas da primeira geração como intrínsecas ao exercício de planejamento econômico, foram denominadas “falhas de governo” porque ocasionadas pela intervenção direta do Estado no domínio econômico. O receituário deste grupo é expresso, sucinto e precisamente, pelo slogan Get the Prices Right, ou Acerte os Preços, e foi brandido pelo grupo durante boa parte da década de oitenta, sendo assim precursor do próprio Consenso no que tocava ao alinhamento dos preços domésticos aos preços internacionais, a ser conseguido através da liberação dos fluxos de comércio, e da privatização do aparelho (im)produtivo estatal. Curiosamente, na mesma medida em que a segunda geração escrutinava as propostas de cunho macroestratégico da primeira, um terceiro grupo se dedicava a usar o mesmo arsenal metodológico, i.e. a microeconomia neoclássica, para dissecar a fundo aquela instituição que, supunha a segunda geração, havia sido vilipendiada pela primeira: o mercado. Suas descobertas resgatam uma tradição escolástica cuja origem está ainda na década de trinta, nos escritos de economistas como Ronald Coase, Frank Hahn, entre outros, e acabam por gerar o que hoje se conhece como Nova Economia Institucional.5 Segundo esta tradição, o mercado não é uma instituição 5s

Douglass North, Nobel de 91, é um dos maiores expoentes desta escola atualmente.

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adequada para a produção de todo e qualquer bem, vez que abriga dentro de si falhas incorrigíveis derivadas principalmente de assimetrias de informação, que se formam, e se reproduzem, dinamicamente na interação econômica cotidiana e futura.6 Essas novas falhas de mercado, por seu turno, trazem de volta ao centro do debate o Estado como agente catalisador e garantidor de última instância do funcionamento satisfatório do mercado, mesmo ali onde ele já seja considerado uma instituição madura.7 Surge, então, o Estado Regulador que não mais “deixa fazer”, como no caso do liberalismo clássico, ou que “manda fazer”, como no socialismo real, mas que “induz a fazer” o que deve ser feito pelos agentes para manter, ou colocar, uma nação na trajetória de desenvolvimento desejada, através da aplicação seletiva de sanções e incentivos econômicos, diretos e indiretos. O novo mantra do desenvolvimento passa, assim, a ser: Get Institutions Right, ou Acerte as Instituições. Mercado e Estado são, mais uma 6

De fato, o mercado sequer produz mercadorias. Essas, segundo Coase, só se realizam para o mundo graças à existência de instituições extramercado, as firmas, que são, para Oliver Williamson, “hierarquias” - a diferença entre mercado e hierarquia está no fato de que, no primeiro, os agentes econômicos estão em pé de igualdade no ato do contrato de uma transação e, na segunda, o contrato se dá antes da transação ser concluída, como na efetiva troca de força de trabalho por remuneração, no exemplo de Louis Putterman. Nesta tradição, as hierarquias existem exatamente para internalizar “custos de transação”, como os incorridos na mobilização dos fatores de produção, que se tornariam incontroláveis se “administrados” pelo mercado. 7 Vale lembrar aqui que o processo de estatização não foi exclusivo dos late-late comers, como Brasil e Índia, mas que se deu também de forma bastante abrangente na Europa pós-guerra. A Inglaterra, para dar um exemplo hoje quase esquecido, só privatizou o seu setor energético na década de oitenta – e até nisso foi sui generis, pois que o Estado manteve em suas mãos a poderosíssima Golden Share (Ação de Ouro), com a qual pode intervir nos Conselhos de Direção, sem “desprivatizar” as empresas.

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vez, consideradas instituições complementares, em que o primeiro é tão mais eficiente quanto melhor regulado pelo segundo.

AS TRÊS FALÁCIAS DA TEORIA DO DESENVOLVIMENTO E SEUS IMPACTOS NA REALIDADE. Na sua busca desesperada por explicações operacionalizáveis para um fenômeno tão pouco afeito à domesticação metodológica, os estudiosos do desenvolvimento acabaram por cair numa armadilha muito comum ao trabalho investigativo acadêmico: o reducionismo supersimplificador. A partir dos trabalhos iniciais de Solow, Harrod-Domar, Arrow e outros, formaram-se três falácias que iludiram todas as gerações de economistas que se seguiram. Elas são:

1) O SUBDESENVOLVIMENTO TEM UMA ÚNICA CAUSA Esta foi a principal razão pela qual o paradigma da Teoria do Desenvolvimento mudou tanto neste meio século. Em termos práticos, tal idéia significou o desvio de esforços no sentido da busca por uma única falha – “X” - que, ao se verificar em todos os casos estudados, fosse corrigida por um único remédio, também universal. A primeira dessas falhas, eleita ainda na década de quarenta era o capital físico. Foi esta a fonte inspiradora do Plano Marshall, por exemplo. O diagnóstico era simples e a solução perfeitamente operacionalizável: faltava capital na periferia do sistema. Bastaria que os países centrais replicassem no Terceiro Mundo a mesma receita utilizada para recuperar as economias européias destruídas pela Segunda Guerra Mundial, que a taxa de poupança interna 16

se elevaria rapidamente 8. Sintomaticamente, ali onde foi implementada, esta solução não funcionou porque os “projetos de desenvolvimento”, principalmente grandes obras de infraestrutura econômica, causaram desequilíbrios macroeconômicos nos países receptores na forma apontada pela crítica neoclássica. Em verdade, dois foram os erros cometidos: em primeiro lugar, as técnicas de avaliação microeconômica dos projetos não levaram em conta o impacto global (macroeconômico) dos investimentos feitos naqueles países; em segundo, não houve preocupação em se criar “encadeamento para frente e para trás” na indústria. Assim, os pólos, ao invés de criar externalidades positivas crescentes, à Perroux, tornaram-se verdadeiras ilhas de prosperidade em oceanos de pobreza. Por outro lado, em países que já tinham alguma infra-estrutura anterior à chegada da ajuda financeira, tal estratégia funcionou exatamente pela mesma razão que funcionara no caso europeu: existência de enorme demanda reprimida por bens de consumo. Ademais, essas economias, como Brasil, Argentina, México, Malásia e Coréia passaram rapidamente de recipientes de ajuda externa para captadoras de investimento estrangeiro direto, o que efetivamente as integrou à planta industrial do capitalismo internacional. Já ao final da década de cinqüenta, os economistas engajados nos projetos de desenvolvimento perceberam que a aplicação volumosa de capital externo, tanto na forma de ajuda, como de investimento direto, não era suficiente para criar um círculo virtuoso de crescimento nas economias receptoras, através do investimento derivado, porque não havia uma classe empresarial bem desenvolvida, que se dispusesse a correr os riscos típicos da atividade capitalista, especialmente porque os 8

Vale notar que a taxa que, segundo W.W. Rostow, seria necessária e suficiente para a “decolagem” era de algo no entorno de 15% do PIB.

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incentivos econômicos proporcionados pela inflação crônica, pelas altas taxas reais de juros, e pela excessiva proteção ao produto doméstico, desenvolviam na classe empresarial local um comportamento puramente rentista. Esta foi a segunda falha apontada como “culpada” pelo subdesenvolvimento. A terceira falha foi verificada, no campo, a partir do início da década de setenta, por missões da Organização Internacional do Trabalho que visitavam os países receptores da ajuda internacional para medir o seu impacto sobre a estrutura de emprego. A conclusão a que chegaram é que as altas taxas de crescimento do produto escondiam uma distribuição altamente desigual nos rendimentos do trabalho que se consubstanciavam numa taxa de desemprego altíssima entre os trabalhadores com menor índice de instrução, e em salários reais baixíssimos para esta classe de despossuídos. A causa disso era uma grave distorção na estrutura interna de preços relativos em favor de bens industriais e agrícolas exportáveis que, obviamente, encontravam-se fora da cesta de produção e consumos daqueles trabalhadores. A variante que adotou este diagnóstico tinha no comércio internacional a quarta falha como responsável pelo subdesenvolvimento. O principal problema estava, na visão dos economistas neoclássicos que lhe deram forma, no próprio governo, que ao incentivar artificialmente a produção de bens exportáveis desviava recursos para os setores privilegiados em detrimento do resto da economia. A uma fusão das duas últimas visões é que devemos a abertura radical das economias periféricas, ocorrida, mais ou menos sincronicamente, a partir de meados da década de oitenta.9 A disputa aqui não se deu sobre a relevância do comércio 9

O Brasil começou a sua abertura comercial ainda ao final do governo Sarney, em 1988, com uma reforma tarifária implementada pela antiga Comissão de Política Aduaneira do Ministério da Fazenda.

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internacional para a trajetória de crescimento da economia, mas dos mecanismos de suporte que ela deveria ter, como proteção à indústria nascente, e seletividade na política de exportações, para que tal trajetória tivesse sustentabilidade. Infelizmente, as condições de conjuntura político-econômica em que se deu a abertura soterraram as críticas quanto ao “como fazer”. A quinta causa do atraso relativo da periferia cristaliza-se com uma extrapolação desta última assertiva. O governo nos países subdesenvolvidos é ruim porque intervém desinformadamente na economia, ocasionando males que lhes são típicos, como inflação, corrupção, deficiências crônicas na infra-estrutura sócio-econômica, e instabilidade/fragilidade institucional generalizada.10 A solução? Menos “mau governo”, ora. Como fazê-lo? Desregulando e privatizando, bolas! A ausência de capital humano foi penúltima falha a ser “detectada”.11 A teoria, baseada em estudos empíricos de Romer e Lucas, no final dos oitenta, propugna simplesmente que a trajetória de desenvolvimento é derivada do estoque de conhecimento acumulado pela população de um país. Quão maior aquele estoque, mais rápida a taxa de crescimento do produto. Ainda que robusta do ponto de vista econométrico, esta tese tem dois defeitos principais, no que toca o seu aspecto de operacionalidade: aposta na utilização de mercado internacional como vetor do crescimento, e desconsidera os custos de construção do edifício institucional necessário para sua alavancagem. Lamentavelmente, nem os recursos políticos, econômicos, 10

Vale lembrar aqui que o mercado é uma instituição social e historicamente determinada. 11 Em verdade ela é “inventada” no fim da década de cinqüenta para explicar porque os Estados Unidos tinham uma vantagem comparativa revelada em bens intensivos em trabalho, e não capital. Tal fenômeno ficou conhecido na literatura como “Paradoxo de Leontief”.

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culturais e sociais estão facilmente disponíveis nos países em desenvolvimento para que se construam as instituições que catalisam o crescimento econômico, nem o mercado internacional é perfeito a ponto de permitir a substituição pacífica de produtores estabelecidos que se tornaram menos eficientes do que seus concorrentes da periferia.12 Por fim, e aqui residirá nosso maior interesse, o Banco Mundial aponta, em seu Relatório de 1997, o governo ineficaz como principal causa do subdesenvolvimento. Chegou-se a tal conclusão por três razões fáticas: 1) os estados latino-americanos, devidamente desmontados, não conseguiram manter as altas taxas de crescimento verificadas no Leste Asiático, onde o estado continuava governando o mercado; 2) os países centrais reagiram contra o exacerbado conservadorismo das reformas implementadas pela dupla Thatcher/ Reagan, e começaram a fazer a “reforma da reforma”, elegendo governos democratas nos Estados Unidos e social-democratas na Europa; e 3) o colapso mesmo das estruturas sócio-econômicas dos países latino-americanos levou os técnicos do Banco a concluir que os governos não se poderiam retirar da produção de bens públicos essenciais ao funcionamento do mercado. Como dissemos, tal conclusão é da maior relevância para qualquer governo reformista, e será abordado com mais detalhe ao fim deste artigo.

2) UM CRITÉRIO ÚNICO É SUFICIENTE PARA AVALIAR O GRAU DE DESENVOLVIMENTO DE UM PAÍS

Esta falácia é facilmente compreendida se nos lembrarmos de que, até muito recentemente, a principal variável econômica tida 12

A polêmica proteção dispensada aos produtores americanos de aço é uma demonstração cabal disto.

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como número-síntese do grau de desenvolvimento de um país era o PIB per capita, geralmente expresso em dólares americanos nominais. Foi graças ao trabalho desbravador de Amartya Sen que os economistas começaram a entender que as distâncias entre as realidades econômicas das nações não podiam ser subsumidas numa única expressão de caráter meramente monetário que, ademais, só conseguia captar o nível potencial de elevação do bem-estar da maior parte da população, e não como a sociedade realmente explora tal potencial. Surge, assim, o Índice de Desenvolvimento Humano, calculado regularmente pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), que é o primeiro indicador a expressar a já mencionada multidimensionalidade do processo de desenvolvimento.13

3) O DESENVOLVIMENTO É UM PROCESSO LINEAR Tal idéia, errônea, sedimentou-se a partir da formulação de Solow em que, como já se disse, a elevação do estoque de fatores de produção é igualada a crescimento que, por sua vez, “queria dizer” desenvolvimento, à época de sua concepção. Apesar de sua inegável validade como instrumento de compreensão do problema, a extrema simplicidade da equação de Solow acabou por gerar vários corolários equivocados. Entre eles, destacam-se as idéias de que: 1) as condições iniciais não importam (para a trajetória futura do desenvolvimento); 2) os estágios não importam (para a mesma trajetória); 3) não existe path dependence (imbricação histórico-funcional dos estágios), e que, portanto, 4) o 13

O Índice de Desenvolvimento Humano considera, além da renda real per capita, os níveis de educação, e expectativa de vida ao nascer como parâmetros de mensuração do fenômeno.

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receituário de políticas é universal, e atemporal. A política de ajuste estrutural nos imposta pelo FMI é um legítimo (bebê de Rosemary) gerado pela aplicação acrítica e burocrática de tais equívocos.14 Quatro também são as conclusões a que chegaram os teóricos a partir de 1997: 1) que o processo de desenvolvimento é altamente não-linear; 2) que as trajetórias são singulares; 3) que as condições iniciais formatam a trajetória futura; e, 4) que a trajetória é flexível. De (1), temos que o processo não é facilmente descrito por modelos matemáticos necessariamente supersimplificadores. De (2) pode-se concluir que o processo é determinado historicamente. Conseqüentemente, tal como a história, a trajetória de desenvolvimento é única para cada país. A partir de (3) inferimos que as capacidades institucionais de uma nação, tal como o nível educacional de sua população, o nível de autonomia política do seu governo, e a distribuição relativa de riqueza, existentes num dado momento, condicionam o seu desenvolvimento futuro. Ou seja, são essas capacidades que determinam a Economia Política do Desenvolvimento. Por fim, concluímos que a trajetória de desenvolvimento não é nem fixa, nem “automatizável”. Isto é, ela depende fundamentalmente das políticas que têm que se alterar - regular, e consistentemente - segundo os princípios básicos do planejamento estratégico.

O “ESTADO DESENVOLVIMENTISTA” NO SÉCULO XXI: FORMA E FUNÇÃO. Em monografia intitulada Estado, Gobernabilidad, y Desarollo, publicada em 1993 pelo Banco Interamericano de 14

Para uma análise crítica de tais políticas, ver Killick, na lista bibliográfica.

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Desenvolvimento, o cientista político Luciano Tomassini constata que “...los países latinoamericanos están percibiendo cada vez más que el problema de la gobernabilidad constituye la principal amenaza que enfrentan sus procesos de desarrollo político y económico”. Ademais, nos ensina que “...desde un punto de vista sustantivo, ...el buen gobierno, comenzando por sus responsabilidades económicas, depende de la gobernabilidad de la sociedad en su conjunto y ésta, a su vez, de las relaciones entre el Estado, por una parte, y la cultura cívica, la economia y los setores sociales por la otra.” Do acima exposto, tem-se que a trajetória de desenvolvimento de um país dependerá, fundamentalmente, das condições de contorno de sua governabilidade. E essas, segundo o mesmo autor, confinam-se dentro de uma arquitetura de “três círculos concêntricos”. No primeiro, mais central, estão a eficiência, a previsibilidade, a honestidade, a transparência e a responsabilidade do setor econômico do governo, que são os requisitos mínimos para o Estado ter a capacidade de fazer uma economia de mercado funcionar eficazmente. O segundo círculo abarca as condições necessárias para que o Estado possa lidar com a sociedade em seu conjunto, que são, basicamente, a manutenção do estado de direito, a legalidade da ação pública, a eleição do regime político, o governo central, a função legislativa, a administração da justiça, a administração urbana, a gestão dos interesses regionais e locais, a segurança pública e o controle do terrorismo. Por fim, temos no terceiro círculo, mais externo, as condições que garantem ao governo o consenso necessário, entre Estado e sociedade civil, para que aquele desempenhe, de forma legítima, estável e eficiente, as suas funções. Se, nas duas primeiras, a questão principal é o fortalecimento das capacidades estatais para desempenho de suas funções primordiais, nesta última instância, o importante é o desenvolvimento de instituições 23

não-estatais que possam com aquele dialogar com o objetivo de gerar consenso a respeito da produção de bens públicos e semipúblicos, no conhecido problema da ação coletiva.15 Nossa preocupação nessas páginas finais é descrever os aspectos institucionais que garantam ao Estado o gerenciamento adequado daquelas variáveis constantes nos três círculos. Como já se disse anteriormente, o aparelho estatal é, como toda organização humana, uma hierarquia, e como tal deve ser estruturada.15 Neste sentido, o WDR/97, nos dá não só a estratégia que deve ser seguida por países que se propõe a fazer um reforma do aparelho estatal no sentido de alavancar as mencionadas capacidades, como também nos aponta que mecanismos devem ser usados para tal. Como a seguir. Para que a reforma seja bem-sucedida, sugere-se que se implemente uma estratégia em dois movimentos: 1) focar as atividades estatais segundo sua capacidade [operacional]; 2) Criar as condições que garantam, no tempo, a alavancagem daquela capacidade, através do revigoramento das instituições públicas. Em bom português isto significa que, para reformar o Estado, 15

Note-se que tanto as referidas funções estatais, como o papel das instituições não-estatais, mudam ao longo do histórico de desenvolvimento de uma nação. 15 Em “Beyond the Washington Consensus. Institutions Matter”, o staff do Banco Mundial, apud Williamson, define os dois mecanismos de coordenação entre agentes econômicos, no capitalismo, da seguinte forma – mercados: são um conjunto de instituições (regras e seus mecanismos de aplicação [enforcement] que delimita o campo onde se conduzem transações discretas e impessoais, sem a necessidade de uma relação contratual contínua; hierarquias: conjunto de regras que delimita as transações balizadas pela verticalidade na autoridade decisória (...hierarquias estabelecem obrigações contratuais a fim de se produzirem bens e serviços a um custo de transação e monitoramento mais baixo do que o requerido para transações puras de mercado.) (tradução do autor)

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para que desempenhe o novo papel de catalisador do desenvolvimento tem-se que, primeiro, fazer aquilo que se pode fazer. E, segundo, preparar-se para aquilo que se tem que fazer. No caso do Brasil, infelizmente, desde o fim da ditadura militar, aborta-se a reforma ainda na primeira fase, e o governo fica mais frágil a cada ciclo de alternância, o que demandará de um governo que se queira reformista uma capacidade de planejamento e mobilização rápida de recursos que já não se encontram no edifício de nosso Estado. Voltamos a este ponto mais tarde. Mas, surpreendentemente, o Banco vai ainda mais longe, e parametriza a reforma. Diz o seu staff: ao focar a sua capacidade nos fundamentos da boa governança, o Estado deve garantir que a sua cidadania goze de um conjunto mínimo de direitos que contenha: 1) estabelecer o “império da lei”; 2) implementar uma política econômica não-discriminatória, preservando a estabilidade macroeconômica; 3) investir em infra-estrutura social básica; 4) proteger os mais vulneráveis; e 5) proteger o meio-ambiente, tendo como princípio axiológico central a idéia de que “as políticas públicas não devem objetivar tão-somente o crescimento, mas garantir que os benefícios derivados do crescimento impulsionado pelo mercado sejam compartilhados por todos através do investimento em educação e saúde.” Isto feito, o Estado deve iniciar a execução do segundo movimento, que é o de revigoramento da sua capacidade operacional, conseguida através da provisão de incentivos ao melhor desempenho dos funcionários públicos, e de sanções que coíbam ações arbitrárias [e ilegais] por parte desses. Para tal, deve-se implementar, de maneira rigorosa, um conjunto de regras e sanções efetivas para a ação estatal; aumentar a pressão competitiva sobre o Estado; dar mais voz à cidadania e estabelecer parcerias entre Estado e organizações públicas nãoestatais. 25

Como se vê, convergem as visões de Tomassini e do Banco no sentido de que a questão fundamental é reestruturar os dois círculos mais internos do esquema pictórico proposto pelo primeiro. Para tanto, é condição necessária e suficiente que, na visão daquela instituição, estabeleça-se, no aparelho de Estado, mecanismos que garantam um aumento na pressão competitiva na hierarquia estatal através de um sistema de recrutamento, seleção, promoção, e remuneração baseado, única e exclusivamente, no mérito. No caso do terceiro círculo, tal pressão seria também elevada através da concorrência, na provisão de bens e serviços públicos e semipúblicos, entre instituições públicas estatais e não-estatais, segundo o critério de menor custo efetivo.17 Por fim, podemos tentar traduzir este conjunto de idéias à prática cotidiana da governança no caso do Brasil. Num esquema sucinto, teríamos no primeiro movimento, uma reforma na arquitetura ministerial para privilegiar aquelas funções estatais que se alinhassem estrategicamente com o plano de governo. Não faz sentido fazerem-se previsões neste exercício. Mas, podese intuir que certos ministérios desapareceriam, e o peso político específico entre os que ficassem seria redistribuído segundo o novo eixo de desenvolvimento. Ainda neste mesmo movimento, implementar-se-ia a parte do segundo que se refere à própria arquitetura de governança do Estado. Isto seria feito através da eliminação dos cargos de livre provimento da linha de comando e controle abaixo das funções de Ministro e Secretário de Estado, e seus respectivos assessores diretos, a fim de se separar o nível estratégico dos níveis tático e operacional da organização estatal. Nesses, a profissionalização seria estrita, e os critérios de promoção universais e impessoais, privilegiando-se, sempre, o mérito individual. 17

A referência aqui seria “Reinventing Government”, de Gabler e Osborne.

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As questões cruciais para o sucesso de uma reforma deste tipo, no Brasil, são o timing de sua deflagração, o quantum de força política acumulada por seus defensores durante os ciclos político-eleitorais que antecedem a sua implementação, além do consenso, forjado no âmbito do partido, ou da coalizão vendedora, de se romper com a tradição perversa da prática clientelista que orienta a ação do poder executivo, configurada num dilema de prisioneiro clássico, na função de governar este país. Infelizmente, tanto o momento histórico, que se quer, nas palavras do presidente do Partido dos Trabalhadores, de “mudança sem ruptura”, quanto a marcante fragilidade institucional da Política (Polity) Nacional, nesta longa transição rumo a um Estado Democrático pleno, conspiram contra este desiderato. E, assim, confirmando o frio e duro vaticínio de Claude Levy-Strauss, o Brasil vai ficando irremediavelmente obsoleto antes mesmo de ficar pronto.

BIBLIOGRAFIA BARRO, Robert J, 1997. “Getting It Right, Markets and Choices in a Free Society”. Cambridge. The MIT Press. BARRO, Robert J, 1998. “Determinants of Economic Growth – A Cross-Country Empirical Study”. Cambridge. The MIT Press. BURKI, Shahid J, and Guillermo E. Perry. 1998. “Beyond the Washington Consensus: Institutions Matter”. World Bank. Washington, DC. CHENERY. Hollis, and T. N. Srinivasan (eds). 1989 Handbook of Development Economics, Volumes 1 e 2. Amsterdam. Elsevier. COASE, Ronald H. 1988. “The Firm, The Market, And The Law”. Chicago. The University of Chicago Press. 27

KILLICK, Tony. 1995. “IMF Programmes in Developing Countries, design and impact. London. Routledge. MEIER, Gerald M. and Dudley Seers (eds). 1985. Pioneers in Development”. NY. Oxford University Press. MEIER, Gerald M. and Joseph Stiglitz (eds). 2001. Frontiers of Development Economics, the future in perspective. NY. Oxford University Press. NORTH. Douglass. 1990. “Instituions, Institutional Change and Economic Performance”. Cambridge. Cambridge University Press. OLSON. Mancur. 1965. “The Logic of Collective Action. Public Goods, and The Theory of Groups”. Cambridge. Harvard University Press. OSBORNE, David, and Ted Gaebler. 1993. “Reinventing Government – How the Entrepreneurial Spirit is Transforming The Public Sector”. NY. Plume. SEN. Amartya. 1982. “Choice, Welfare and Measurement”. Cambridge. Harvard University Press. SOLOW, Robert M. 1970 “Growth Theory, An Exposition”. NY, Oxford Univesity Press. WOLD BANK, World Development Report. New York. Oxford University Press. 1997.

Jefferson C. Boechat é economista, especialista em política públicas e gestão governamental.

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